As grandes cidades do mundo estão enfrentando uma crise. As Nações Unidas estimam que até 2050, quase um bilhão de pessoas com deficiências viverão nas cidades, representando 15% do total de seus habitantes. Com paisagens urbanas repletas de metrôs, lojas e banheiros inacessíveis, a ONU declarou que o problema da acessibilidade representa um grande desafio para as cidades. Ao mesmo tempo, a maioria das cidades ao redor do mundo está perdendo a batalha para oferecer moradia segura, digna e acessível aos seus cidadãos, com aluguéis representando mais de 50% de algumas rendas familiares. O Fórum Econômico Mundial recentemente alertou que “um mundo onde que poucos podem pagar por moradia não é sustentável”.
Em um momento em que o futuro do urbanismo está sendo cada vez mais definido por novas tecnologias desenvolvidas para melhorar a vida cotidiana dos usuários, arquitetos e urbanistas devem lembrar que uma cidade inteligente é uma cidade acessível, tanto física quanto economicamente. Como discutido no início do nosso debate mensal sobre acessibilidade, é importante notar que uma cidade verdadeiramente acessível é aquela em que pessoas de todas as condições físicas e mentais, rendas, raças, gêneros e religiões podem viver e prosperar em um ambiente urbano centrado na experiência humana.
Isso não significa que a tecnologia não tenha um papel a desempenhar. Na verdade, como estamos prestes a ver, arquitetos e usuários estão sendo expostos a uma ampla variedade de inovações inteligentes que prometem avançar ainda mais na causa do desenho universal, envolvendo desde o deslocamento na cidade por um usuário de cadeira de rodas até a construção de moradias acessíveis em centros urbanos.
Acessibilidade física
AccessMap - Acessibilidade para mobilidade
Aplicativos de mapeamento não são um fenômeno novo para as cidades. No entanto, na cidade montanhosa de Seattle, onde muitos bairros não têm pavimentação e apresentam declives de 10% a 20%, a Universidade de Washington desenvolveu um aplicativo que permite que pedestres com habilidades motoras limitadas mapeiem rotas acessíveis. O AccessMap pode ser programado para evitar declives acentuados e procurar ruas com cruzamentos, de acordo com a preferência do usuário.
Wheelmap - Acessibilidade coletiva
Enquanto o AccessMap se concentra em Seattle, desenvolvido e mantido por uma equipe especializada, o Wheelmap segue o mesmo princípio mas propõe uma plataforma mundial de código aberto para acessibilidade voltada a cadeirantes. O mapa funciona de forma semelhante à Wikipedia, onde qualquer pessoa pode contribuir e marcar os espaços públicos de acordo com os critérios de verde (totalmente acessível), amarelo (parcialmente acessível) e vermelho (não acessível). Usando o OpenStreetMap como base, a plataforma mostra 157 tipos de lugares e está disponível em 25 idiomas. O serviço está disponível como aplicativo web e para smartphones.
BlindSquare - Acessibilidade visual
Ao passo que o AccessMap e o Wheelmap visam tornar as cidades acessíveis àqueles com restrições de mobilidade, o BlindSquare busca o mesmo para os deficientes visuais. O aplicativo usa o GPS para localizar usuários e reúne informações sobre os arredores. Ativado através de comandos de voz, o aplicativo ajuda cegos e deficientes visuais a navegar pelas cidades, encontrar estabelecimentos, usar o transporte público e cruzar ruas e avenidas.
Reading Madrid - Sinalização acessível
Cidades de todo o mundo estão adotando sinalização acessível, com iniciativas como Legible London, WalkNYC e Rio on Foot. Indo além nesta tendência está o Reading Madrid, um esforço conjunto da Applied Wayfinding e das empresas locais espanholas Paisaje Transversal (estratégia urbana), Avanti Avanti Studio (design para todos), Urban Networks e Paralelo 39 (urbanistas e arquitetos), sob a orientação de Dimas García. O projeto visa melhorar a legibilidade, a segurança e a autonomia nas cidades por meio de um sistema de cubos de orientação e de dispositivos interativos posicionados estrategicamente. Saiba mais aqui.
Stretch|Color - Acessibilidade o espectro autista
O arquiteto e professor Sean Ahlquist, em parceria com o dramaturgo Dionne O’Dell, criou uma experiência teatral sensorial para crianças com desordens do espectro autista (DEA), projetadas para melhorar a capacidade de pessoas com DEA de interagir com o mundo ao seu redor. Surgindo de um projeto 2D intitulado Stretch | Color, a adaptação mais recente apresenta uma estrutura em 3D que serve como ponto focal para uma peça escrita por O'Dell. A dupla afirma que ela possibilita novas interações no campo do desempenho sensorial, aumentando a experiência do usuário em escolas, museus e espaços públicos em todas as cidades. Saiba mais aqui.
Acessibilidade econômica
PRISM - Construção de habitação
Bryden Wood, Cast e a prefeitura de Londres lançaram um novo aplicativo para acelerar a construção de moradias na capital. O aplicativo gratuito, intitulado PRISM, tem como objetivo o projeto e construção de casas pré-fabricadas de alta qualidade para atender à demanda atual de mais de 50.000 moradias por ano. Londres será a primeira cidade do mundo a fazer uso desse aplicativo, e os designers acreditam que o fato deste ser de código aberto incentivará uma maior colaboração e permitirá que essa inovação seja usada e melhorada pela comunidade global. Saiba mais aqui.
Vulcan - Casas feitas com impressão 3D
A impressão 3D oferece enormes benefícios econômicos e ambientais para o futuro da habitação nas cidades. A ICON, empresa de construção com sede em Austin, EUA, firmou recentemente uma parceria com a New Story, uma organização sem fins lucrativos voltada para habitação, para criar uma impressora 3D que pode construir casas por US$ 4.000. A impressora, chamada Vulcan, é capaz de imprimir uma casa térrea de 60 m², feita de concreto, em até 24 horas. Saiba mais aqui.
Projeto urbano da IKEA - Habitação pré-fabricada
Conhecida por móveis simples e bem desenhados, a IKEA propõe expandir seu modelo DIY para uma escala muito maior: centros urbanos. O Democratic Design Days é um evento anual em que a IKEA apresenta suas próximas marcas e colaborações, e este ano a gigante sueca apresentou o The Urban Village Project, uma colaboração entre o SPACE10 e a EFFEKT Architects. Com um objetivo abrangente de melhorar nossa qualidade de vida, o The Urban Village Project inclui uma abordagem variada, oferecendo uma variedade de opções para diferentes tipos de famílias e rendas. Saiba mais aqui.
iBuild - Empoderando a auto-construção
O iBuild é um aplicativo focado no cidadão que facilita o processo de autoconstrução de moradias. Anunciada pelo Banco Mundial como uma solução em potencial para moradias populares em países emergentes, a tecnologia reúne empreiteiras para obter cotações de projetos, comprar materiais e acompanhar o andamento das obras. O objetivo do aplicativo é capacitar os cidadãos para assumir o controle do processo de construção, aumentar a transparência, coletar dados para informar autoridades e, em última instância, definir novas legislações mais adequadas.
IBM Blockchain - Construção descentralizada
Mencionada pelo Banco Mundial como uma tecnologia disruptiva com o potencial de abordar a acessibilidade de moradias, o Blockchain foi apontado como o futuro dos negócios. Trata-se de um registro digital eficiente, seguro e transparente para otimizar o processo de titulação de terras e fornecer um método de documentação inviolável para a transferência de terrenos. Com quase 20% dos moradores de favelas urbanas sem posse formal de suas casas e sem financiamento para melhorias, o Blockchain oferece uma alternativa para os moradores das comunidade pesquisarem e mapearem a propriedade da terra de maneira transparente, descentralizada e econômica.
Este artigo utiliza informações provenientes das Nações Unidas, Fórum Econômico Mundial, Banco Mundial, The Guardian, The Atlantic e Medium. Publicado originalmente em 27 de agosto de 2019.