A implicação social das coberturas verdes no cinema

O cinema frequentemente faz troça da arquitetura. Fachadas de vidro são despedaçadas por rajadas de metralhadora, crimes macabros acontecem contra uma paleta modernista branca, escadas desconstruídas são a causa de sérios acidentes ou palhaçadas ridículas, e temos certeza que uma cobertura têxtil será destroçada assim que 007 passar por ela. 

Há, no entanto, um elemento arquitetônico que tem se beneficiado de suas aparições no cinema, e, surpreendentemente, é um elemento "sustentável". Coberturas verdes e outros espaços verdes têm aparecido frequentemente em filmes comerciais na última década: sucessos de bilheteria como Para Sempre (2012) e Contra o Tempo (2011) utilizam em suas cenas os espaços verdes do Jay Pritzker Pavilion de Frank Gehry no Millenium Park; ano passado o Centro de Convenções de Vancouver apareceu em Godzilla e Robocop; e o documentário My Playground, de Kaspar Schroder, mostra as Mountain Dwellings do BIG em Copenhague. E não podemos nos esquecer de duas das maiores franquias da história do cinema: Senhor dos Anéis e O Hobbit, ambas de Peter Jackson, mostram coberturas verdes em sua representação de Hobbiton - lar dos virtuosos e incurruptíveis Hobbits.

Millennium Park em Chicago, como mostrado em "Contra o Tempo" (2011). Imagem © Vendome Pictures and The Mark Gordon Company

Como resultado do tratamento das coberturas verdes em O Hobbit, casas com vegetação em seus telhados são agora sinônimo de comunidades pacíficas. Ao passo que Hobbiton não é inteiramente útil em romper com estereótipos comuns associados a muitas iniciativas verdes (pense nas comunidades hippies, por exemplo) ela oferece - e isso é importante - um apoio considerável para a decisão consciente de viver de modo responsável e apresenta isso ao público a partir de um ponto de vista inegavelmente positivo. Isso é incomum para uma referência cinematográfica; elementos "arquitetônicos" são geralmente associados a atos maléficos e valores subversivos, mas os Hobbits, uma raça a feliz e descomplicada, são essencialmente bons. E apesar da casa de Bilbo Baggins não ser o que se chamaria de atual - referenciando o movimento Arts & Crafts mais que o design contemporâneo - as mensagens estão, ao menos, alinhadas. Em nações desenvolvidas somos frequentemente instruídos de que, para viver de modo sustentável, devemos viver de modo mais simples - reduzir nosso consumo para diminuir a pegada de carbono, cultivar nosso próprio alimento, comprar produtos locais e apreciar as pequenas coisas, como boas companhias e a família. Em suma, viver como um Hobbit. 

Millennium Park em Chicago, como mostrado em "Contra o Tempo" (2011). Imagem © Vendome Pictures and The Mark Gordon Company

É animador ver iniciativas sustentáveis retratadas no cinema, particularmente porque estes são tópicos improváveis de atrair o interesse da indústria cinematográfica. Como muitas das escolhas sensíveis da vida, opções sustentáveis podem ser visualmente banais ou mesmo invisíveis (dispositivos de reuso de água e materiais com baixa energia incorporada, por exemplo), e dificilmente cinematográficas. Aparições positivas no cinema são importantes pois o filme é um meio muito poderoso de influenciar nossos desejos. Filmes são deliberadamente emocionais - tão manipuladores quanto um tabloide e tão certeiros quanto um comercial em horário nobre. Filmes moldam nossos sonhos individuais e, portanto, nossos objetivos coletivos. 

O uso das Montain Dwellings por Schroder é particularmente um bom exemplo pois leva a associação a um nível mais alto - o filme não apenas torna o projeto contemporâneo sustentável  desejável, como também acessível. O parkour trata basicamente de se apropriar de espaços públicos, sentir-se confiante o bastante num espaço para fazer dele seu ginásio - desafiando convenções e lei da gravidade. Os telhados jardins dos apartamentos individuais não são apenas um elemento importante para mimetizar o projeto com uma montanha, no filme eles também são o meio de subir e descer o edifício como uma montanha. Embora não fique claro como os moradores se sentem com jovens desconhecidos saltando repentinamente em suas varandas, o filme certamente aprova a iniciativa. 

Na maior parte dos casos, tecnologias verdes que requerem investimentos e comprometimento permanecem reservadas a clientes com agendas ambientais, mas talvez a popularidade dos telhados jardim em filmes seja um indício de que estratégias sustentáveis terão em breve um apelo maior de mercado. Podemos chegar a descobrir, assim como fizeram os Hobbits, que "o poder pode estar na menor das coisas."

Este artigo é uma cortesia de Charlotte Neilson, autora do livro Casting Architecture. Sua coluna no ArchDaily, Through the Lens, analisa a arquitetura e o design na televisão e no cinema.

Sobre este autor
Cita: Charlotte Neilson. "A implicação social das coberturas verdes no cinema" [Through the Lens: The Social Implications of Green Roofs in Film] 19 Jan 2015. ArchDaily Brasil. (Trad. Baratto, Romullo) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/760470/a-implicacao-social-das-coberturas-verdes-no-cinema> ISSN 0719-8906

¡Você seguiu sua primeira conta!

Você sabia?

Agora você receberá atualizações das contas que você segue! Siga seus autores, escritórios, usuários favoritos e personalize seu stream.