Mapas sensoriais: o que o olfato pode revelar sobre os ambientes urbanos

Toda cidade é um ambiente complexo, reunindo pessoas, culturas, arquitetura, comércio e até a natureza. Ao vivenciar uma cidade, muita atenção é dada à sua aparência, mas isso não é tudo. A teoria do design sensorial visa ir além da visão e explorar a riqueza do ambiente construído por meio de texturas, cheiros e sons. Para as autoridades e urbanistas da cidade, muita atenção geralmente vai para a paisagem visual e sonora de uma cidade, mas em termos de odor, o foco está principalmente no gerenciamento de resíduos ou na limpeza de áreas insalubres. No entanto, o olfato, tão frequentemente negligenciado, está fortemente ligado à criação de memórias afetivas. O sentido contribui para nossa compreensão do mundo; revela práticas culturais de outra forma ocultas, e completa a experiência de um ambiente.

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A pesquisadora Dra. Kate McLean pretende celebrar o papel que o cheiro desempenha na vida da cidade mapeando a "paisagem olfativa". A expressão paisagem olfativa é usada como equivalente à paisagem visual, mas suas qualidades são mais efêmeras, baseadas em percepções individuais ou coletivas em um ponto específico do tempo. Como artista e líder do curso de Design Gráfico na Faculdade de Arquitetura da Universidade de Kent, Reino Unido, McLean passou a última década pesquisando as paisagens olfativas de diferentes cidades e traduzindo suas qualidades sensoriais em mapas. Embora estes mapas possam representar apenas uma instância específica de tempo, eles são um vislumbre da abundância de informações que os cheiros podem revelar sobre um espaço.

A percepção olfativa humana contribui para nossa compreensão do mundo; as pessoas se deliciam com aromas localizados e sentem nojo de odores descontextualizados. Pequenos odores podem permitir a pré-visualização de uma atividade próxima, servir como síntese de eventos previamente testemunhados e ter a capacidade de evocar memórias específicas. Entretanto, a paisagem olfativa está em constante fluxo, e os cheiros efêmeros e voláteis são fáceis de ignorar quando experimentados por pessoas comuns em ambientes urbanos do cotidiano. — Dra. Kate McLean

A abordagem da Dra. Kate McLean emprega a prática de mapeamento para destacar o papel do odor como elemento e componente do espaço público. McLean lidera caminhadas olfativas em cada cidade investigada como fonte para todas as práticas de mapeamento. Pequenos grupos de pessoas são orientados a caminhar pela cidade, focando nos estimuladores olfativos e descrevendo o que estão sentindo. Os dados coletados são então sintetizados em mapas olfativos, belas traduções visuais da 'paisagem olfativa' percebida em cada lugar.

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Paisagem olfativa de Singapura. Imagem Cortesia da Dr. Kate McLean

O processo resultante não só é útil na documentação de aspectos ocultos de uma cidade, mas muitos participantes descrevem o processo como sendo transformador. Durante as primeiras caminhadas, o pesquisador esperava que as pessoas oferecessem descrições objetivas, como o aroma do café perto das cafeterias. No entanto, algumas das respostas destacaram as conexões emocionais que as pessoas criam com aromas: alguns dos casos incomuns incluem o "cheiro de sonhos desfeitos", "brócolis / segredos escuros profundos" e "uma vida dura". Estas são as provas dos odores complexos que combinam vários elementos a cada momento.

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Paisagem olfativa de Amsterdã. Imagem Cortesia da Dr. Kate McLean

Ao explorar Amsterdã na primavera de 2013, as descrições oferecidas subverteram as expectativas. Além do famoso odor da cidade, os 44 voluntários identificaram mais de 600 cheiros, alguns pertencentes à cidade e outros segundo as expectativas de passeios no campo. Sobre a doçura dos waffles, os temperos orientais que emanam dos restaurantes asiáticos e surinameses, os picles das bancas e mercados de arenque, um elo com uma das principais indústrias históricas da cidade. Livros antigos foram detectados nas portas dos porões e os aromas de lavanderia foram lançados para as ruas a partir dos diversos hotéis de Amsterdã.

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Casas Holandesas no canal. Imagem © James Taylor-Foster

Os odores urbanos são em grande parte gerados como resultado da atividade humana e assim os cheiros revelam as práticas culturais, indústrias, do comércio, ofertas culinárias e serviços municipais de nossas cidades. Meus mapas olfativos desenhados individualmente revelam isso; shisha (Singapura), vapores de malte de cervejarias (Edimburgo), carrinhos de arenque e peixe fresco (Amsterdã), roti e caril (Singapura), e capim recém-cortado (Edimburgo). Estes cheiros são efêmeros, vinculados às leis e mudança dos habitantes. — Dra. Kate McLean

Os mapas olfativos são uma forma de facilitar a discussão e conscientizar as comunidades. Eles representam indicadores-chave da atividade humana. A percepção do estímulo depende do contexto, podemos apreciar o cheiro de frutos-do-mar em um mercado de peixe, mas achamos desconcertante se o encontrarmos em um parque. Como a maioria dos cheiros é resultado da atividade humana, prestar atenção a esses aspectos também pode falar sobre as práticas culturais de um bairro, desde as tradições culinárias até o tipo predominante de indústria ou passatempos favoritos.

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Paisagem olfativa de Edimburgo. Imagem Cortesia da Dr. Kate McLean

Esta abordagem centrada no usuário se baseia no trabalho de outros na comunidade de um ambiente construído. A primeira caminhada olfativa registrada foi gravada em 1790 em Paris por Jean-Noël Hallé. A caminhada de dez quilômetros ao longo do Sena foi um levantamento sanitário a fim de investigar os odores nocivos, que na época eram considerados causa direta de doenças. As memórias de Jean-Noël Hallé são exploradas no clássico estudo dos cheiros de Alain Corbin e sua percepção publicada em 1982. Então, três décadas depois, Victoria Henshaw começou a discutir o olfato como parte do planejamento e design urbano. Atualmente, a pesquisadora da UCL Cecilia Bembibre está trabalhando com Kate McLean para desenvolver métodos de arquivamento de odores através de técnicas visuais e químicas.

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Market Street Hotel em Edimburgo. Imagem © Robert Rieger

Ao sairmos do controle de odores incômodos a paisagens olfativas abrimos oportunidades para apreciar os benefícios dos cheiros nas experiências humanas e no bem-estar. Parte da compreensão do mundo de forma mais holística, os odores, sejam negativos ou positivos, devem ser considerados um aspecto essencial da estrutura de projeto e planejamento dos espaços públicos, assim como outros componentes sensoriais. Se nada mais, pensar sobre o cheiro de uma cidade pode ajudar a preservar sua singularidade e aprofundar nossa experiência em cada bairro.

Este artigo é parte dos Tópicos do ArchDaily: Tendências urbanas e habitacionais. Mensalmente, exploramos um tema específico através de artigos, entrevistas, notícias e projetos. Saiba mais sobre os tópicos do ArchDaily. Como sempre, o ArchDaily está aberto a contribuições de nossos leitores; se você quiser enviar um artigo ou projeto, entre em contato.

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Sobre este autor
Cita: Florian, Maria-Cristina. "Mapas sensoriais: o que o olfato pode revelar sobre os ambientes urbanos" [Sensory Maps: What the Sense of Smell Can Reveal about Urban Environments] 20 Ago 2022. ArchDaily Brasil. (Trad. Bisineli, Rafaella) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/986392/mapas-sensoriais-o-que-o-olfato-pode-revelar-sobre-os-ambientes-urbanos> ISSN 0719-8906

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