Bienais, exposições e festivais focados em arquitetura oferecem uma plataforma para abrir debates, realizar pesquisas e impulsionar a inovação, mas também podem contribuir para as mudanças que moldam a imagem e o caráter de uma cidade. Através de instalações e experiências temporárias, estes eventos podem expandir linhas de investigação sobre a qualidade dos espaços urbanos, convidando visitantes e residentes a desacelerar, romper com a sua rotina diária e questionar os seus ambientes locais. Os efeitos podem não ser imediatos, mas ao acumular essas impressões e momentos de contemplação, festivais de arquitetura e design podem ter um impacto duradouro nas cidades que os recebem.
Alguns festivais, como o London Design Festival 2022 ou a Bienal de Arquitetura de Tallinn, estão revigorando os espaços públicos ao apresentar objetos criados por designers e artistas. Outros, como o Model. Festival of Architecture de Barcelona, estão aproveitando a oportunidade para discutir problemas que a cidade enfrenta. Beta 2022, a Bienal de Arquitetura de Timişoara, está incentivando os visitantes a descobrir novas formas de ver e usar seu ambiente, enquanto festivais como Concentrico exploram ideias relacionadas à história e à apropriação através de instalações temporárias espalhadas pela cidade.
Continue lendo para descobrir as diversas maneiras pelas quais os festivais de arquitetura e design podem contribuir para a criação de cidades mais agradáveis, inclusivas, sustentáveis e empoderadoras.
Um convite para desacelerar
Uma única árvore é colocada no meio da Times Square, talvez o espaço público mais dinâmico da cidade de Nova York. Grades de madeira e aço envelhecido a cercam, tentando abrir espaço na praça movimentada para permitir que ela respire. Ao entrarem na instação circular, os visitantes são convidados a voltar sua atenção para este pequeno pedaço de natureza, desligando-se do frenesi do quotidiano de Nova Iorque. A instalação FILTER da CLB Architects proporcionou uma experiência temporária durante a 10ª edição do NYCxDESIGN.
Intervenções como essa introduzem um elemento inesperado no dia-a-dia de uma cidade. Os objetos estranhos têm por objetivo romper com essa rotina, encorajando as pessoas a desacelerar e contemplar seu ambiente. Algumas instalações têm uma agenda, um posicionamento em relação a um problema que assola a cidade, mas outras são apenas pretextos para reflexão, convidando as pessoas a observar e formular suas próprias opiniões sobre o caráter da cidade em que habitam.
Redescobrindo partes esquecidas da cidade
A maioria dos festivais de arquitetura e design cria estruturas temporárias por toda a cidade, muitas delas em locais inusitados. O objetivo é incentivar a exploração e descoberta. Beta 2022, a Bienal de Arquitetura de Timişoara, levou essa ideia um passo adiante. Uma linha fina desenhada com tinta amarela conecta as instalações temporárias em uma pista em loop de mais de 23 quilômetros de extensão. O caminho passa não só por parques, ruas residenciais, áreas históricas e industriais, mas também por baixo de pontes ou atrás de edifícios públicos, espaços normalmente não percorridos. A ideia da exposição, intitulada “Another Breach in the Wall”, é explorar os ambientes urbanos de maneira a romper as convenções e as ideias que ditam o uso do espaço público.
Novas atividades para explorar o potencial escondido
Paseo del Espolon é uma praça no centro de Logrono, na Espanha. Apesar de ser um local atimovimentado vo devido à sua localização, o espaço é subutilizado. Durante a edição deste ano do Concentrico, Matali Crasset colocou lá uma instalação intitulada "Dark Sky". A forma incomum rapidamente despertou a imaginação das crianças que visitavam a praça com os pais e avós. Os lados se tornaram escorregadores, o espaço abaixo era um túnel escondido, enquanto a plataforma elevada funcionava como um palco. A estrutura funcionou como um pequeno experimento social, introduzindo uma nova função a um espaço urbano para reafirmar seu potencial e desafiar as formas como usamos os espaços.
Dando voz às pequenas comunidades
Muitos festivais procuram se envolver com as comunidades locais, um objetivo fundamentado na compreensão da importância dos cidadãos locais para decifrar os códigos ocultos dos ambientes urbanos. No entanto, definir essas comunidades pode ser um desafio, pois nem todas se enquadram no que se entende por comunidade unida. Beta 2022 encontrou uma maneira de lidar com essa noção volátil trabalhando com o conceito de “micronação”, um termo destinado a descrever reuniões de pessoas que desenvolveram regras e conexões intrínsecas. Para elevar a sensibilidade dos arquitetos e do público em geral a essas comunidades voláteis, Beta pediu a arquitetos e designers que criassem espaços para elas, com o objetivo de trazer visibilidade e um senso de identidade para uma noção elusiva.
Uma plataforma para artistas locais
Durante o London Design Festival 2022, a designer Sabine Marcelis apresentou uma coleção de novos assentos públicos permanentes. Eles foram instalados na St. Giles Square em Londres, um espaço público cinza ofuscado pelo brutalismo dominante de Center Point. As obras de arte, construídas com blocos geométricos de pedras naturais como travertino, quartzo e mármore, trouxeram cores vivas, texturas e padrões para a praça. Festivais como este são fundamentais para oferecer a artistas e designers uma plataforma para expressar sua visão, uma abordagem que leva naturalmente a melhores espaços públicos e comunidades mais inclusivas.
A Bienal de Arquitetura de Tallinn adotou uma abordagem diferente para a mesma ideia. O Fungible Non-Fungible Pavilion de iheartblob propõe uma abordagem descentralizada na qual as pessoas da comunidade podem se tornar designers e investidores para a arte pública, mudando assim o papel do arquiteto de “mestre construtor” para “designer de sistemas”. O design do pavilhão usa tecnologia blockchain. Os projetistas criaram uma ferramenta geradora de NFT, e cada NFT cunhada por essa ferramenta financia uma réplica física que é integrada ao pavilhão. Eventualmente, o pavilhão seria composto por peças únicas criadas por diferentes designers e proprietários, refletindo uma comunidade ampla e inclusiva.
Conscientização sobre questões sociais e ambientais
Durante a primeira edição do Model. Festival of Architecture of Barcelona, inaugurada este ano, instalações arquitetônicas experimentais tiveram como objetivos questionar a maneira como vivemos juntos e incitar a imaginação dos moradores. Uma das instalações, a Arca da Coexistência de LEA Atelier e TAKK Architecture, montou um artefato móvel que abriga uma infinidade de árvores, plantas e arbustos. O sistema de fácil transporte visa aumentar a conscientização sobre duas questões interconectadas: a diminuição da quantidade de espaços públicos erdes e o impacto que eles têm no aquecimento global e na biodiversidade urbana. Ao reacostumar os moradores à presença exuberante da natureza, mesmo que confinado a uma plataforma apertada, a obra de arte pode ser entendida como uma faísca para acender conversas sobre a cidade, seus desafios e a sociedade humana em geral.