Arquitetura como agente transformador: reabilitação urbana em Cabo Verde

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© Marcelo Londoño

Melhorar a qualidade de vida das pessoas é um dos maiores objetivos de profissionais da Arquitetura e do Urbanismo. Ao planejar cidades, criar habitações ou numa simples reforma, busca-se aprimorar o espaço construído independente da escala. A Reabilitação Urbana de Alto de Bomba, realizada na cidade do Mindelo, Cabo Verde, surgiu da necessidade de combater a precariedade encontrada anteriormente no local. Um projeto que exigiu a imersão diária da equipe na vida cotidiana do lugar e resultou numa prova inspiradora do quanto a arquitetura pode revelar melhores formas de viver a cidade e agir diretamente na sociedade. Não a toa, em 2022, recebeu o Prêmio Obra do Ano, eleita por nossos leitores como a grande vencedora entre centenas de projetos concorrentes.

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O projeto foi realizado por OUTROS BAIRROS, uma equipe interdisciplinar de arquitetura, engenharia, paisagismo, estudantes e técnicos audiovisuais. Em seu início, foi necessário um trabalho prévio de levantamento de dados - criação de uma orografia, levantamento de usos e ocupação do solo, fotografias aéreas e até mesmo um inquérito realizado de casa a casa -, etapa fundamental para dar início ao plano de intervenção, que "coloca os cenários e lança possíveis soluções para as questões físicas e sociais. Reflete-se sobre a infraestrutura, o desenho da superfície, os equipamentos coletivos e, sobretudo, abre-se a porta a momentos de conversa que permitem discutir cada fase do plano, escutar a voz dos cidadãos, os silêncios do lugar e associar os moradores ao projeto enquanto funcionários das obras em curso, pelo menos, numa ordem de 50% dos funcionários necessários em cada obra que começa".

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© Queila Fernandes
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Desenho de OUTROS BAIRROS

Portanto, foi realizada uma estratégia que intervém no território a dois níveis: "o estruturante, que trata acessibilidades e infraestrutura na globalidade do assentamento, e o pontual, que cria áreas de reabilitação urbana especificas que garantem a ligação do projeto estruturante com a cidade formal; articula a malha urbana do assentamento com a cidade formal e potencia a micro sociabilidade do assentamento, uma vez que atua nos locais de encontro identificados na fase de caracterização".

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© Marcelo Londoño

O projeto estruturante centra-se, sobretudo, na resolução do meio urbano nos seguintes níveis: drenagem, abastecimento de água, saneamento básico, energia e iluminação pública, coleta de lixo, sistema viário, áreas verdes e estabilização de encostas, economia e cultura. Pontos fundamentais para uma infraestrutura básica que prevê maior qualidade e acessibilidade nos espaços públicos, de trânsito ou lazer, visando mais conforto, segurança e saneamento. 

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Cortesia de Ângelo Lopes

Quanto aos projetos pontuais, foram estabelecidas com a população desde a localização até o programa delas. De modo que as intervenções visam, sobretudo, requalificar a área a partir do lazer com mini basquete e “balizinhas”, áreas de reunião para jogos de cartas e uril (jogo tradicional de Cabo Verde), acesso à sentina (edifício de distribuição de água), drenagem pluvial da área e a requalificação das ruas que permitem conectar estes espaços entre si. 

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Cortesia de Ângelo Lopes
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© Marcelo Londoño

O projeto foi separado por diferentes etapas e começou a ser implantado em 2019. Ao decorrer de sua execução, que ainda não está completa, ele gerou diversas outras ramificações em diferentes especificidades que interferem diretamente na vida da população local como: criação de hortas comunitárias nos vazios urbanos, um trabalho audiovisual que documenta estórias e saberes locais, lançamento de um projeto de hip-hop junto com o Kubaka (um estúdio de música local), geração de trabalho como as dez moradoras que se juntaram para criar as Calceteiras do Carriçal, ampliação do espaço de debate público nas praças criadas. Sendo assim, foram concebidos instrumentos que oferecem à comunidade a capacidade de se fortalecer e se relacionar com outras instituições e, através da ação participativa dos moradores, foi e é possível manter em constante fluidez o conhecimento gerado pela obra direta e indiretamente. Alguns resultados podem ser vistos aqui.

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© Marcelo Londoño

Por fim, o grupo OUTROS BAIRROS, fez uma postagem em seu Instagram celebrando o projeto após a premiação, mas alertando para sua situação atual e dificuldades:

"Entre Maio de 2019 e Dezembro de 2021, a reabilitação urbana do Alto de Bomba, realizada a partir do modo de vida da população local, transformou 5000 m2 do espaço público que afeta 171 casas da zona e cerca de 800 moradores.

As obras, entretanto interrompidas por falta de financiamento, ainda estão por elaborar em cerca de 60% do previsto no Alto de Bomba e na totalidade nas zonas de Fernando Pó e Covada de Bruxa.

A expectativa gorada a todos e todas para, finalmente, se pensar de e a partir da periferia acompanha a luta do grupo de calceteiras Amdjer na Obra Amdjer na Obra - Calceteiras por um contrato de trabalho com o município de São Vicente que ainda não foi celebrado; o desamparo da generalidade dos trabalhadores da obra que ficaram parados desde que as obras foram interrompidas; a frustração dos jovens dos grupos kubaka, bip e Associação Comunitária Alt Bomba Unid, entre outros, que ainda anseiam pela sede da associação local."

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© Marcelo Londoño
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© Marcelo Londoño

A triste notícia de falta de financiamento para um trabalho de tamanha importância - que ganha cada vez mais relevância visto o rápido crescimento dessas zonas na cidade - demonstram os percalços da implementação de um projeto desse porte. Esperamos que a premiação da Obra do Ano 2022 sirva como um bom argumento e incentivo para seguir com as demandas necessárias, e angariar fundos para dar continuidade ao projeto. Afinal, a Reabilitação Urbana de Alto de Bomba nos ensina que além de melhorar o espaço físico, a arquitetura e o urbanismo quando se aliam a importantes causas, "da luta e da vida", tem o poder de influenciar diretamente na vida das pessoas.

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© Marcelo Londoño

Você pode conferir o projeto completo aqui e saber mais informações sobre o início dele aqui.

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Sobre este autor
Cita: ArchDaily Team. "Arquitetura como agente transformador: reabilitação urbana em Cabo Verde" 05 Mai 2022. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/980130/arquitetura-como-agente-transformador-reabilitacao-urbana-em-cabo-verde> ISSN 0719-8906

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