Captação de água: antigas tipologias que nos sustentam

Em 22 de março de 2022, ocorreu a vigésima nona comemoração do Dia Mundial da Água - enfatizando a crise hídrica que continua deixando as populações vulneráveis. E esta é uma questão extremamente multifacetada. Os governos infelizmente determinam o acesso à água, com pessoas marginalizadas desproporcionalmente afetadas. Além disso, as tipologias urbanas são outro fator. O bombeamento excessivo de fontes de água subterrânea para atender às demandas de água de Hanói, por exemplo, resultou na contaminação com arsênico nos poços das vilas do Vietnã.

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Interligados com as políticas governamentais estão os muitos exemplos de infraestruturas hídricas tradicionais que sustentam as comunidades há gerações. Essas antigas técnicas de captação, conservação e gerenciamento de água realizadas de forma construída em todas as culturas oferecem estruturas úteis para criar um futuro mais acessível à água.

Os exemplos mais visíveis e elaborados de infraestrutura de captação de água são encontrados na Índia na forma de poços escalonados. É um conceito simples – uma forma arquitetônica escavada vários níveis até chegar a uma altura a qual está sempre saturada de água. Os lances seriam construídos para acesso à água a partir do nível do solo. Escalonamentos feitos em áreas propensas à seca na Índia forneceriam água durante todo o ano para armazenamento e sistemas de irrigação.

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Chand Baori, em Jaipur, Índia. Imagem© Muslianshah Masrie via Shutterstock

O mais interessante, porém, é que os poços escalonados não tinham apenas um propósito utilitário. Além de fornecer acesso à água, poços como o Chand Baori no Rajastão, também funcionavam como espaços sociais. Eles forneciam um alívio bem-vindo do calor e atuavam como locais importantes para eventos religiosos. Séculos de negligência e diminuição dos lençóis freáticos os deixaram abandonados, com o governo britânico na Índia também supervisionando sua destruição depois de considerar os poços como anti-higiênicos.

Tipologias como essas, no entanto, não são apenas artefatos do passado. Elas são igualmente úteis e necessárias no contexto do século XXI. No Rajastão, vários sistemas escalonados foram restaurados, permitindo que os marcos culturais ocupem os papéis importantes que já tiveram. O sistema de Toorji, em Jodhpur, foi restaurado há relativamente pouco tempo e é um exemplo adequado de um projeto de regeneração comunal. A manutenção diária é feita por voluntários e tornou-se uma área popular para nadar e tomar banho.

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Chand Baori na aldeia de Abhaneri perto de Jaipur, estado de Rajastão. Imagem © Wikimedia User PAWAN3223 under the Creative Commons  Attribution-Share Alike 4.0 International license

Parcerias entre empresas globais de arquitetura e empreendedores sociais levaram à implementação de projetos na forma de tanques de captação de água da chuva – soluções mais práticas para um problema premente. A restauração dos sistemas escalonados, no entanto, recebeu alta prioridade, e essa priorização destaca o valor intrínseco de restaurar projetos que tenham um significado prático e simbólico para uma comunidade.

Estes sistemas, no entanto, estão concentrados em uma área relativamente menor, mas existem soluções de infraestrutura hídrica em meio a redes mais amplas. Este ano, o World Monuments Fund adicionou a Paisagem Cultural Yanacancha-Huaquis no Peru à sua lista de patrimônios que devem ser observados – e este local enfatiza o poder duradouro de algumas dessas soluções.

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Andes peruanos. Imagem © Copernicus Sentinel dados (2020), processados por ESA, CC BY-SA 3.0 IGO

Localizada ao longo do rio Cañete, esta paisagem abriga uma extensa rede de canais, reservatórios e barragens – usada para reter, desviar e filtrar água de nascente para irrigação de pastagens e campos. Datada do século IX d.C., essa rede fornecia uma gestão eficaz da água para as comunidades da bacia do rio Cañete. Nos dias atuais, a maior parte dessa infraestrutura foi amplamente abandonada.

Desde 2013, no entanto, a comunidade de Miraflores, o Instituto de Montaña, a Reserva Paisagística Nor Yauyos Cochas e a IUCN vêm colaborando para preservar essa paisagem. A abordagem colaborativa é adequada levando em conta a natureza sensível do local, com a utilização de um sistema “cinza e verde”, um híbrido de soluções cinza (construído) e verde (da natureza).

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Zona úmida na Paisagem Cultural Yanacancha-Huaquis, Peru. Imagem via World Monuments Fund

O que é particularmente admirável nessa abordagem é a pequena emissão de carbono – com novas intervenções construídas representando apenas uma pequena porcentagem do projeto geral. Por exemplo, a área alagada Yanacancha foi ampliada e cercada com estruturas mais resistentes à água e mais duráveis, protegendo também as zonas úmidas do pastoreio excessivo. Em alguns casos, a restauração exigiu a reabilitação de canais e poços abandonados para que pudessem coletar as chuvas. As soluções híbridas eram igualmente mínimas – com tubos de PVC sendo instalados ao lado de antigos sistemas de pedra para levar a água da chuva até as pastagens.

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Muro da segunda barragem de Yanacancha com dupla camada. Imagem © Favio Ramírez, Instituto de Montañ

O ressurgimento dessas tecnologias antigas nos Andes peruanos resultou na melhoria da disponibilidade de água local e permitiu que os agricultores tivessem áreas maiores para alternar a alimentação de seu gado. Essa revitalização também significou que o ecossistema circundante é mais resiliente às mudanças climáticas.

Na capital do Peru, cerca de 1,5 milhão de pessoas não estão conectadas à rede de água potável ou ao sistema de esgoto. Muitas famílias mais pobres em Lima também dependem exclusivamente de caminhões-pipa para sua água. Na Índia, cerca de metade da população enfrenta grave escassez de água diariamente. Os poços escalonados do Rajastão e os canais de irrigação dos Andes peruanos, embora indiretamente, são soluções integrais para aliviar preocupações mais amplas com a água em ambos os países. Essas duas tecnologias sublinham os impactos duradouros dos antigos sistemas de gestão da água e o quanto eles ainda têm um papel importante a desempenhar para tornar o mundo mais habitável hoje.

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Sobre este autor
Cita: Maganga, Matthew. "Captação de água: antigas tipologias que nos sustentam" [Water Harvesting: The Ancient Typologies That Sustain Us] 16 Abr 2022. ArchDaily Brasil. (Trad. Sbeghen Ghisleni, Camila) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/979199/captacao-de-agua-antigas-tipologias-que-nos-sustentam> ISSN 0719-8906

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