Como a arquitetura dos videogames conversa com você

Video games e mundos virtuais estão cheios de ambientes criativos para explorar, tempos alternativos para conhecer e estilos arquitetônicos inventados para folhear em cada realidade em que escolhermos mergulhar. Com os avanços recentes em tecnologia, maiores do que em qualquer momento da história, estamos testemunhando gerações de consoles e PCs com habilidade de produzir cenários praticamente reais, onde jogadores podem perambular, se perder, e explorar todas as nuances pertencentes a essas realidades praticamente autênticas. 

Como a arquitetura dos videogames conversa com você  - Imagem 2 de 12Como a arquitetura dos videogames conversa com você  - Imagem 3 de 12Como a arquitetura dos videogames conversa com você  - Imagem 4 de 12Como a arquitetura dos videogames conversa com você  - Imagem 5 de 12Como a arquitetura dos videogames conversa com você  - Mais Imagens+ 7

O design arquitetônico possui o poder de nos manter imersos em um mundo virtual, mesmo quando não estamos cientes de que ele está ao nosso redor, tangível, nos encapsulando nos momentos mais evasivos. Mundos virtuais têm o objetivo de transportar temporariamente os consumidores a uma outra realidade, um ambiente bem construído que pode transmitir coisas sutis, como emoções, sentimentos e sensações. Os segredos que estão escondidos atrás dos conceitos de design arquitetônico dentro desses mundos virtuais quase funcionam como um idioma que arquitetos e designers usam para influenciar a maneira como nos deslocamos e nos sentimos quando percorremos uma jornada por esses espaços como jogador. Eles criam uma experiência para o usuário, garantindo que, não importa o que você esteja fazendo, você está interagindo com um sistema construído e curado especificamente para você, o usuário final.

Video games fomentam a mentalidade que permite que a criatividade cresça -- Nolan Bushnell

E aí vem a grande pergunta: como arquitetos e designers estão tentando se comunicar essa linguagem secreta com você como consumidor? Eles têm o objetivo de atingir isso por meio do espaço, da construção, da materialidade, e da luz

Espaço

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Captura de tela de Control (2019). Imagem via Control

Arquitetos utilizam um conceito chamado compressão e expansão para administrar o movimento dentro do design de espaços. Corredores longos utilizam a compressão para incentivar as pessoas a continuarem indo para frente, e uma vez que elas cheguem a uma sala de exposições, por exemplo, onde há uma expansão do espaço, nós naturalmente começamos a passear e absorver as nuances do espaço que se desdobra ao nosso redor a cada passo. 

Esse padrão de pequenos espaços alimentando espaços maiores existe em uma série de video games, e é uma premissa geral dentro design de mundos virtuais, mas fica ainda mais notável nas arenas dos "chefões". Gamers experientes sabem o sentimento de entrar em um ambiente tão amplo que chega a ficar suspeito, contrastando diretamente com o que acabaram de passar, e aquela intuição aparece para que eles saibam definitivamente que há algo errado. Esse é um exemplo de como os arquitetos e designers utilizam o espaço para comunicar esses lembretes para nós enquanto jogadores, e como somos continuamente padronizadas e condicionados a esperar resultados específicos a partir de um design específico que encontrarmos.  Dessa maneira, somos convidados a ler a  arquitetura - alguns dizem que estamos literalmente lendo a sala. 

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Captura de tela de Ashtray Maze, Control (2019). Imagem via Control

Control (2019) tem um exemplo bem notável sobre o uso da compressão no labirinto de cinzeiro, onde essencialmente você é afunilado por um corredor estreito e comprimido, onde tudo que é possível fazer é continuar correndo em frente até que o labirinto se espande progressivamente em torno do personagem interagindo com seus arredores.

As decisões arquitetônicas de design feitas para a produção de Control são muito eficientes, já que o jogo tem uma série de aspectos mecânicos centrados em torno de movimento, especialmente além da nossa atual realidade. Há aspectos de corrida, arremesso de objetos, e até voo, e a arquitetura suporta todos eles. O interior de alguns dos principais prédios com os quais você interage são, em sua maioria, uma série de salas gigantescas e interconectadas. 

Construção 

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Captura de tela de Overwatch (2016). Imagem © Philip Klevestav

O storytelling do ambiente é um elemento chave no sucesso de um game, especialmente quando ele depende muito de uma história de origem ou de uma tradição que está na dianteira do seu objetivo a ser buscado e completado. Salas específicas e itens encontrados dentro desses espaços são intencionalmente colocados ali para nos dizer que algo aconteceu servindo um papel importante para nos levar pelo enredo. Ao invés de descrever explicitamente os eventos, os jogadores são convidados a interpretar a causa do resultado a partir de pistas contextuais em volta dele, com isso aprofundando a imersão no mundo virtual.

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Concept Art de Assassin's Creed II (2009). Imagem © Ubisoft Montreal

arquitetura hostil. Um projeto com paredes baixas acompanhadas de pontas é colocado em diferentes ambientes urbanos para impedir indivíduos, e para guiar e restringir comportamentos. Mesmo a implementação de uma estratégia de design urbano pequena assim nos conta sobre para quem e o quê é valioso para a cultura que construiu, e também podemos inferir sobre os problemas pelos quais aquela área urbana pode estar passando. 

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Captura de tela de Anor Lando, Dark Souls (2011). Imagem via Dark Souls

Em Dark Souls (2011), uma cidade chamada Anor Londo é um momento crucial do jogo, já que é a primeira vez com a qual o jogador se depara com uma paisagem caracterizada por elementos arquitetônicos harmônicos e agradáveis. O que é muito interessante notar é a habilidade dos projetistas em realmente entrar na cabeça de um arquiteto, já que a cidade apresenta dois tipos diferentes de escadarias: um deles central com degraus imensos, e outro com dois degraus médios em cada lado. Por que, você pode perguntar? Esse design conta muito sobre a história da cidade, já que Anor Londo era compartilhada entre gigantes e humanos, e consequentemente a arquitetura reflete isso. A beleza disso é que as escolhas arquitetônicas feitas pelos designers são feitas puramente pelo propósito do storytelling, e escolher caminhar por qualquer um dos tipos de escadarias não vai afetar seu jogo, mas abre a porta de oportunidade de ainda mais imersão para o jogador. 

Materialidade 

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Captura de tela de Overwatch (2016). Imagem © Philip Klevestav

Designers de jogos usam materiais para evocar sentimentos. No bom design, é importante considerar tanto a praticidade quando a psicologia nas decisões tomadas. O propósito ao qual a materialidade serve, no entanto, não se dilui nas propriedades estruturais apenas, mas também em como informa uma experiência pessoal de um prédio através de qualidades estéticas, visuais e tácteis, e também de seus significados sociais, culturais e históricos associados.  Indivíduos deveriam se sentir bem quando estiverem em seu prédio fazendo o que quer que seja que precisem fazer, a não ser que você esteja tentando evocar justamente o oposto disso. Alguns jogos tentam propositalmente te contar uma história desconfortável, e a arquitetura e a psicologia dos espaços que você é chamado a interagir fará exatamente isso. 

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Captura de tela de Overwatch (2016). Imagem © Philip Klevestav

Arquitetos são interessados em sair tocando prédios por nenhuma razão em particular, e embora a premissa possa ser bem divertida (a ideia de observar um indivíduo parecendo tão íntimo com aquela fachada de metal naquele prédio pelo qual você passou há pouco) é importante que eles entendam como será existir naquele espaço para o usuário final. 

Enquanto seres humanos, fazemos associações específicas com materiais e memórias de toque, que influenciam nossas emoções, e embora o que vemos em jogos e mundos virtuais possa ser considerado o mais longe possível das experiências tangíveis, designers de jogos ainda assim irão utilizar o conceito do material da mesma maneira que fazem os arquitetos. 

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Captura de tela de Portal (2007). Image via Steam

As escolhas de materialidade em Portal (2007) nos contam uma história de desconforto e de negligência extrema no local de trabalho. À maneira em que você avança no jogo, as câmaras de teste elegantes de concreto começam a dar lugar aos pedaços de metal quebrado e enferrujado. O contraste do elegante ao sombrio dá aos jogadores indicações de onde no prédio deveríamos estar e onde não deveríamos - tudo comunicado apenas através do uso da materialidade. 

Luz 

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Captura de tela de Overwatch (2016). Imagem © Philip Klevestav

Assim como em materiais físicos, a luz é prática, artística e psicológica, tudo de uma vez. É a ferramenta arquitetônica que amarra tudo em conjunto, interagindo com materiais, preenchendo espaços, e a presença ou falta dela conta uma história atraente, colocando os jogadores em imersão ainda maior.

Nos jogos e na vida real, a luz nos guia e aponta a direção de onde deveríamos e não deveríamos estar. Designers de jogos, mais uma vez, capitalizam sobre o uso da luz e reconhecem sua habilidade em trazer conforto e o sentimento de segurança, e como a ausência desse luxo pode nos fazer sentir inseguros. Por exemplo, nos jogos de terror quando as cenas e cenários parecem normais e até aconchegantes, os designers sabem exatamente o que estão fazendo ao tornarem a iluminação tão central no jogo - o que antes parecia uma casa normal agora é vista como assombrada e um lugar a ser temido apenas pela mudança da luz. 

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Captura de tela de Overwatch (2016). Imagem © Philip Klevestav

Enquanto avançamos para a era do rastreamento real de raios de luz e de tecnologia aprimorada de maneira geral para novos projetos e conceitos, designers e arquitetos agora possuem a habilidade de iluminar as coisas e imaginar os significados da luz nos projetos de prédios e espaços de uma maneira ainda melhor. Eles agora possuem a aptidão de tornar texturas de materialidade saltarem para construir sistemas complexos de iluminação, e para criar espaços detalhados para nos submergirem em uma gigantesca utopia de imaginação e criatividade.

Tanto nos video games quanto nos mundos virtuais, a arquitetura desempenha um papel maior do que o de apenas um cenário ou um meio padrão de se comunicar contexto e cultural, mas se torna um componente fundamental necessário para transcender os jogadores em outro mundo que pareça tão autêntico quanto o mundo real, com a exceção da adrenalina e dos riscos acrescentados.

A experiência pessoal do indivíduo, as emoções evocadas através do engajamento com os tipos de video games, e o papel que as visualizações arquitetônicas desempenham nesses mundos virtuais são todas essenciais para colocar o indivíduo em total imersão. 

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Captura de tela de Overwatch (2016). Imagem © Philip Klevestav

Este artigo é parte dos Tópicos do ArchDaily: O futuro da visualização arquitetônica. Mensalmente, exploramos um tema específico através de artigos, entrevistas, notícias e projetos. Saiba mais sobre os tópicos do ArchDaily. Como sempre, o ArchDaily está aberto a contribuições de nossos leitores; se você quiser enviar um artigo ou projeto, entre em contato.

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Sobre este autor
Cita: Joson, Jullia. "Como a arquitetura dos videogames conversa com você " [How Video Game Architecture is Speaking to You] 11 Fev 2022. ArchDaily Brasil. (Trad. Belo, Pedro) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/975276/como-a-arquitetura-dos-videogames-conversa-voce> ISSN 0719-8906

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