Os jardins de Mina Klabin Warchavchik: modernidade pública e privada

A história de vida da paisagista paulistana Mina Klabin Warchavchik se confunde com a história da arte e arquitetura modernas no Brasil, sobretudo em São Paulo. Seu pai, Maurício Freeman Klabin, imigrante lituano, saíra da Rússia por um decreto que proibia os judeus de serem donos de terra no país. Recém chegado ao Brasil no fim do século XIX, passa a trabalhar em uma oficina que produzia livros em branco para o mercado tipográfico, da qual passa a ser proprietário em poucos anos.

Casa Modernista da Rua Santa Cruz. Imagem via Blogspot Holodeck

Pouco tempo depois, com a chegada de alguns membros da família à capital paulista, Maurício Klabin funda, em 1899, a Klabin Irmãos&Cia., inaugurando um período de ascensão financeira que permitiu que em 1903 a família adquirisse lotes na região que atualmente se conhece como Chácara Klabin. Dentre os familiares que chegaram ao país estava a noiva de Maurício, Bertha Osband, com quem ele teve quatro filhos. Mina, a mais velha, nasceu em outubro de 1896 e teve, assim como seus irmãos, uma educação dividida entre a Europa e o Brasil, aos moldes suíços e franceses, que lhe rendeu uma formação ampla, diversificada e muito próxima ao campo da arte.

Casa Modernista da Rua Itápolis. Imagem via Casas Brasileiras

Em 1927, Mina casa-se com o arquiteto Gregori Warchavchik, que chegara ao Brasil quatro anos mais cedo, vindo da Ucrânia, território que fazia parte do Império Russo à época. Um ano mais tarde, foi no terreno da família de sua esposa que ele pôde construir seu projeto mais importante e um verdadeiro marco na história da arquitetura moderna no país, a Casa Modernista da Rua Santa Cruz. Esse projeto é tomado como primeiro exemplar de residência moderna no Brasil e tem sua importância histórica reconhecida oficialmente por meio de tombamentos a nível municipal e estadual. Apesar disso, pouco se fala do desenho para os jardins da casa, projeto de Mina.

Casa Modernista da Rua Santa Cruz. Imagem via José Tavares, 2007

Utilizando espécies nativas brasileiras e rompendo com parâmetros em voga na Europa, esse projeto é considerado pioneiro no emprego de vegetação tropical e se relaciona de forma direta com a arquitetura, reiterando os aspectos discursivos e formais pautados pelo imaginário modernista. Algumas das marcas registradas do trabalho de Mina enquanto paisagista já se anunciavam nesse projeto, sobretudo o uso dos arranjos de cactos, elemento simbólico que remete ao repertório da pintura moderna nacional. Gregori e Mina estavam comprometidos com o debate de vanguarda da época, e essas marcas e elementos simbólicos estão diretamente ligados ao contexto que orientava a produção arquitetônica, pictórica, musical, literária e, nesse caso, paisagística. Foi na Casa da Rua Santa Cruz, residência do casal, inclusive, que se fundou a SPAM (Sociedade Pró-Arte Moderna) da qual Mina foi a primeira diretora.

Casa Modernista da Rua Bahia. Imagem via arquivo.arq.br

Além do comprometimento a nível pessoal, havia na vida de Mina outras circunstâncias que reforçavam certo espírito ligado à arte e ao novo. Sua irmã mais nova, Jenny, era casada desde 1925 com o artista Lasar Segall. O projeto para a casa desse núcleo da família também foi desenhado por Gregori, em parceria direta com Segall e paisagismo de Mina. A casa, composta a partir da junção de três unidades de casas de aluguel também fazia parte do terreno da família, onde viviam todos. 

Casa da Rua Santa Cruz, jardim de Mina Klabin. Acervo Gregori Warchavchik

O jardim dos Segall também era composto exclusivamente de espécies nativas de clima tropical, com um desenho que acompanhava a arquitetura e criava espaços ao ar livre importantes e autônomos, como o jardim em frente à parte da casa dedicada ao estúdio do pintor. Mais tarde, com a morte do artista, a casa passou a ser um museu e sofreu inúmeras alterações em relação à proposta original.

Casa da Rua Santa Cruz, jardim de Mina Klabin. Acervo Gregori Warchavchik

O trabalho em parceria com seu marido, todos os esforços de confluência cultural e a vida privada de Mina Klabin Warchavchik refletem um momento central para as discussões sobre arquitetura e formação de identidade nacional. Essa trajetória que mistura a esfera pública com a privada é simbolizada por sua figura em várias instâncias mas, apesar disso, seu trabalho é pouco reconhecido. Nesse sentido, é de extrema importância revelar como essas histórias subjetivas e sua tradução em trabalhos e ideais potencializa e amplia a compreensão sobre momentos paradigmáticos da história cultural brasileira.

Bibliografia:
PERECIN, Tatiana. Azaléias e Mandacarús: Mina Klabin Warchavchik, paisagismo e modernismo no Brasil. São Carlos, Dissertação de Mestrado, EESC.USP, 2003.
SANDEVILLE JR., Euler. A herança da paisagem. São Paulo, Dissertação de Mestrado, 1993

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Sobre este autor
Cita: Julia Daudén. "Os jardins de Mina Klabin Warchavchik: modernidade pública e privada" 11 Jun 2019. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/918710/os-jardins-de-mina-klabin-warchavchik-modernidade-publica-e-privada> ISSN 0719-8906

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