Rosa Kliass: Poeta da paisagem

Considerada a dama do paisagismo brasileiro, Rosa Grena Kliass foi a mulher responsável pela transformação no cenário, ao longo de uma caminhada de amadurecimento, traduzindo à sociedade a luz sobre a importância do papel do arquiteto paisagista.

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Sua trajetória pelo paisagismo se confunde com a própria origem do paisagismo no Brasil. Paulista, nascida em 1932 na cidade de São Roque, foi durante seu último ano no curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), em 1955, que teve contato com a disciplina de paisagismo. Na época, o curso ainda estava se estruturando e havia recém se desmembrado da Escola Politécnica, tendo um caráter mais técnico. Foi o arquiteto Luís Inácio de Anhaia Melo, seu fundador e primeiro diretor, quem teve a sensibilidade de inserir o Paisagismo ao currículo do curso, trazendo de Berkeley (EUA) o paisagista Roberto Coelho Cardozo, que estava trabalhando com Burle Marx no Brasil.

Únicas mulheres a se formarem naquela turma da USP, a amiga e posterior colega de trabalho Miranda Magnoli descobriram o ofício durante as aulas do americano Coelho Cardozo, que veio a se tornar um importante arquiteto paisagista moderno da cidade de São Paulo, encontrando imediatamente o destino de sua carreira profissional. Ele trouxe a experiência californiana, muito ligada à cidade, fundamental para a formação de Rosa.

Juntamente com Magnoli, é considerada a primeira arquiteta paisagista mulher no Brasil, enfrentando dificuldades no início da carreira por conta da escassez bibliográfica e de colegas profissionais paisagistas no Brasil. Diante da falta de demanda de trabalho na área, atuou mais diretamente em Arquitetura e Interiores. De maneira estratégica, Rosa e Miranda inseriam jardins internos e externos junto aos projetos, de modo que conseguissem aplicar as experimentações.

© Ruth Cuiá Troncarelli - Via Arquigrafia (CC BY-NC-SA 3.0). ImageParque Mangal das Garças

Em 1958 nasceu o primeiro grande projeto - três anos após sua formatura - para o Largo dos Mendes, em sua cidade natal São Roque, SP. À convite do prefeito, antigo colega da escola, foi convidada a intervir no projeto da praça, o que posteriormente lhe rendeu o Prêmio da Prefeitura de São Paulo.

No final dos anos 60, ganhou uma bolsa de estudos e foi para os Estados Unidos, de onde trouxe a experiência americana do planejamento paisagístico, uma categoria dentro da arquitetura paisagística, do sistema de planejamento das áreas livres em escala regional, periurbana ou intraurbana, levando em conta as características da paisagem local, e que veio a marcar sua trajetória profissional.

Ganhadora de inúmeros prêmios e consagrada no campo da arquitetura paisagística, não pode simplesmente ser definida como figura ativa no desenvolvimento projetual, mas, como importante agente transformadora da paisagem brasileira, por meio de projetos e consultorias a Órgãos ligados ao Estado.

© Ruth Verde Zein - Via Arquigrafia Acervo FAUUSP (CC BY-NC-SA 3.0). ImageVista da reurbanização do Vale do Anhangabaú

Participou ativamente da discussão e desenvolvimento de diversos planos ligados ao Planejamento Urbano. Em Curitiba, elaborou o Plano Urbanístico e Paisagístico da Cidade, em 1965 contribuindo sob a administração de Jaime Lerner. Em São Paulo de 1966, na gestão do prefeito Faria Lima, foi convidada para projetar o Parque Morumbi, que nunca foi executado. Nesta ocasião instituiu um grupo de paisagistas dentro da prefeitura e, junto com Miranda Magnoli, convenceu o prefeito a criar o Departamento de Parques e Áreas Verdes da Prefeitura de São Paulo, desenvolvendo o Plano de Áreas Verdes, com projetos destinados a quarenta e quatro praças, entre elas os projetos executados para a Praça Benedito Calixto e Praça Pôr-do-sol. Em 1976, elaborou um estudo de Áreas Verdes e Espaços Abertos da Cidade de Salvador – BA.

Sua obra teórica, através de teses, livros e escritos ainda é de notável relevância, visto que a priori, havia escassez bibliográfica no campo paisagístico e Rosa foi responsável pela expansão e difusão dos escritos, contribuindo na formação de “profissionais da paisagem”, como costuma dizer. É autora do livro “Parques urbanos de São Paulo”, desenvolvido a partir do tema de sua dissertação de mestrado, defendida em 1989 na FAUUSP.

© Ana Mello. ImageRequalificação de Praças em Catanduva / Rosa Grena Kliass Arquiteta + Barbieri + Gorski Arquitetos Associados

Em 1976, participou da criação a Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas – ABAP, sendo sua primeira presidente e de lá pra cá, por mais 4 vezes. Também foi vice-presidente da Região Ocidental (Américas) da Federação Internacional de Arquitetos Paisagistas – IFLA, na gestão 2000-2002. Hoje ainda atua como conselheira suplente do CAU/SP e em 2016 foi agraciada com o título de “Cidadã Paulistana" pela Câmara Municipal da cidade.

Definir a importância da atuação de Rosa Kliass no território nacional é, sobretudo, dizer o quão determinada foi sua luta pelas conquistas e valorização do papel da arquiteta paisagista no âmbito social. Muito além das pranchetas, pode ser definida como protagonista da transformação da profissão, junto ao planejamento urbano. O fio condutor entre seus projetos é justamente a concepção de modo a preservar o traço cultural, antropológico e natural. Dessa forma, estabelecer um elemento que conecte o projeto ao sítio e à cultura local.

© Ana Mello. ImageRequalificação de Praças em Catanduva / Rosa Grena Kliass Arquiteta + Barbieri + Gorski Arquitetos Associados

No conjunto de sua obra, alguns de seus projetos destacam-se pelo papel na inclusão social e resgate cultural, como o Parque do Abaeté, em Salvador na Bahia, por exemplo. Ali foi criada a Casa das Lavadeiras, destinado às lavadeiras que por muito tempo lavaram roupas nas águas do parque e que corriam o risco de serem retiradas do local por parte da Prefeitura.

Outro projeto de destaque é o Parque da Juventude, também na capital paulista. Fruto de concurso ganho pelo escritório Aflalo & Gasperini para urbanização da área e transformação do antigo Complexo Penitenciário do Carandiru, com fortes marcas de violência e imagem negativa à população, foi ressignificado e transformado em um novo complexo cultural e esportivo através do paisagismo. Através do uso e ordenamento da vegetação e demais elementos do parque, foi estruturado num harmonioso desenho da paisagem, acolhendo o público e rompendo a imagem do passado. O projeto foi premiado pela Bienal de Arquitetura de Quito em 2004.

© Diogo Oliva - Via Flickr Quapá (CC BY-NC 3.0). ImageParque da Juventude

O Parque das Esculturas de Salvador, verdadeiramente criado a abrigar um conjunto de esculturas, é outro exemplo marcante, em que a ocupação do espaço foi desenhada de modo a privilegiar os percursos e suas relações com a paisagem.

Entre as centenas de projetos, destacam-se:

  • Projeto paisagístico para a Avenida Paulista (1973);
  • Parques Mariano Procópio e Halfeld – Juiz de Fora – MG (1979);
  • Reurbanização do Vale do Anhangabaú (1981);
  • Parque Mangal das Garças, Belém PA (1999);
  • Parque da Juventude (2000);
  • Parque do Forte, Macapá AP (2000).

© Cortesia de São Paulo City. ImageVale do Anhangabaú

Em linhas gerais, nota-se o quão importante é o papel de Rosa Grena Kliass ao campo da arquitetura paisagística no Brasil, idealizadora de tantos projetos pensados como conectores de aspectos sociais e naturais e ainda como figura protagonista nos movimentos pela valorização da profissão do arquiteto paisagista. Ainda hoje, Rosa ainda se mantém profissionalmente ativa, no auge dos seus 85 anos e tem à vista pelo menos mais duas publicações sobre suas obras.

Referências Bibliográficas

KLIASS, Rosa. Rosa Kliass: Desenhando paisagens, moldando uma profissão. São Paulo: SENAC, 2006.

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Sobre este autor
Cita: Matheus Pereira e Gabriel Pedrotti. "Rosa Kliass: Poeta da paisagem" 06 Out 2017. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/880958/rosa-kliass-poeta-da-paisagem> ISSN 0719-8906

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