Cinema e Arquitetura: "Final Fantasy: Os Espíritos Interiores" (2001)

Se algo caracterizou ao longo dos anos a saga dos games "Final Fantasy" é a profundidade das suas histórias e personagens, assim como o desdobramento imaginativo para recriar seus mundos extraídos praticamente de sonhos. A etapa, da qual esteve encarregado Hironobu Sakaguchi, fundador da saga, é amplamente reconhecida por explorar todos estes elementos, a nível de considerar seus trabalhos como obras-primas; impecáveis mundos de fantasia nos quais o jogador se encontra profundamente imerso como na melhor das literaturas ou no filme mais clássico.

Dentro de todas aquelas fantasia, talvez a que agora é nosso tema de análise, é, de fato, a mais incompreendida. Nem os críticos, nem o público em geral a receberam com ânimo, feito que levou a falência a companhia Square, que a produziu, carregando um maior estigma e rejeição como se fosse uma lenda obscura.

Não é tema desta análise aprofundar-se nas causas que levaram a este fracasso, mas é conveniente esclarecer os seus motivos principais para revindicar na medida o trabalho extensivo que foi necessário para sua realização. Primeiramente, sua realização extrapolou o orçamento inicial, estabelecendo uma arrecadação que somente grandes êxitos de bilheteria poderiam conseguir. Somado a isto, a grande legião de seguidores esperava ver um mundo tão mágico e tão rico em elementos como no game, mas em vez disso, encontrou uma ambientação cinza e desoladora, em um mundo muito humano onde a fantasia não era a protagonista.

É justo avaliar o filme pelo fracasso de suas expectativas? Tenho certeza que se o filme tivesse aparecido em diferentes circunstâncias, hoje em dia seria valorizado como um filme competente. O peso do seu nome e a falta de ação trepidante em um filme que foi vendido como "o êxito de verão" são, por acaso, argumentos que devem ser analisados para entender o trabalho criativo que levou a sua produção? Pessoalmente, é um tabu que eu gostaria de deixar para trás.

O filme nos transporta à um futuro onde humanidade perdeu a capacidade de viver no exterior. As cidades, como conhecemos hoje, tornaram-se grandes extensões fantasmas onde ninguém habita, vestígios de livros de história de quando o homem podia desfrutar do espaço público. Para sobreviver, a humanidade é coberta por grandes cúpulas de luz, que a torna prisioneira em um espaço limitado para se desenvolver.

Estas cidades, chamadas "barrerias", são um binômio entre o passado e o futuro. Na sua parte baixa, como apoio está a velha cidade, que ninguém habita e na qual grandes instalações são acomodadas para manter em funcionamento a cidade. Sobre os arranha-céus da antiga Nova Iorque, novas estruturas emergem sobre o alto, altamente automatizadas onde as pessoas vivem em espaços confinados e isolados.

A dinâmica da cidade mudou por causa das alterações na sua estrutura. A vida civil desapareceu para dar lugar a vida militar e científica. As praças públicas e os parque cederam sua presença aos laboratórios e as fortalezas. Grandes vias cruzam no alto do horizonte, mas já não servem para transportar pessoas na sua vida diária, e sim, transportam armas, veículos de combate e abastecimento.

Resumindo, o homem para sobreviver abandonou todo o rastro de vida natural, aquela que pela sua origem biológica lhe permitiria desenvolver-se em plenitude. Sakaguchi procura a todo o momento transmitir-nos o quão complexo pode ser o caminho da humanidade na busca por progresso. Será assim nossa vida futura, sob enormes cúpulas de cristal, uma vez que degradamos nosso espírito e nosso planeta?

Perfil do Diretor

Hironobu Sakaguchi é um famoso designer de games, diretor e produtor de cinema nascido no dia 25 de novembro de 1962. Começou seus estudos no Instituto Mito Senior para posteriormente estuda engenharia elétrica na Universidade Nacional de Yokohama, que abandonou para trabalhar meio período na pequena empresa Square, que até então, era uma filial da companhia Dynyusha Electric. 

Quando Square conseguiu se tornar independente, começou a dedicar todo o seu tempo no desenvolvimento de games. Seus primeiros trabalhos foram um fracasso e a empresa quase faliu. Sem esperanças, Sakaguchi trabalhou no que pensava ser seu último game, que chamou de "Final Fantasy" e assim encerraria sua etapa como designer de jogos. 

Entretanto, aconteceu tudo ao contrário, o jogo tornou-se um êxito de vendas salvando a empresa e criando uma saga de games  que hoje em dia continua vendendo e tornou-se uma referência obrigatória.

Em 1991, Sakaguchi foi promovido para a vice-presidência da empresa e mais tarde, em 1995, foi nomeado presidente da Square na sua sede nos Estados Unidos, cargo que abandonaria de maneira voluntária em 2001, devido ao rumo comercial que a empresa estava tomando, fundando a companhia Mistwalker sob a liderança da Microsoft.

CENAS CHAVE

1. O Fantasma da Humanidade

Próxima da extinção, a vida moderna é uma lembrança da história. A cidade se torna um território proibido, escuro e labiríntico onde nada pode sobreviver.

2. Exílio Terrestre / Domínio Alienígena 

A cidade de Tucson está devastada. Toda forma de vida, incluindo a vegetal pereceu. Somente o homem, através do sua maior invenção, a cidade, exilou-se daquela aniquilação.

3. A "Cidade Barreira"

Sem opções, a humanidade se refugia nas gigantescas barreiras "bio-etéreas” que não funcionam somente como proteção, mas também geram oxigênio diante da falta de vida vegetal.

4. Nova e Artificial Cúpula Terrestre

O conceito de cidade barreira é uma clara referência ao "Projeto Eden" do arquiteto Nicholas Grimshaw, que buscava abrigar dentro de uma grande cúpula uma cidade auto-sustentável. 

5. Sobre-estrutura / Maximalismo Urbano

Sem espaço para crescer, enormes estruturas apoiam-se sobre os antigos arranha-céus. O espaço público morreu e cada canto é utilizado para a sobrevivência da humanidade.

6. Visões de um Mundo Alienígena 

Extraído de uma fantasia clássica, o mundo alienígena aparece como um grande deserto vermelho que lembra Marte. Na sua superfície não existem cidades e a vida parece existir de forma subterrânea.

7. Estruturas Tecno / Orgânicas

Diferentes das humanas, as construções alienígenas estão baseadas em formas claramente orgânicas. Seus próprios corpos assimétricos são uma fusão entre máquina e ser vivo.

8. Arca de Noé / Zoológico Alienígena 

Devido a uma extinção massiva, os espíritos chegam a terra. Sua biodiversidade é grande como a terrestre, mas incompatível e incapaz de criar um diálogo.

9. Luta pelo Habitat Terrestre

O espírito invasor estende, como uma árvore, suas raízes de maneira agressiva na Terra. A luta se dá no plano simbólico, com a humanidade tecnológica/artificial e o invasor natural/espiritual.

10. O Espírito da Terra, GAIA

O diretor procurou criar uma história com um funco claro. A Terra está viva em um macro ecossistema que relaciona todas suas partes que sempre buscam equilíbrio.

11. A Mensagem Incomprendida de Sakaguchi

O maior inimigo da Terra, apesar da presença alienígena, resulta ser o próprio homem, que com sua tecnologia se afasta de suas origens naturais e perde o respeito por seu lar.

FICHA TÉCNICA

Data de Estreia: 2 de julho 2001
Duração: 106 min.
Gênero: Ação / Ficção Científica / Animação
Diretor: Hironobu Sakaguchi
Roteiro: Al Reinert / Jeff Vintar
Fotografia: Moto Sakakibara

SINOPSE

No ano de 2065, a Terra foi invadida por alienígenas, formas fantasmagóricas capazes de matar somente com o contato físico. Os humanos vivem as margens da extinção dentro de "cidades barreiras" em uma constante luta pela sobrevivência.

Guiada por um estranho sonho, a cientista Aki Ross se vê imersa na busca por oito peculiares espíritos, com os quais cria uma força poderosa para proteger o planeta Mas, ao voltar de uma das suas buscas e reencontrar-se com Gray Edwards, um antigo caso amoroso, Aki percebe que talvez os alienígenas não são a principal ameaça para seu caminho e o da humanidade.

Sobre este autor
Cita: Altamirano, Rafael. "Cinema e Arquitetura: "Final Fantasy: Os Espíritos Interiores" (2001)" [Cine y Arquitectura: "Final Fantasy: The Spirits Within" (2001)] 20 Mar 2015. ArchDaily Brasil. (Trad. Sbeghen Ghisleni, Camila) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/762231/cinema-e-arquitetura-final-fantasy-os-espiritos-interiores-2001> ISSN 0719-8906

¡Você seguiu sua primeira conta!

Você sabia?

Agora você receberá atualizações das contas que você segue! Siga seus autores, escritórios, usuários favoritos e personalize seu stream.