Light Matters: Recuperando a escuridão do céu

O advento da luz elétrica permitiu que colonizássemos a noite. Não só os quilômetros de iluminação artificial garantem maior segurança, mas também sinalizações, propagandas, etc. continuam a nos direcionar nas paisagens noturnas. Como Rem Koolhaas explorou em Nova York Delirante, Manhattan e Coney Island foram os primeiros protótipos luminosos para as metrópoles continuamente vibrantes de hoje: cidades que estabeleceram novos ritmos, um novo equilíbrio entre trabalho e vida.

Mas o que acontece quando a iluminação atrapalha nosso equilíbrio natural? Quando perdemos a beleza do céu escuro, as estrelas? O que acontece quando a iluminação se torna poluição?

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Independentemente de se viver em uma megacidade da Ásia ou em uma pequena vila nos Alpes, a luz elétrica substituiu o luar. Partículas no céu refletem as emissões de luz urbana e reduzem a possibilidade de se apreciar as estrelas à noite. Este "brilho" não só afeta as pessoas, particularmente astrônomos, mas também outros organismos, como pássaros orientados pelas estrelas.

Light trespass. The City Dark. Filme de Ian Cheney. Imagem de divulgação.Cortesia de www.thecitydark.com

Devido à abundância de luz, quase esquecemos a maneira sensível que nossos olhos podem perceber o ambiente à noite. A luz da lua é suficiente para identificar objetos a nossa volta e para nos guiar. Nossos olhos podem lidar com diferenças extremas - luz do sol ao meio dia com até 100.000 lx e uma caminhada sob o luar com cerca de 0,25 lx - e assim pequenas mudanças não fazem diferença: se você vê um contraste de 50%, quase não vai notar a variação. Seus olhos começam a perceber um contraste de brilho de cerca de 20%. 

A cidade de Viena confirmou este fenômeno ao reduzir a iluminação urbana em 50% durante uma hora, todas as noites. Como Thomas Posch, do instituto de astrofísica da Universidade de Viena, descobriu, quase ninguém notou - exceto astrônomos, que detectaram uma redução significativa na poluição luminosa. A administração da cidade, por outro lado, teve plena consciência deste fenômeno: foram economizados 200.000 euro por ano.

Só nos EUA, o desperdício de energia com a poluição luminosa chega a $2.2 bilhões por ano, segundo a Dark-Sky Association. Christian Luginbuhl, astrônomo no United States Naval Observatory, e sua equipe descobriram que a poluição luminosa de Flagstaff, Arizona deriva em primeiro lugar da iluminação comercial (36%) e, em seguida, de campos esportivos iluminados (32%), vias de tráfego (12%) e de residências (9%). 

Composição por satélite da Terra à noite. Creditos: Data courtesy Marc Imhoff of NASA GSFC e Christopher Elvidge of NOAA NGDC. Cortesia de Craig Mayhew e Robert Simmon, NASA GSFC

Posch aponta que há 100 anos atrás a iluminação ao longo das vias tinha iluminância de apenas 0,25 Lux, enquanto hoje temos entre 25 e 75 Lux nas principais rodovias. Posch apoia a redução da iluminação pela metade ou até três quartos para períodos de pouco tráfego. A cidade de Augsburg, na Alemanha, adotou esta estratégia com sucesso.

Críticos dos níveis de iluminação mais baixos argumentam que as taxas de criminalidade e acidentes aumentariam. Entretanto, surpreendentemente, estudos mostram que áreas menos iluminadas não se relacionam com uma frequência mais alta de acidentes, ou que mais luz traria mais segurança ao trânsito, explicam Ursula Pauen-Höppner e Michael Höppner de um grupo de pesquisa de Berlim.

Starry Night de Tunc Tezel. Vales perto de montanha Uludag na Turquia. Courtesia de Tunc Tezel e TWAN

Muitos pesquisadores e designers se uniram para analisar os efeitos ecológicos da iluminação externa e para conscientizar o público. A Dark Sky Association, por exemplo, foi fundada em 1988. Governos estabeleceram projetos de pesquisas interdisciplinares, como o "Loss of the Night" na Alemanha, que considera a poluição luminosa do ponto de vista técnico, social, ecológico e da saúde.

Metropolis 40°25' N 3°41' W (Madrid) from the series Lux by Christina Seely. Image Courtesy of www.christinaseely.com

O projeto “Earth Hour”, um acontecimento mais simbólico, quando todas as luzes foram desligadas por uma hora em Sydney em 2007, se transformou em um evento mundial, com 7001 cidades em 153 países participando neste ano. Outras iniciativas incluem: “Night seeing” excursões de designers de iluminação; livros como The End of Night de Paul Bogard; concursos de fotografia de TWAN; publicações como "Lux" da fotógrafa Christina Seely, “Helvetia's Dream“ de Alessandro Della Bella, ”Our Vanishing Night” de Jim Richardson ou “Darkened Cities” de Thierry Cohan. O documentário The City Dark, de 2011, revela como a perda da escuridão se tornou uma discussão sociocultural essencial, e que seu retorno exigirá um comprometimento substancial.

Um aspecto essencial para retomar a escuridão do céu é a consciência da poluição luminosa, a constatação de que este é um problema crescente, e que a sociedade deve assumir responsabilidade - começando com a iluminação das nossas casas. Algumas comunidades e regiões já aprovaram leis que restringem a iluminação. A Eslovênia, que começou a regulamentação contra a poluição de luz em 2007, é uma pioneira. Entretanto, a poluição da luz não será realmente erradicada até que cada indivíduo esteja consciente e comprometido a fazê-lo.

Como Susan Harder, fundadora da Dark Sky Society, citou em uma entrevista para o New York Times há algum tempo: "Um dia veremos a poluição luminosa como vemos movimentos pela reciclagem ou ecologia, e nos perguntaremos como pudemos pensar de outra forma."

Tecnologia de iluminação precisa evitando a poluição luminosa. Benrath Castle, Duesseldorf, Germany. Arquiteto: Nicolas de Pigage (1723-1796). Projeto de iluminação: Architekturbüro Lamprecht, Vienna. Cortesia de ERCO, Thomas Mayer, http://thomasmayerarchive.de/categories.php?cat_id=370

Além da legislação, como os cidadãos podem começar a reverter a perda da noite? Aqui estão cinco dicas que você deve sempre ter em mente:

Iluminância - Familiarize-se com o ambiente e avalie a quantidade de luz realmente necessária à noite. Minimize superfícies iluminadas: por exemplo, tente iluminar um detalhe ao invés de uma fachada inteira.

Direção - Ao iluminar uma fachada, é melhor fazê-lo de cima para baixo ao invés de baixo para cima, para prevenir a perda de luz para o céu.

Fonte de luz - Selecione um espectro que não prejudique insetos ou outros animais, por exemplo luz ultravioleta.

Luminárias - Evite pontos de iluminação com uma distribuição de luz muito ampla, ao invés disso escolha luminárias com feixes de luz claramente definidos, que você pode facilmente direcionar para o alvo desejado.

Sistemas de controle - Fontes de luz reguláveis permitem que você ajuste a iluminação ao grau necessário. Sensores de tempo ou movimento, que permitem reduzir a luz em certas horas ou de acordo com o movimento, proporcionam uma otimização do consumo de energia.

Poste de luminária com sistema de orientação de luz preciso definido com ângulo limite para céu escuro. Cortesia de ERCO

Light matters, uma coluna mensal sobre luz e espaço, é escrita por Thomas Schielke. Trabalhando na Alemanha, é fascinado por iluminação arquitetônica, trabalha para a companhia de iluminação ERCO, publicou vários artigos e é co-autor do livro "Light Perspectives". Para mais informações veja www.arclighting.de ou siga-o @arcspaces

Sobre este autor
Cita: Thomas Schielke. "Light Matters: Recuperando a escuridão do céu" [Light Matters: Recovering The Dark Sky] 05 Out 2013. ArchDaily Brasil. (Trad. Marcon, Naiane) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/01-144247/light-matters-recuperando-a-escuridao-do-ceu> ISSN 0719-8906

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