"Aquilo que é mais natural, aquilo que é essencial resiste sempre": entrevista com José Carlos Nunes de Oliveira

No País dos Arquitectos é um podcast criado por Sara Nunes, responsável também pela produtora de filmes de arquitetura Building Pictures, que tem como objetivo conhecer os profissionais, os projetos e as histórias por trás da arquitetura portuguesa contemporânea de referência. Com pouco mais de 10 milhões de habitantes, Portugal é um país muito instigante em relação a este campo profissional, e sua produção arquitetônica não faz jus à escala populacional ou territorial.

Neste episódio da quarta temporada, Sara conversa com José Carlos Nunes de Oliveira sobre o Edifício dos Paços do Concelho da Trofa. Ouça a conversa e leia parte da entrevista a seguir.

"Aquilo que é mais natural, aquilo que é essencial resiste sempre": entrevista com José Carlos Nunes de Oliveira - Imagem 2 de 12"Aquilo que é mais natural, aquilo que é essencial resiste sempre": entrevista com José Carlos Nunes de Oliveira - Imagem 3 de 12"Aquilo que é mais natural, aquilo que é essencial resiste sempre": entrevista com José Carlos Nunes de Oliveira - Imagem 4 de 12"Aquilo que é mais natural, aquilo que é essencial resiste sempre": entrevista com José Carlos Nunes de Oliveira - Imagem 5 de 12Aquilo que é mais natural, aquilo que é essencial resiste sempre: entrevista com José Carlos Nunes de Oliveira - Mais Imagens+ 7

Sara Nunes - Começo por confessar aos nossos ouvintes que este episódio era para ser sobre a nova ponte que irá atravessar o Rio Douro, unindo o Porto a Gaia, por mais uma via. Mas depois de falar consigo ao telefone fiquei com muita curiosidade... talvez pela paixão com que falou sobre os Paços do Concelho da Trofa. Para além disso, também me interessou este projecto porque acho importante que o podcast reflicta que não se constrói apenas no Porto ou em Lisboa. É importante que também se possa mostrar que o trabalho do arquitecto é preciso noutras zonas do país. Estamos aqui hoje a gravar exactamente no atelier NOARQ, que se situa na Trofa e, por isso, também agradeço que – ainda que não tenha sido o José a desafiar-me a falar sobre o projecto – tenha falado sobre ele e que nos tenha trazido até cá para falarmos sobre este projecto. Começo por lhe perguntar quais são as vantagens em viver e trabalhar na Trofa face à cidade do Porto, que é uma cidade em que também trabalha e acabou justamente de chegar de lá. Quais são as vantagens que vê?

José Carlos Nunes de Oliveira - As vantagens que vejo... Eu tenho sentido isso, ao longo do tempo, porque também vivi muitos anos e tive atelier, durante muitos anos, no Porto. Devo estar a fazer neste momento talvez a mesma quantidade de anos de atelier na Trofa... que tive no Porto. Ainda assim no Porto estive mais anos, mas estou há dez anos aqui na Trofa. Vim para cá viver perante uma emergência familiar. Instalei-me aqui e, inicialmente, apenas a viver. Depois, mais tarde, mudei para cá o atelier e tem sido muito cómodo porque estou relativamente perto do atelier, portanto não sofro de problemas como o trânsito, etc. E tenho sido muito bem acolhido aqui na Trofa, devo dizer. Não tenho sentido propriamente aqui a deslocalização do centro nem em termos de encomenda. O Porto também está muito condicionado. Há uma concentração de arquitectos para além daquilo que se calhar é provável que seja desejável, não é? E, no entanto, a cidade é mais vasta do que propriamente o aglomerado urbano que, em particular, se condiciona ao interior da Circunvalação. O Porto é muito mais do que aquilo. O Porto é Gondomar, o Porto é Gaia, o Porto é Matosinhos, o Porto é Maia e também Trofa se calhar. Não sei... a cidade é cada vez mais constituída por estas periferias e, aos poucos, tem-se vindo a reconhecer um valor também de qualidade de vida nas periferias que, muitas vezes, não é possível no centro da cidade.

"Aquilo que é mais natural, aquilo que é essencial resiste sempre": entrevista com José Carlos Nunes de Oliveira - Imagem 12 de 12
© Attilio Fiumarella

Portanto a Trofa não é propriamente uma cidade modelar para quase nada, mas as alterações que tem sofrido nos últimos anos, nomeadamente no tratamento do espaço público... tem acontecido para mim uma revelação: as cidades são regeneráveis e são recuperáveis, de facto. E aquilo que parecia um amontoado desordenado de casas, de edifícios, de armazéns e de fábricas em que aparentemente tudo se misturava, como é normal acontecer nas periferias, de repente começa a ganhar estrutura através daquilo que é o espaço público justamente. Portanto, para mim tem sido uma surpresa muito positiva. Eu também tenho casa ainda no Porto... enfim... tendo esta ideia vaga de que uma pessoa não pertence nem ao Porto, nem à Trofa numa determinada altura porque somos estranhos num lado e no outro e, ao mesmo tempo, somos familiares. Mas... é verdade que tem sido muito confortável. Tenho muitos apelos para voltar ao Porto de amigos e da vida social, mas é verdade que me sinto muito confortável aqui. Fui muito bem acolhido.

SN - A Trofa inaugurou, no dia 5 de Novembro, os Paços do Concelho. E isto é ainda mais especial porque, pelos vistos, a Trofa nunca tinha tido Paços do Concelho. Pergunto-lhe: quando começou este projecto, quais eram os principais desafios que este projecto representava?

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JCNO - Antes de mais, este projecto era um desafio em si mesmo pela dimensão que tinha, perante aquilo que normalmente eram as nossas encomendas no atelier. As encomendas eram muito mais de índole familiar. Há anos que não trabalhava propriamente em concursos. Naquela época ainda dedicava uma parte substancial do meu tempo ao arquitecto Siza, portanto tive 15 anos no arquitecto Siza sempre numa condição de meio tempo em que ora trabalhava lá de manhã e à tarde trabalhava no meu gabinete... Portanto, dividia sempre os meus dias. A determinada altura, desapaixonei-me das grandes ambições e dos projectos muito grandes que pudessem também condicionar a minha actividade dentro do próprio atelier do Siza.

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© Attilio Fiumarella

Quando recebemos aquele convite a participar no concurso para a Câmara Municipal da Trofa, vimos naquilo um desafio grande, naturalmente, porque estávamos a falar de um edifício de seis mil e tal m2, com um programa muito denso a todos os níveis. Tratava-se de uma obra pública... [havia o desafio de] repensar a arquitectura que fazíamos recorrentemente... ainda que fizéssemos e façamos arquitectura sempre com índole experimental grande, a verdade é que um edifício público deve ser repensado pela sua manutenção e pela sua exposição ao tempo e, em particular, ao tempo meteorológico até. Portanto, foi um desafio desde o ponto de vista programático, do ponto de vista construtivo, do ponto de vista espacial daquilo que deve ser um edifício público. Em particular, o edifício municipal - aquilo que é o «ágora» moderno das nossas cidades. Portanto, tivemos de repensar claramente em tudo aquilo que tínhamos feito até aí e o que é que iríamos fazer neste caso.

Ouça a entrevista completa aqui e reveja, também, a terceira temporada do podcast No País dos Arquitectos:

Nota do editor: A transcrição da entrevista foi disponibilizada por Sara Nunes e Melanie Alves e segue o antigo acordo ortográfico de Portugal.

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Sobre este autor
Cita: Romullo Baratto. ""Aquilo que é mais natural, aquilo que é essencial resiste sempre": entrevista com José Carlos Nunes de Oliveira" 09 Dez 2022. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/993237/aquilo-que-e-mais-natural-aquilo-que-e-essencial-resiste-sempre-entrevista-com-jose-carlos-nunes-de-oliveira> ISSN 0719-8906

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