O que Björk, Pokémon e a história de uma refugiada podem nos ensinar sobre o futuro da arquitetura?

As tecnologias de Realidade Aumentada e Realidade Virtual já existem há algumas décadas, apesar de entrarem definitivamente no mercado apenas nos últimos anos, elas já ditam novas formas de viver e se relacionar. Como o mundo jamais terá menos tecnologia e mudará cada vez mais rápido graças a ela, certamente a profissão do arquiteto também sofrerá grandes mudanças, ganhando novos horizontes e desafios. Através de exemplos vindos da última exposição realizada por Björk, o fenômeno do Pokémon Go!, os documentários de Chris Milk e o filme conceitual criado por Keiichi Matsuda é possível ter uma ideia sobre quais serão os próximos passos dos arquitetos.

Saiba mais, a seguir.

Antes de tudo é importante compreender os conceitos de cada uma destas tecnologias: A Realidade Aumentada é interativa e ocorre em tempo real, concebida em três dimensões, seu processamento combina elementos virtuais com o ambiente físico. Já a Realidade Virtual é um meio de experiência sensorial que ocorre através de um sistema operacional no qual o usuário consegue chegar muito próximo da sensação de veracidade de algum ambiente ou situação.

Ambas tecnologias propiciam uma estreita ligação com a arquitetura e todo o ambiente construído, trazendo novas ferramentas que ampliam as sensações espaciais de quem as vivencia.

A realidade aumentada já começa a capturar a realidade física e a maior prova disto está na recente onda de pessoas que saem para longas caminhadas, criam novas amizades e dividem novas lembranças ao buscarem juntas por pokémons na cidade. Este é o fenômeno que Pokémon Go!, que possui o impressionante número de aproximadamente 9,5 milhões de usuários diários apenas nos Estados Unidos, está produzindo mundo afora.

Através da realidade aumentada do jogo, agora é possível que as pessoas possam buscar por pokémons desbravando o espaço público e conhecendo os marcos arquitetônicos de cada cidade, que jamais seriam vistos num videogame ou até poderiam passar despercebidos pela pressa cotidiana. O jogo encoraja e cria oportunidades para que os “treinadores pokémon” saíam de casa para ter novas experiências.

O CEO da Nintendo responsável pelo sucesso do aplicativo sugere que ao lançar o jogo eles tinham três ideias em mente para seus usuários: exercícios (o jogo é projetado para que você levante e se mova para achar novos pokémons), olhar o mundo com novos olhos (uma vez que marcos urbanos e lugares históricos se transformam em ginásios ou centros pokémon) e “quebrar o gelo” social (já que as pessoas agora organizam excursões em grupo e outras atividades coletivas em torno do tema).

Dentro destes tópicos vale ressaltar principalmente como importantes edifícios e parques públicos estão sendo ressignificados e ganhando novas funções de acordo com este novo mundo virtual. Um exemplo seria um museu que foi projetado como um espaço de exposições, mas que agora também desempenha a função de um centro pokémon no imaginário das pessoas.

A realidade virtual, por outro lado, ainda não atingiu um mainstream completo como a marca japonesa. No entanto já abrange diversos campos que também passam a influenciar nossas vidas. Aqui vale destacar a atuação de Chris Milk, cineasta que está experimentando o uso da realidade virtual em seus projetos, que nos traz um exemplo fascinante de como esta tecnologia contribui na conexão entre seres humanos e a percepção deles.

O filme “Nuvens sobre Sidra”, produzido pelo cineasta, foi gravado num campo de refugiados sírios na Jordânia e ali foi filmada a história de uma garota de 12 anos chamada Sidra, que fugiu com sua família da Síria atravessando o deserto até o acampamento onde se encontra. No filme, as falas da menina é apenas um dos meios que nos aproxima da realidade dela, através da realidade virtual você pode presenciar o seu quarto e ter a sensação de estar sentado ao lado dela ouvindo esta história. Dessa forma a experiência não é apenas uma narrativa contada, é possível se projetar na realidade tão distante da Sidra e torná-la ainda mais humana para o espectador. E é através da humanidade que é possível gerar mais empatia.

Sabendo disso, Milk e sua equipe levou este filme ao Fórum Econômico Mundial de Davos e exibiram ele a um grupo influente de pessoas que não possuem tempo para sentar numa barraca de um campo de refugiados na Jordânia, mas mesmo na Suíça, por uma tarde, estavam lá. E assim foram tocados pelo filme e, a partir desta realidade virtual, começaram a agir afetando o mundo real. Milk agora está filmando diversas histórias e mostrando-as na ONU a fim de possibilitar uma verdadeira mudança na vida destas pessoas através da realidade virtual.

Outro exemplo vem da Björk, que sempre está na vanguarda da indústria musical. No fim do mês passado a cantora islandesa fez uma apresentação de sua faixa “Quicksand” que foi transmitida ao vivo no YouTube em 360º. Foi o primeiro livestream de realidade virtual no mundo. O evento fez parte da exposição Björk Digital, que já passou pelo Japão e estreará em Londres, em setembro, apresentando uma curadoria de vídeos interativos e outras instalações que abordam a realidade virtual. Ou seja, através da exposição, o espaço físico do museu se expande e deixa de ser o que está exposto entre quatro paredes para ganhar novos cenários e ambientes.

Numa junção mais próxima do que essas realidades poderão nos apresentar no futuro, Keiichi Matsuda através de seu projeto HYPER-REALITY nos demonstra “uma nova visão provocativa e caleidoscópica do futuro, onde as realidades físicas e virtuais se fundiram, e a cidade está saturada por meios de comunicação”. Aqui esquecemos aquela ideia futurística de carros voadores poluindo nossa visão e o que vemos são diversos dispositivos virtuais que não estão presentes apenas no nosso olhar, como interferem no nosso cotidiano – nos guiando o tempo inteiro e praticamente adestrando o ser-humano. Um tanto quanto assustador, mas não tão distante do que já vivemos com os smartphones e outros sistemas tecnológicos.

Raymond Kurzweil afirma que em 2040 as pessoas passarão mais tempo imersos na realidade virtual do que na realidade dita. O que parece uma sentença assustadora pode também significar uma era na qual as pessoas possam viver da maneira que desejam através da tecnologia. Enquanto esta realidade engatinha, já é possível imaginar futuros conflitos e benefícios que ela nos trará e cabe ao arquiteto se juntar à outras disciplinas para saber como se posicionar para garantir mais uma vez a qualidade do espaço, seja real ou virtual, que vivemos.

Através destes exemplos é possível ter uma pequena amostra do que o futuro nos reserva. Novas formas de se relacionar com o espaço urbano e socialmente, viagens instantâneas a outras realidades e culturas. Como os arquitetos estão preparados para lidar com isso? Pensar espaços físicos que possam abrigar uma vida virtual, edifícios que possam ter funções completamente distintas num mesmo volume, cidades que possam abrigar diferentes realidades instantaneamente num mesmo espaço. Como projetar lugares que consigam abordar as vidas real e virtual?

Uma vez que a arquitetura não dependerá mais de uma construção específica, a liberdade projetual poderá chegar a níveis antes inimagináveis que terá como limite apenas o potencial dos programadores e da tecnologia da época. Uma vez que os ambientes projetados serão virtuais, os recursos materiais deixarão de ser devastados e até mesmo edifícios flutuantes serão possíveis, a criatividade terá aval para tudo. O futuro está apenas começando, mais uma vez.

Sobre este autor
Cita: Victor Delaqua. "O que Björk, Pokémon e a história de uma refugiada podem nos ensinar sobre o futuro da arquitetura?" 20 Jul 2016. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/791702/o-que-bjork-pokemon-e-a-historia-de-uma-refugiada-pode-nos-ensinar-sobre-o-futuro-da-arquitetura> ISSN 0719-8906

¡Você seguiu sua primeira conta!

Você sabia?

Agora você receberá atualizações das contas que você segue! Siga seus autores, escritórios, usuários favoritos e personalize seu stream.