O que os videoclipes podem nos ensinar sobre arquitetura?

Quando se trata da confluência entre música e arquitetura, talvez a primeira coisa que vem à mente seja a afirmação de Goethe de que "a música é a arquitetura líquida." Goethe, no entanto, viveu antes do surgimento da MTV: os videclipes se tornaram filmes em miniatura, buscando capturar todo o tom, tendências e contexto de uma determinada música e traduzi-los visualmente. Melhor do que isso, a maneira como os videoclipes usam a arquitetura não é a mesma como qualquer documentário ou filme faz; a câmera tenta imitar a forma como as pessoas ouvem a música cortando e tecendo o entorno, projetado para os ouvintes, tanto quanto para os telespectadores. Então, vemos protagonistas voltando-se para o lado, elementos importantes posicionados longe do centro e planos que exploram e dissimulam os espaços em uma tentativa de ajustar a acústica das músicas para o ambiente.

O que isto significa para nós é que os videoclipes podem relacionar-se com a arquitetura e capturar seus tons subjacentes de uma forma que um filme se esforça para fazer. Para um arquiteto perguntando como o público realmente entende e interage com um pedaço de arquitetura ou lembra de um estilo, os videoclipes são uma mina de ouro inexplorada, uma vez que cada localização das filmagens procura mostrar como nossa cultura se relaciona com um edifício. Confira a seguir sete videoclipes que nos dizem muito sobre a arquitetura que eles apresentam.

Chemical Brothers - Go

Seguindo um grupo de mulheres vestidas de lederhosen monocromático, o vídeo Go do Chemical Brothers conduz o modernismo a uma conclusão. Filmando em "Front-de-Seine, Paris, a coreografia e o figurino parecem ser inspirados no construtivismo, utilizando movimentos que sugerem máquinas. O trabalho de câmera usa vários ângulos e reflexões para enfatizar a forma e o movimento, um foco que é compartilhado com as torres modernistas que formam o plano de fundo do vídeo.

A adição de elementos futuristas e sugestões construtivistas impede que este vídeo seja outra exploração alienante da arquitetura modernista. Os ângulos e detalhes são tentativas de criar um senso de lugar mais do que um recurso arquitetônico, semelhante à maneira como a coreografia sugere máquinas ao invés de utilizá-las. Como tal, Go está se aproximando dessa arquitetura em seus próprios termos; retrô, tanto quanto futurista, este vídeo parece sugerir que as condições que deram origem ao modernismo não foram perdidas da nossa consciência coletiva.

Omi Palome - Architecture

Tomadas estáticas, em preto e branco, de construções brutalistas em Londres criaram o conceito simples deste vídeo. A canção é, afinal, chamada Architecture, e o vídeo trata esses edifícios como arquitetura "pura", em vez de edifícios para serem vividos, usados ou relacionados. Assim vemos, a uma longa distância, tomadas artisticamente compostas que imitam a fotografia procurando ângulos e detalhes que tentam elevar esses edifícios à Arquitetura.

O que estava por trás da escolha em caracterizar o brutalismo? Este vídeo parece mostrar que dentre todos os estilos, para Omi Palome, o brutalismo é o mais "arquitetônico". O fato dos prédios serem tão rígidos e reconhecíveis significa que quando esta banda pós-punk queria um estilo que parecesse artisticamente individual, eles escolheram brutalismo.

Art Department - Walls

Este vídeo animado para a música techno Paredes nos leva até Miami Beach, uma Babilônia imaginada de zigurates com uma tomada retrô-futurista em meados do século moderno. Estes elementos díspares combinam surpreendentemente bem, criando um ambiente utópico visualmente impressionante, usando o lazer imaginado dos Jardins da Babilônia e as aspirações do modernismo dos anos 1950 concretizados nas casas de arquitetos como Richard Neutra.

Os tons pastéis rosa e turquesa unificam tudo lindamente, mas também permitem que o vídeo explore outros aspectos do modernismo de meados do século. As tomadas, em grande parte estáticas ou com apenas um ou dois elementos em movimento, criam uma sensação sobrenatural, ligeiramente inquietante combinando o tom geral da canção com a paleta de cores tomada de cartões postais que contribuiu para a artificialidade. Neste vídeo, o estilo de Neutra e sua influência é entendida como alienante, até mesmo um pouco decadente, um tema encapsulado no clímax do vídeo quando esta cidade imaginária é literalmente envolta em escuridão.

Unit 4 + 2 - Concrete and Clay

No início do século XXI, as aparências do brutalismo em videoclipes foram coloridas pelos 40 anos de discussão arquitetônica e ambos os julgamentos conscientes e inconscientes do estilo. Mas, ao voltar para 1965, temos um pequeno vídeo de Unit 4 + 2 nas fundações do que viria a se tornar o Barbican, em Londres. Ao posicionar o grupo em um canteiro de obras sob uma paisagem cada vez mais moderna, a mensagem de amor eterno ao lado de referências de ruínas em concreto parece ser uma prospectiva agora - certamente parece estranho para os olhos contemporâneos ter uma música tão romântica definida em um ambiente brutalista.

Mas a música inteira é otimista e alegre. Enquadrar amor eterno contra a construção de Londres pode criar um ponto importante sobre a vida útil do modernismo, porém o vídeo, no entanto, lança o brutalismo como futuro brilhante da cidade - tornando-se um lembrete interessante para os telespectadores atuais sobre as condições culturais de cinco décadas atrás.

Leonard Cohen - In My Secret Life

Localizado na Moshe Safdie Habitat 67, a exploração de Cohen está situada entre fotos de pessoas com cabeças em formatos estranhos imitando a vida doméstica com variados graus de sucesso. Isso se estende a uma chacota do mercantilismo, que de alguma forma a construção radical de Safdie é muito ansiosa para permitir, como a geometria complexa do Habitat 67 é usada para fazer as rotinas familiares parecerem confusas e complicadas.

Cohen percorre tudo isso como um estranho, emoldurado contra e abaixo de alguns dos ângulos mais imponentes da construção de Safdie. Este vídeo utiliza a Habitat 67 para sugerir algum tipo de inconsciente coletivo, e muitas vezes projeta algumas das cenas mais surreais nas superfícies do edifício - cozinhando ovos, comendo ovos - como parte da própria estrutura. Há intimidade aqui também: mais do que muitos vídeos que utilizam o brutalismo, este realmente utiliza a arquitetura como espaço habitável.

Ryan Adams - New York, New York

Esta celebração a Nova York foi filmada apenas alguns dias antes do 9/11 em 2001. As torres do World Trade Center foram, naturalmente, muito utilizadas e apresentavam-se como o elemento principal do skyline das cenas com foco em Adams. Em vez de re-editar o vídeo a fim de esconder as torres, os produtores escolheram iniciar o vídeo com o simples texto "Este vídeo foi filmado no dia 7 de setembro de 2001."

Sem querer, esta pequena mensagem muda totalmente a forma como o vídeo refere-se a arquitetura. O que era um cenário temático relativamente inconsequente, de repente se torna nostálgico principalmente por ter sido filmado apenas alguns dias antes do ataque. A forma como as torres aparecem no horizonte - não aparecendo, mas dominando, uma característica central do mesmo - nunca mais poderá ser recriada sem que as torres sejam intencionalmente posicionadas ali.

Cold Mailman - Time is of the Essence

Um vídeo time-lapse que usa a arquitetura como um plano de fundo para um enorme espetáculo de luz, Time is of the Essence transforma Oslo em uma tela. Simplesmente girando luzes em edifícios individuais dentro e fora, o vídeo visualiza a música em toda a cidade. É uma idwia simples, mas utilizando a iluminação interna de cada apartamento mantém o vídeo atrelado ao espaço habitável, em vez de simplesmente utilizar os edifícios como um elemento de fundo, e sublinha a conexão da cidade como um todo.

As luzes são coloridas e alegres, e inerentemente conectadas com o resto da paisagem de Oslo em virtude da utilização da iluminação embutida dos edifícios - o mesmo que qualquer outro edifício nas tomadas- com exceção de uma forma estilizada. Outros vídeos que tentam sugerir uma vivência muitas vezes acabam estáticos, mas este fez os blocos de torres austeras parecerem ter vida e serem amados, quase como uma propaganda. 

Sobre este autor
Cita: Goodwin, Dario. "O que os videoclipes podem nos ensinar sobre arquitetura?" [What Can Music Videos Teach Us about Architecture?] 19 Ago 2015. ArchDaily Brasil. (Trad. Sbeghen Ghisleni, Camila) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/771934/o-que-os-videos-de-musica-podem-nos-ensinar-sobre-arquitetura> ISSN 0719-8906

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