Hora de confrontar o déficit habitacional nos centros urbanos

Mais de 1,2 bilhão de habitantes de cidades – uma de cada três pessoas que vivem em áreas urbanas – não têm acesso à moradia de forma acessível e segura. Esse déficit habitacional é um grande obstáculo para a economia e o meio ambiente. O impacto é severo na Ásia e na África, onde espera-se que 2,25 bilhões de pessoas se mudem para as áreas urbanas até 2050. Se tudo permanecer como está, as favelas crescerão em todos os países em desenvolvimento, ampliando a desigualdade e ameaçando o papel tradicional de motores do crescimento econômico exercido pelas cidades.

O mais recente estudo do WRI Ross Centro para Cidades Sustentáveis, parte do World Resources Report (WRR), “Rumo a uma cidade mais igualitária”, utiliza do conhecimento de dezenas de especialistas em temas urbanos e avalia como atender às necessidades dos moradores mais necessitados das cidades pode contribuir com a economia e o meio ambiente.

A habitação é muitas vezes vista em categorias, como pública ou privada, formal ou informal, individual ou coletiva. Em vez disso, o documento coloca o tema em um espectro que combina diferentes elementos como propriedade, espaço, serviços e financiamento. Em alguns casos, por exemplo, a terra pode ser pública, enquanto as habitações nela são privadas. Este espectro permite uma análise da realidade dos mercados imobiliários no sul global com mais nuances e a consideração de uma gama mais ampla de possibilidades.

Embora existam muitos desafios, nos concentramos em três, nos quais os gestores urbanos podem atuar e dar escala às transformações.

Desafio 1: O crescimento de assentamentos informais ou de baixa qualidade

Como a demanda por habitação superou a oferta, os assentamentos informais e de baixa qualidade proliferaram. Desde 1990, mesmo com a queda na proporção de pessoas vivendo em favelas, houve um aumento no número absoluto de pessoas que vivem nessas áreas.

Solução: Buscar maneiras de acomodar as pessoas onde elas estão

Enquanto alguns exigem cidades sem favelas, isso geralmente serve de código para que as pessoas sejam deslocadas para os subúrbios das cidades, o que interrompe os mercados de trabalho, as conexões e a vida social e prejudica a cidade em geral. Sugerimos encontrar maneiras de melhorar as áreas de favelas existentes, aproveitando o conhecimento e a energia da comunidade, mantendo links para redes sociais e meios de subsistência. Essa opção é melhor para as cidades com grandes populações em favelas, exceto em locais com riscos ambientais ou geográficos.

Um exemplo é o programa Baan Mankong, da Tailândia, que direciona os subsídios governamentais de infraestrutura e os empréstimos para habitação a comunidades pobres que, em seguida, negociam com os proprietários da terra e usam os fundos para melhorar suas moradias. Em 2016, 101.224 famílias de baixa renda em 345 cidades foram beneficiadas no âmbito do programa e contam agora com terras seguras, casas decentes e ambientes de vida saudáveis.

Desafio 2: Ênfase exagerada na propriedade

A ênfase na propriedade é exagerada no desenvolvimento urbano, o que prejudica quem não têm recursos para comprar uma casa ou quem precisa de flexibilidade, como os que trabalham na economia informal. Os subsídios destinados a encorajar a compra de propriedades estão voltados para aqueles com renda regular e documentada, não os que trabalham em atividades como reciclagem, trabalho doméstico e construção, por exemplo. Os aluguéis geralmente não estão disponíveis para as pessoas de renda mais baixa ou estão sujeitos a uma grande incerteza quanto aos direitos e responsabilidades tanto dos proprietários quanto dos locatários, com processos pouco claros para a resolução de disputas.

Solução: Expandir o mercado de aluguéis para pessoas de todas as faixas de renda

Estabelecer proteção legal para proprietários e locatários e, ao mesmo tempo, reconhecer a atividade informal pode ajudar a atender às necessidades habitacionais das pessoas de baixa renda, mantendo a flexibilidade e encorajando o desenvolvimento impulsionado pelo mercado. Isso inclui estabelecer padrões de pagamento diferenciados e permitir a habitação em cooperativas, nas quais os inquilinos compram um lote de terra coletivamente e alugam partes dele. Mercados de aluguel ativos estimulam um mercado de trabalho fluído, um pré-requisito necessário para a prosperidade econômica de qualquer cidade.

As autoridades da província de Gauteng, na África do Sul, que inclui Joanesburgo, enfrentaram um déficit habitacional de 687 mil unidades regularizando o aluguel de moradias construídas nos jardins das casas, que anteriormente eram ilegais. Isso tornou mais fácil para as pessoas de baixa renda encontrassem lugares para viver e encorajou o desenvolvimento de novos serviços sem subsídios do governo.

Desafio 3: Políticas que deslocam os pobres para as periferias

Em muitas cidades, lotes de terra estão muitas vezes presos em disputas legais, permanecendo subutilizados ou não utilizados, mesmo quando novos moradores buscam moradia na cidade. As regulamentações de uso da terra e de construções geralmente impõem custos e limitam o uso criativo de ferramentas inovadoras de gestão das terras.

Solução: Converter terra subutilizada, especialmente as públicas, em moradia acessível

Vontade política para atender às necessidades de habitação é fundamental. Em vez de encorajar a expansão do território, a terra urbana existente deve ser usada para habitação. Gestores públicos e desenvolvedores imobiliários devem revisar regras e padrões de construção para expandir a disponibilidade de habitação em terrenos subutilizados.

Por exemplo, em Cochabamba, Bolívia, 420 famílias vivem na comunidade Maria Auxiliadora, em terras compradas e mantidas com base na confiança, como uma propriedade comunitária. A estrutura de governança da comunidade é baseada em lideranças femininas, que trocam a cada dois anos. Homens que se envolvem em violência doméstica são rejeitados e as famílias que sofrem com esse problema têm acesso a apoio especializado. A terra não pode ser vendida com fins lucrativos, o que mantém a habitação acessível.

Essas soluções ajudam os tomadores de decisão em cidades de rápido crescimento a atender à demanda por habitação, ao mesmo tempo que incentivam o desenvolvimento econômico e ambientes mais limpos e seguros. Acabar com o déficit habitacional, proporcionando acesso a moradias acessíveis, adequadas e seguras, irá beneficiar todos, não apenas a população desatendida ou de baixa renda, já que as cidades se tornam mais produtivas, ambientalmente sustentáveis e verdadeiramente para todos.

Faça download do relatório “Enfrentamento da Crise da Habitação Urbana no Sul Global: moradia adequada, segura e acessível” em WRICidades.org.

Robin King é diretora de Captura de Conhecimento e Colaboração do WRI Ross Centro.

Via TheCityFix Brasil

Sobre este autor
Cita: Robin King. "Hora de confrontar o déficit habitacional nos centros urbanos" 30 Dez 2017. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/886329/hora-de-confrontar-o-deficit-habitacional-nos-centros-urbanos> ISSN 0719-8906

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