Seria o aprendizado online o futuro do ensino de arquitetura?

Este artigo foi originalmente publicado pela Common Edge como "Is Online Learning Really the Future of Architectural Education?"

O ensino superior está à beira de uma grande transição. É extremamente provável que a educação em arquitetura seja conduzida principalmente online num futuro relativamente próximo. Isso significa que as aulas de projeto, uma marco na vida do arquiteto, também acontecerão online, provavelmente sem o contato pessoal que define essa experiência. Essa mudança eliminará muitos aspectos autodestrutivos da cultura atual de ateliê, mas também há possíveis armadilhas que precisam ser abordadas, antes que uma versão online dessa cultura adquira seus próprios maus hábitos. Podemos fazer isso proativamente, desenvolvendo novos métodos de ensino e trabalho que alavanquem as capacidades da educação digital para promover a dinâmica social construtiva entre estudantes.

Para se ter uma noção de como a educação em arquitetura pode acontecer online, veja os cursos de arquitetura online acreditados pela NAAB atualmente disponíveis nos EUA:Boston Architectural College, Southern Illinois University e Lawrence Technical University, para citar alguns. Nesses programas, os alunos são divididos em grupos online, de tamanho semelhante aos cursos presenciais, e são solicitados a interagir uns com os outros e seus professores em ciclos semanais de lições, trabalhos e discussões. As aulas, em sua maioria, acontecem por vídeo, mas as tarefas utilizam um sistema multimídia para carregamento de desenhos e modelos que os alunos produzem offline, possibilitando a realização de uma versão online de um painel tradicional. O feedback é dado por professores através de comentários escritos ou bate-papo online, e os alunos geralmente são divididos em pequenos grupos para dar feedback uns aos outros.

O interessante desses programas que frequentemente são rotulados como de "baixa residência", ao contrário de "online", é que os alunos normalmente são obrigados a se reunir no campus uma vez por semestre para uma semana intensa de aulas dentro de salas tradicionais. Embora isso revele uma dependência prolongada de uma sala de aula, o uso de recursos de internet para traduzir um ensino que de outra forma é fortemente dependente de um lugar físico é impressionante.

Agora, considere os avanços que estão acontecendo no campo dos Cursos Online Abertos e Massivos (do inglês, Massive Open Online Courses ou MOOCs), que ainda estão se consolidando enquanto formato, mas já espera-se que substituam a educação à distância de baixa residência quando os cursos 100% online começarem a ser reconhecidos pelos órgãos nacionais de credenciamento (o que já aconteceu na França). Os MOOCs focados em arquitetura estão crescendo em plataformas como a EdX, que hospeda instituições notáveis, como a Graduate School of Design de Harvard e a Universidade de Tóquio. A maioria dessas aulas é baseada em palestras, mas algumas imitam o formato de ateliê de projeto. O curso da TU Delft "Desenho Urbano para o Bem Público: Urbanismo Holandês", por exemplo, lida com grandes números de uploads de projetos de estudantes com painéis em grupo do Pinterest e professores que oferecem feedback semanal em vídeo para toda a classe em algumas entregas.

Dado os crescentes custos do ensino superior, bem como a tendência da indústria tecnológica de gerar uma "disrupção" dos aspectos tradicionais da vida cotidiana, é provável que programas de baixa residência e MOOCs sejam as primeiras iterações de um formato de educação online que em breve substituirão a educação presencial, incluindo em arquitetura. O que vale a pena notar é que quase todos os aspectos da atual cultura de ateliê das escolas de arquitetura, que silenciosamente impulsionam o trabalho que os alunos produzem, são inteiramente dependentes do contato presencial entre colegas de classe. Olhando de forma superficial, essa cultura está para ser apagada - e isso não é necessariamente uma coisa ruim.

Atualmente, os cursos de arquitetura enfatizam projetos independentes dos estudantes, produzidos em pequenos grupos, em salas de aula específicas — os ateliês. Uma vez que este formato garante que os alunos passem muito mais tempo sozinhos uns com os outros do que com seus professores, muitas vezes gera-se uma preferência entre os alunos para apresentar soluções de projeto auto-justificadas que se baseiam em pouco ou nenhum conhecimento institucional que lhes é conferido nas aulas. Isso significa que passar noites trabalhando até tarde um ao lado do outro no ateliê, fora do alcance da orientação de um professor, impulsiona a intensa competição entre os alunos sobre coisas sobre as quais pouco sabem. Essa liderança não controlada geralmente leva a um foco indevido em questões completamente não relacionadas às lições que os professores das disciplinas estão tentando ensinar.

Em um programa de graduação 100% online, onde os alunos produzem os trabalhos em casa, por si só, essa condição não existe. Assim, uma transição para a educação online em arquitetura é uma oportunidade real de descartar os aspectos atuais da cultura de ateliê que promovem a desconexão entre o conhecimento arquitetônico e sua implementação.

Os benefícios da formação online em arquitetura, no entanto, também trazem uma grande desvantagem: falta a exposição direta aos pensamentos, valores e processos de trabalho de outras pessoas. Isso poderia levar a um futuro onde todos os programas, exceto os melhores, seriam conduzidos de forma online por um valor mais acessível, enquanto os alunos que poderiam investir numa educação presencial pagariam um valor mais alto por uma experiência premium presencial. Para evitar tal ruptura entre os futuros arquitetos, precisamos enxergar nos métodos de educação online vantagens que no ensino presencial não encontramos.

A essência desta oportunidade é ver as novas tecnologias como um meio para conceber novos métodos de ensino e trabalho, ao invés de substituir os existentes. Uma vez que tudo que é transmitido através de um dispositivo ou pela internet pode ser rastreado e gravado, diferente das interações presenciais, a educação digital oferece muitas vantagens que ainda não foram totalmente exploradas. Para os cursos de arquitetura, isso significa avanços futuros em áreas como o texto automatizado e o reconhecimento de voz, que podem ser aproveitados por uma grande quantidade de alunos para manter atividades como o feedback de professores e entre alunos em pequenos grupos alinhados com os objetivos do currículo do curso. A ideia da invasão de privacidade é uma noção óbvia hoje, mas esse medo pode ser mitigado diante de um sistema educacional tão eficiente que quase qualquer pessoa interessada em se tornar um arquiteto (ou qualquer outro profissional) pode ir atrás deste objetivo sem ter que investir uma pequena fortuna ou adquirir uma enorme dívida, como hoje é comum.

Além disso, promovendo a democratização, outra estratégia de melhoria do ensino poderia ser usar esta transição como uma oportunidade para mudar o método de entrega de trabalho dos alunos, de projetos individuais para projetos em grupo. Isso pode não só ajudar a mitigar a falta de contato pessoal em uma plataforma online, mas também oferecer uma oportunidade muito maior. As ferramentas de trabalho online em grupo, como o Paper da Dropbox, as planilhas, documentos e apresentações da Google, o Microsoft Teams e softwares para realizar reuniões virtuais, são áreas do setor de tecnologia que atualmente estão se desenvolvendo muito rapidamente. A natureza particularmente intensa do trabalho em sala de aula significa que a apropriação da colaboração criativa digital na formação em arquitetura poderia direcionar a evolução de tais ferramentas em direção à verdadeiras inovações. Tal movimento também está em consonância com a reforma da cultura social das escolas de design, impedindo a perpetuação do mito de que os arquitetos devem se esforçar para ser gênios singulares ao invés de parte de uma equipe multi-talentosa.

Talvez o mais importante é saber quea transição da educação presencial para a online é algo maior do que um currículo de arquitetura. Sob essa perspectiva, parece provável que a cultura atual de ateliê simplesmente se transforme em uma versão online de si mesma que, se a história recente da internet for considerada, pode ser difícil de mudar uma vez que ela é definida. É por isso que agora é o momento de moldar a dinâmica social das escolas de arquitetura do futuro, de forma a tornar a profissão como um todo mais forte.

Os professores de arquitetura devem assumir a responsabilidade de impulsionar essa mudança e não apenas deixar que ela os conduza.

Ross Brady construiu uma carreira multifacetada abrangendo arquitetura, marketing e jornalismo. Seu trabalho varia de reformas residenciais a propostas de desenho urbano, até seu mais recente trabalho em marketing e comunicação. Ele mantém uma licença de arquitetura no estado de Nova York.

Publicado originalmente em dezembro de 2017, atualizado em 08 de maio de 2020.

Sobre este autor
Cita: Brady, Ross. "Seria o aprendizado online o futuro do ensino de arquitetura?" [Architecture Education is Unhealthy, Expensive, and Ineffective. Could Online Learning Change That?] 10 Mai 2020. ArchDaily Brasil. (Trad. Moreira Cavalcante, Lis) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/884716/cursar-arquitetura-nao-e-saudavel-e-caro-e-ineficaz-a-aprendizagem-online-pode-mudar-isso> ISSN 0719-8906

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