Revendo a Bienal de Arquitetura de Tallinn 2013: Reciclando o Socialismo

O Modernismo e o socialismo compunham o poderoso conjunto espaço-político do século XX que moldou a maior parte dos ambientes urbanos e rurais da Europa Central e Oriental, incluindo a Estônia e sua capital, Tallinn. Esses ambientes ainda estão lá - como fósseis de antigos paradigmas, uma morte declarada. Hoje nós os consideramos nada mais que uma coleção material de certo modo interessantes ou excentricidades formais - afinal, preferimos acreditar que esta Era não nos é relevante atualmente. No entanto, existe algo a mais sobre estes fósseis que está passando batido por nossas análises?

Arquitetos e pesquisadores unidos pela Bienal de Arquitetura de Tallinn levantaram discussões e questões interessantes que mostram o quão entrelaçadas a história (neste caso, de 1960 a 1980) e as idéias históricas estão com a nossa vida de hoje, especialmente em um mundo em que a liberdade pode ser tão ilusória como era naquela época.

"Se você não é capaz de assumir a sua quota [de opções de vida], a arquitetura pode ser tão fantástica quanto você possa imaginar, mas ela não vai funcionar", destacou Olga Maria Hungar do raumlaborberlin durante a discussão no Simpósio da Bienal. A arquitetura espetacular de hoje em dia transita bem como imagens atraentes nas onipresentes mídias on-line e impressa, mas seu programa social ou relevância é frequentemente mais do que questionável.

Łukasz Wojciechowski do VROA concordou com Hungar: o programa deve ser sempre um ponto-chave - ou ao abordar a habitação em massa modernista, muitas vezes insuficiente; ou os pequenos negócios, que são parte essencial da rua tradicional; ou de um único edifício que perdeu a sua finalidade original e se tornou vítima de interesses comerciais de empreendedores para tornar-se apenas mais um centro comercial. "Hoje, como arquitetos, lidamos com programas capitalistas, que são programas funcionais: tudo tem que ser vigiado, observado, separado e assim por diante. O que realmente precisamos [...], especialmente quando reciclamos [a arquitetura modernista ou socialista], é um programa inovador", disse Wojciechowski.

View of the TAB 2013 Curators’ Exhibition in the Ministry of Foreign Affairs (a modernist/Soviet landmark highrise in Tallinn, originally built as the headquarters of the Communist Party), in the so-called Sprat-Tin Hall. Image © Tonu Tunnel

"[...] Temos que trabalhar na direção da arquitetura feita para todos", acrescentou Petra Čeferin, uma arquiteta e pesquisadora de Ljubljana, na Eslovênia. Palavras simples - mas não tão fácil de elaborar ou acompanhar. De quem é a tarefa de lutar pelas cidades e espaços de maior inclusão, que dão aos moradores da cidade uma vida diversificada, com muitas opções?

Wojciechowski relaciona o tema de volta à história e à política: "Eu realmente preciso do contexto histórico [...], a forma como a arquitetura se relaciona com a política e tudo mais. Se não tiver isso, eu sempre vou pensar no arquiteto como o criador. Mas os arquitetos não são criadores, são ferramentas nas mãos de políticos - sendo o sistema capitalista ou socialista ou outra coisa."

TAB 2013 Curators’ Exhibition work by the Danish office Dorte Mandrup Architects. Image © Tonu Tunnel

Pier Vittorio Aureli do Dogma expandiu a abordagem política, refletindo sobre o nascimento do socialismo, uma ideologia centrada no trabalho, e a situação dos trabalhadores hoje, especialmente o número crescente de freelancers: "Hoje, as pessoas trabalham muito mais, muitas vezes não remuneradas, com salários que são muitas vezes ridículo, e - isto é um paradoxo - ao contrário dos trabalhadores tradicionais, os freelancers não têm uma organização ou um sindicato que defende os seus direitos. A imagem do trabalho desapareceu, mas o ethos do trabalho tornou-se ainda mais Stakhanovista." Dogma abordou esta questão na TAB 2013 Curators’ Exhibition, onde mostraram um projeto conceitual para um edifício funcionando simultaneamente como escritório e moradia - uma nova tipologia, correspondente ao modo de vida do trabalhador moderno, que daria a este grupo uma presença visível no espaço urbano e na sociedade.

O pesquisador local Andres Kurg resumiu a necessidade de reconhecer a validade do conteúdo do trabalho realizado sob o socialismo, não apenas a forma: "[...] Eu tentei colocar [os valores que eram geralmente reconhecidos como valores dissidentes] em um diferente contexto social, dizendo que eles tinham também os valores socialistas. Devemos olhar para como as pessoas operavam nesse período e não rejeitar que eles estavam fazendo isso dentro de uma estrutura socialista, não devemos demonizar este período ou dizer que vamos manter a forma e rejeitar o conteúdo". Essa declaração resume o principal problema para cidades como Tallinn, onde a fuga do socialismo parece ter resultado em uma rejeição do social geral; as questões para a atualidade, então, são que tipo de sociedade queremos para as nossas cidades e como o espaço urbano pode promovê-la.

The opening event of the TAB 2013 Curators’ Exhibition in the Ministry of Foreign Affairs (a modernist/Soviet landmark highrise in Tallinn, originally built as the headquarters of the Communist Party) on September 6th, 2013. Architectural model in this photo (foreground): TAB Curators’ Exhibition work by the Estonian team of Kavakava architects, KUU architects and the philosopher Eik Hermann. Image © Tonu Tunnel

A Bienal de Arquitetura de Tallinn 2013: Reciclando o Socialismo ocorreu em setembro de 2013 em Tallinn, Estônia. A bienal foi curada por quatro arquitetos do escritório b210: Aet Ader, Kadri Klementi, Karin Tõugu e Kaidi Öis, e organizada pelo Centro de Arquitetura Estoniano. Um compêndio bilíngue de 300 páginas foi publicado após a bienal contendo artigos temáticos, palestras do Simpósio, obras criadas pelos Curators’ Exhibition, projetos de estudantes exibidos nas Schools’ Exhibition e uma seleção de entradas para o Concurso Vision. Mais informações: tab.ee, o catálogo pode ser adquirido on-line: www.lugemik.ee/en/book/tab-2013

Palestras no Simpósio por: Pier Vittorio Aureli (Dogma), Olga Maria Hungar (raumlaborberlin), Robert K. Huber (zukunftsgeraeusche), Łukasz Wojciechowski (VROA), Petra Čeferin, Andres Kurg. Trabalhos na Curators’ Exhibition by: 3+1 architects (Estônia), Benjamin Dillenburger (Suíça), Davor Ereš, Jelena Mitrovic, Pavle Stamenovic (Sérvia), Dogma (Bélgica), Dorte Mandrup (Dinamarca), EXYZT (França), KUU architects + Kavakava + Eik Hermann (Estônia), Sotamaa (Finlândia), VROA architects (Polônia), raumlaborberlin (Alemanha), Salto (Estônia),Vladimir Frolov & Alexey Levchuk (Rússia)

Kadri Klementi é arquiteto do escritório de arquitetura b210, de Tallinn; é co-editor da revista teórica de arquitetura estoniana Ehituskunst e professor na Escola de Arquitetura para Crianças em Tallinn

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Sobre este autor
Cita: Klementi, Kadri . "Revendo a Bienal de Arquitetura de Tallinn 2013: Reciclando o Socialismo" [A Recap of Tallinn Architecture Biennale 2013: Recycling Socialism] 19 Jan 2014. ArchDaily Brasil. (Trad. Baratto, Romullo) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/01-168842/revendo-a-bienal-de-arquitetura-de-tallinn-2013-reciclando-o-socialismo> ISSN 0719-8906

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