Cinema e Arquitectura: "Gattaca"

Retrofuturo e Minimalismo Aséptico. Gattaca (1997) é um filme curioso, que se destaca entre os outros do gênero da ficção científica e dentro do mundo do cinema em geral, por apresentar um equilíbrio excepcional entre "mensagem" e "forma" através da apresentação escassa - quase mínima - de elementos dentro de sua ambientação, carregados de simbolismos, que enfatizam o discurso que os personagens mostram magistralmente em cada cena.

Nos transporta à um futuro cuja estética é evidentemente retro futurista e parecida mais aos filmes e séries televisivas dos anos quarenta. Os automóveis não são as máquinas super potentes e extravagantes que cruzam os céus ou cheias de tecnologia, mas sim peças de grande design retiradas de museus. Os personagens vestem trajes de alta alfaiataria pelas ruas, alguns deles levam chapéus, vestindo uma estética muito impessoal e quase atemporal.

© Gattaca (1997)

Este é talvez um dos louros do filme, criar um futuro eclético, atemporal, repleto de elementos do passado e do futuro que em combinação, resultam lógicos e que permite que o filme não envelheça em sua estética conforme passam os anos. É um futuro tão válidos nos dias de hoje, como se tivesse ficado congelado num sonho que nunca pôde chegar a ser, mas que persiste em nossa memória.

Todos os ambientes na tela são minimalistas, móveis em metal ou de madeira clara sem nenhum tipo de ornamento, paredes brancas ou de concreto, vidros claros que permitem a entrada da luz do sol, gradios de aço cromado, tudo dotado de alta limpeza e assepsia, mesmas características presentes em todos seus habitantes. São ambientes de grande frieza, que assim como os rostos quase robóticos das pessoas, não denotam emoção alguma. Mas ao contrário à esta ausência de emoções dentro da ambientação, os personagens estão cheios destas, extremamente vivos, cheios de conflito e determinação, que durante a duração da história nos fazer ver a contradição do dito futuro com a natureza humana.

A arquitetura mostrada dentro do filme é uma que está basada no racional e no funcional, na qual o homem se move como uma máquina mas des-humanizado ao nível de perder qualquer resquício de individualidade. Basta observar as cenas que ocorrem na entrada da corporação Gattaca, onde dezenas de mulheres e homens "perfeitos" bem vestidos caminham em direção ao interior dos escritórios, sem gestos, sem se olharem uns aos outros.

© Gattaca (1997)

Para enfatizar a sensação de estar dentro de um ambiente de pouca humanidade, se baseia em uma linguagem simples, de linhas retas que se mesclam a elementos de concreto puro, onde os edifícios mostram uma aparência bastante geométrica, de grande racionalidade. 

A própria sede da corporação Gattaca é na verdade o “Marin County Civic Center”, projeto do arquiteto Frank Loyd Wrigth, cuja linguagem é caracterizada pela racionalidade e por um grande jogo de geometria pura. Esta obra é o último dos trabalhos do arquiteto e sua construção resultou póstuma ao ano de seu falecimento. Sua concepção é baseada em grande parte numa série de esboços onde Wright refletia sobre suas aspirações e fantasias sobre uma cidade futurista.

Gattaca é uma história que procura enfatizar que a vontade do espírito humano está além de qualquer avanço tecnológico e de qualquer sociedade por mais racional que esta se crê. É recomendável analisar o pano de fundo desta mensagem e sobretudo, admirar o bom trabalho que apesar de poucas locações - devido ao orçamento baixo para sua realização - nos transporta a um ambiente onde a opressão está refletida na frieza e ausência de emoção de sua arquitetura.

CENAS CHAVE

1. Universidade Politécnica da Califórnia

O campus, projetado pelo arquiteto Antoine Predock é um exemplo claro da geometria racional que transborda no filme, usado como blocos residenciais dos protagonistas.

© Gattaca (1997)

2. A Corporação Gattaca

O edifício onde ocorre a maior parte do filme é o Marin County Civic Center do Arq. Frank Loyd Wrigth, o último de seus desenhos e obra póstuma à sua morte.

© Gattaca (1997)

3. "A Arquitetura é uma Máquina para Morar"

O ser humano não é mais que outra peça dentro do maquinário que é a sociedade. As linhas de fuga se assemelham a um corredor interminável sem fim por onde o homem se desloca.

© Gattaca (1997)

4. Geometria Pura que Des-humaniza

Os ambientes são recorrentemente geométricos e sem texturas. A escala dos elementos é um claro lembrete de quão insignificante são as emoções humanas.

5. O Homem Uniformizado e Mecanizado

Todos os “humanos” dentro de Gattaca seguem um regime restrito, tanto físico como mental, peças perfeitamente "funcionais" dentro da maquinaria invisível de seu mundo.

© Gattaca (1997)

6. O Funcional da "Arte"

Mesmo quando os protagonistas assistem a um concerto de piano, o ambiente não deixa de ser racional. O cenário circular é outro lembrete do funcionalismo obsessivo da sociedade.

© Gattaca (1997)

7. O Simbolismo de seus Elementos

As escadas dentro do apartamento é um trabalho meticuloso em aço e madeira. Em todo momento nos faz recordar à estrutura helicoidal do DNA.

© Gattaca (1997)

8. Ambientes Minimalistas

Grandes planos de concreto aparente servem de fundo para a maior parte das cenas, acompanhados quase sempre de lustrosas estruturas metálicas cromadas.

© Gattaca (1997)

9. Um Ambiente Retro-futurista

As máquinas do futuro são relíquias do passado. Verdadeiros objetos de museu que são os que atravessam em total silêncio da cidade.

© Gattaca (1997)

10. O Triunfo das Energias Limpas

Um dos elementos verdadeiramente futuristas é o abandono dos combustíveis fósseis pela energia solar. Não existe lugar para poluição em uma sociedade racional.

© Gattaca (1997)

11. Arquitetura de um Futuro Atemporal

O êxito da atemporalidade do filme é evidente, já que elege uma arquitetura baseada no racional e no funcional, ao invés de qualquer outra baseada nos cânones históricos.

© Gattaca (1997)

12. A uniformidade e o Mecanicismo do Trabalho 

Tanto a vestimenta como a ambientação repetitiva nos faz lembrar os escritórios emergentes dos anos quarenta dentro dos grandes arranha-céus.

© Gattaca (1997)

PERFIL DO DIRETOR

Nascido na Nova Zelândia em 10 de junho de 1964, Andrew Niccol se dedicou ao mundo da publicidade antes do mundo do cinema. Trabalhou em Londres fazendo anúncios comerciais por dez anos, mais tarde contactaria o produtor de Hollywood Scott Rudin, o apresentando a um projeto próprio de grande ambição: um filme da vida de um homem, que fazia parte de um show de televisão sem que ele estivera consciente disso.

Esta ideia se transformaria no filme “O show de Truman”, a qual foi muito bem recebida pela crítica e público, mas uma decepção para Niccol, devido à sua falta de experiência, apenas foi encarregado da elaboração do roteiro. Para seu projeto seguinte, Gattaca, garantiu que a direção fosse sua. Neste filme estão retratados os perigos da modernidade, tema recorrente em todos os seus filmes, um mundo aonde se destacam as aparências e não se reconhece o valor próprio de cada ser humano.

Embora possa ser percebida uma atmosfera de pessimismo sobre as implicações da manipulação genética do homem Niccol é um diretor que se mostra sempre otimista em relação ao futuro. Ele sempre recai no "fundo" de seus filmes, em certa medida mimetizado. Em Gattaca nos mostra por exemplo o triunfo da energia solar e da conquista do espaço por parte da humanidade.

© Gattaca (1997)

FICHA TÉCNICA

Data de Estréia: 24 de Otubro de 1997
Duração:106 min.
Gênero: Drama / Ficção Científica 
Diretor: Andrew Niccol
Roteiro: Andrew Niccol
Banda Sonora: Michael Nyman

SINOPSE

Em uma sociedade futura, onde a seleção genética permitiu a humanidade a criação de homens e mulheres de um alto grau de perfeição, Vicente é uma criança concebida de forma natural com uma deficiência cardíaca que o reserva uma morte precoce. Vincent sonha viajar para o espaço, mas é considerado como um "inválido" que apenas pode aspirar a empregos humilhantes.

Um dia conhece um homem com a chave para alcançar o êxito: substituir Jerome, um atleta que foi paralisado após um acidente e como ele, é "inválido" dentro de sua sociedade.

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Sobre este autor
Cita: Altamirano, Rafael. "Cinema e Arquitectura: "Gattaca"" [Cine y Arquitectura: "Gattaca"] 18 Abr 2014. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/600020/cinema-e-arquitectura-gattaca> ISSN 0719-8906

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