Cinema e Arquitetura: "John Carter: Entre dois mundos" (2012)

A história de "John Carter" remonta ao tempo dos livros Pulp. Suas aventuras foram publicadas pela primeira vez na forma de capítulos separados durante o ano de 1911 e mais tarde, como um livro independente do qual surgiriam uma série de sequências. Apesar do seu caráter claramente juvenil, sua imaginativa inspiraria um grande número de figuras destacáveis do século XX, como Carl Sagan e Ray Bradbury, assim como uma referência clara a personagens como Buck Rogers, Flahs Gordon, Superman e o universo de Star Wars.

Levá-lo à tela do cinema 100 anos depois da sua primeira aparição foi um grande ato de fé. Como personagem, suas bases já haviam sido exploradas inúmeras vezes e por outro lado, seus elementos fantasiosos eram claramente anacrônicos dentro de uma época contemporânea, onde os avanços tecnológicos acontecem a passos de gigante.

Para a equipe de desenho, a prioridade recairia no fato de que Marte deveria aparecer de uma forma completamente nova, separada dos inúmeros clichês existentes dentro da ficção científica. Deveria sentir-se realista, com imagens palpáveis e de uma crueza evidente. A cultura dos seus habitantes deveria parecer tão coerente quanto a nossa, separada totalmente da sua origem caricata; um reflexo da sua história e de todos os eventos pelos quais passou antes de ser descoberta pelo protagonista.

Um dos mais importantes acertos do filme consistiu em encontrar um ponto intermediário entre o caráter de Space Opera da obra original com os tempos atuais. A representação de Marte é a visão de um mundo alienígena como era pensada no final do século XIX, com um claro estilo vitoriano próprio da revolução industrial, mas com formas muito mais estilizadas, orgânicas e aerodinâmicas, próprias das vanguardas do século XXI. Retrata um estilo Steampunk cheio de sobriedade, que venera a máquina pelos seus mecanismos aparentes mas que a mantem dentro de uma embalagem limpa e elegante, como se fosse uma peça de joia. 

Marte está representado como um planeta moribundo, com oceanos convertidos em desertos mas, que alguma vez na sua história, foi rico e abundante. Na sua superfície convivem três culturas, facilmente identificáveis e com um desenvolvimento arquitetônico bem individualizado. Todas compartilham este ar nostálgico pelos tempos melhores, como reduto de grandes impérios que se veem envoltos dentro de um conflito que os dirige até sua auto-destruição.

A cultura de Zodanga é apresentada como o agente invasor, envoltos em uma cor vermelha e vestimentas de um claro ar imperialista. Sua arquitetura se destaca ao constituir-se por uma cidade caminhante, inspirada na obra utópica do arquiteto Ron Herron, Diferentemente do imaginário original, adotando uma aparência muito mais agressiva, um agente que depreda tudo que estiver no seu caminho e que se assemelha à um porta-avião militar ou à uma grande refinaria cinza, suja e carente de vida.

Sua contrapartida, Helium, é uma civilização de um claro sentido pacifista, brilhante e cheio de sofisticação. Sua cidade resguardada sobre um penhasco exibe formas muito mais estilizadas dentro das suas construções, destacando suas duas torres; arranha-céus de vidro com formas suaves que reflete o interesse pela ciência e pelo progresso. O azul das suas cores responde a sua nostalgia e o caráter introspectivo. 

Por último, os Thark, raça que antigamente foi a dominante dentro do planeta, são retratados como uma sociedade tribal e carniceira. Com claras influências da cultura árabe, vivem dentro do deserto, refugiando-se sobre as ruínas da sua civilização, em construção de formas muito geométricas que remetem a movimentos como o Brutalismo, dentro da arquitetura moderna.

Perfil do Diretor

Andrew Stanton é um diretor, produtor e escritor de cinema norte-americano nascido no dia 3 de dezembro de 1965 na cidade de Rockport, Massachusetts. Sua carreira está associada a animação computadorizada. Estudou cinematografia no “California Institute of Arts”, rodando o que seria seu primeiro curta-metragem, “A Story”, no ano de 1987, história que narrava as aventuras de uma criança e seu dinossauro.

No ano de 1990, começaria a trabalhar dentro do emergente estúdio Pixar, desenhando personagens e escrevendo roteiros que se tornariam o filme "Toy Story', boom cinematográfico e que colocaria a companhia dentro do panorama mundial. Pouco tempo depois, trabalharia como co-diretor de "Vida de Inseto" (1998) e como roteirista de filmes cativantes como “Toy Story 2" (1999) e “Monstros SA” (2001).

Seu debut como diretor sozinho viria com o flime "Procurando Nemo", em 2003, oportunidade que não se repetiria até 2008 com “Wall-E” devido, em grande parte, ao desenvolvimento conceitual que esta última recairia sobre sua figura. Ambos filmes foram um grande êxito de bilheteria e bem recebidos pela crítica, fazendo com que ele ganhasse duas vezes o prêmio de Melhor Filme de Animação da Academia Americana. Seu trabalho mais recente "John Carter" abandona seu caráter de animador para filmar personagens reais. 

CENAS FUNDAMENTAIS

1. Zodanga, A Cidade Caminhante

Influenciada pelo conceito de Ron Herron dentro da revista Archigram, em 1964, a cidade marciana arrasa tudo o que passa, parecendo uma suja e enfumaçada refinaria mecanizada.

2. Sociedade Bélica

Somada a sua aparência industrial, Zodanga cobre o alto das suas construções com longas plataformas de voo, que assemelham-se a porta-aviões militares, permitindo que uma grande frota aérea decole.

3. Retrofuturismo Steampunk 

Desenvolvendo-se no final do século XIX, a tecnologia na tela faz alusão ao imaginário da sua época, com um claro aspecto vitoriano, mas também com traços orgânicos contemporâneos.

4. Embarcações dos Ares

A forma das aeronaves está claramente inspirada em barcos e veleiros terrestres, menos robustos e mais aerodinâmicos, com grandes asas que assemelham-se a silhueta de pássaros e libélulas. 

5. Helium: A Ilha Fortaleza

Habitando em um penhasco como medida defensiva natural, trata-se de uma civilização pacifista e intelectual, de formas que remetem a uma fortaleza medieval, porém cheias de sofisticação.

6. A Cidade das Ciências e do Progresso

Com um claro ar pacifista e luminoso, Helium demonstra seu progresso através do "Palácio da Luz", um arranha-céu de formas suaves que se eleva sobre o centro da cidade. 

7. Opereta Especial

Na parte da criação, tanto os cenários como os vestiários evocam o sentido Pulp da obra original, uma mescla entre a Space Opera e as fábulas dos cavaleiros medievais.

8. A Nostalgia de um Mundo Perdido

Cheio de detalhes azuis, Helium utiliza esta cor como um recordatório dos seus oceanos desaparecidos, adquirindo um toque melancólico e introspectivo nos cenários interiores. 

9. Influência Multicultural

O figurino e o design de interiores têm como grande inspiração o Império Romano, mas com claras influências de culturas asiáticas como a tradicional hindu. 

10. Tharks, o Modernismo Antigo

No passado foram a raça dominante, porém perduram como uma sociedade tribal, habitando as ruínas das suas construções passadas de um claro sentido brutalista.

11. Passado Escrito em Pedra

As ruínas marcianas foram projetadas sobre paisagens naturais, formações rochosas altas como edifícios, onde a imaginação criava com facilidade um cenário esquecido pelo tempo.

12. Misticismo e Religiosidade

As divindades e templos de Marte são exibidos como algo fora de toda classificação, de uma arquitetura tanto geométrica como orgânica, sólida, porém porosa, funcional, mas simbólica. 

FICHA TÉCNICA

Data de Estreia: 9 de março 2012
Duração: 132 min.
Gênero: Aventura / Ficção Científica 
Diretor: Andrew Stanton
Roteiro: Andrew Stanton / Mark Andrews
Fotografia: Daniel Mindel
Adaptação: A Princess of Mars, livro

SINOPSE

John Carter é um veterano de guerra e antigo capitão do exército estadunidense que no período da guerra civil, dedica-se a procurar ouro no deserto do Arizona. Enquanto foge do exército, sofre um contratempo com um grupo de nativos peles vermelhas, refugiando-se dentro de uma caverna cheia de estranhos símbolos. 

Após um estranho evento, se vê transportado ao planeta Marte, um mundo que atravessa um conflito entre dois bandos, os Helium e os Zodanga. Nesse lugar conhecerá a princesa Dejah Thoris, figura cativante que o fará questionar-se sobre sua própria humanidade e seu papel dentro da superfície marciana.

Sobre este autor
Cita: Altamirano, Rafael. "Cinema e Arquitetura: "John Carter: Entre dois mundos" (2012)" [Cine y Arquitectura: "John Carter" (2012)] 27 Mai 2016. ArchDaily Brasil. (Trad. Sbeghen Ghisleni, Camila) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/788260/cinema-e-arquite-tura-john-carter-entre-dois-mundos-2012> ISSN 0719-8906

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