Museu do Pontal inaugura sua nova sede no Rio de Janeiro

O Museu do Pontal, no Rio de Janeiro, referência internacional em arte popular brasileira, com mais de nove mil obras de 300 artistas, o maior acervo do gênero, e de relevância reconhecida pela Unesco, inaugurou sua nova sede, na Barra da Tijuca, no dia 9 de outubro de 2021. Com isso, a cidade ganha novo e importante equipamento de arte e cultura. Esta inauguração é resultado de uma grande colaboração coletiva que envolveu mais de mil pessoas e empresas como BNDES, Instituto Cultural Vale, Itaú Cultural, entre outras, a partir da Lei de Incentivo à Cultura do Governo Federal. E ainda, especialmente, o IBRAM (Instituto Brasileiro de Museus) e a Prefeitura do Rio de Janeiro.

O edifício de 2.600 metros quadrados de área construída, projetado dentro do conceito de sustentabilidade pelos Arquitetos Associados, está assentado sobre um terreno de 14 mil metros quadrados, consolidado e livre de inundações, dando segurança ao raro e singular acervo do Museu do Pontal. O terreno abrange 10 mil metros quadrados de área verde, com vista aberta para parte do conjunto de montanhas conhecido como Gigante Adormecido, que vai da Pedra da Gávea ao Pão de Açúcar.

Lucas Van de Beuque e Angela Mascelani, os dois diretores do Museu do Pontal, comemoram o momento, agradecendo “a todos os apaixonados pela arte e cultura popular do Brasil pela permanência do Museu do Pontal, demonstrando que nós, brasileiros, nos importamos com nosso patrimônio”. Eles contam que “ao longo dessa jornada percebemos nitidamente que somente através de uma sociedade civil organizada e forte é possível resistir. Temos esperança de que exemplos como o nosso, de mobilização da sociedade, sejam inspiradores”. “Graças ao engajamento de pessoas e empresas que contribuíram para que essa e as próximas gerações valorizem a diversidade e legitimem o patrimônio cultural brasileiro, o cenário dramático do Museu do Pontal se transformou e hoje estamos prestes a inaugurar a nova sede”, observam.

SEIS EXPOSIÇÕES INAUGURAIS – “NOVOS ARES: PONTAL REINVENTADO
O conjunto das exposições inaugurais se chama “Novos ares: Pontal reinventado”, marcando este importante momento na história do Museu. São seis exposições, uma de longa duração, e cinco temporárias, que reúnem 700 conjuntos de obras, com um total de cerca de duas mil peças. O Museu do Pontal terá um café/restaurante, uma loja, e uma extensa programação para todos os públicos.

A curadoria é assinada por Angela Mascelani, diretora artística do Museu do Pontal, e por Lucas Van de Beuque, diretor executivo, com a colaboração da designer Roberta Barros e do arquiteto Raphael Secchin no desenho expositivo, pesquisa Moana Van de Beuque e coordenação de conteúdo de Fabiana Comparato.

Angela Mascelani e Lucas Van de Beuque afirmam: “Estamos fazendo mais do que uma exposição. Estamos criando as bases de um novo pensamento institucional. Este pensamento tem a ver com uma outra forma de entender o Museu do Pontal e seu papel na sociedade. A exposição está ligada à concepção geral do projeto deste Museu em si. E abrange desde as discussões sobre a arquitetura e os jardins até a maneira como as histórias estão sendo contadas, os fluxos do educativo e a programação estabelecida”.

GILBERTO GIL, DONA ISABEL, AILTON KRENAK E JOSÉ SARAMAGO
Em meio às exposições, o público verá a riqueza da arte popular através de vídeos e textos poéticos, e em depoimentos de personalidades como Gilberto Gil, Dona Isabel, Ailton Krenak e José Saramago. O percurso expositivo de mil metros quadrados terá cores e aberturas em suas paredes, que permitem vislumbrar uma perspectiva do amplo espaço, de modo a revestir de magia e encantamento o mergulho do público no universo da arte popular.

“Novos ares: Pontal reinventado” abrange obras do acervo do Museu e de importantes coleções convidadas. A exposição de longa duração faz uma homenagem à proposta original de apresentação das obras do Museu do Pontal criada por seu idealizador e fundador, Jacques Van de Beuque (1922-2000), que estabeleceu uma maneira própria e inovadora para apresentar o Brasil profundo revelado por seus artistas populares. Esta concepção foi revisitada à luz de 2021, com uma nova compreensão dos ciclos criados por ele, que apontavam as transformações do Brasil com a migração da área rural para a cidade.

A ARTE POPULAR E SEUS CRIADORES
Em torno da exposição central estarão cinco outras exposições nucleares, temporárias, focadas na diversidade da produção artística do país, com esculturas que dialogam com temas fortes da cultura brasileira, a partir dos olhares originais de seus autores.

1. Brincares – Brincadeiras e brincantes
Obras interativas e cinéticas como “Circo”, de Adalton Fernandes Lopes (Niterói, 1938 – 2005), e os brinquedos de madeira de Antonio de Oliveira (Minas Gerais, 1912-1996). O local terá uma arquibancada lúdica, apropriada para estimular a curiosidade das crianças, com provocações e instigações. O acervo de mamulengos também abrirá espaço para pequenas encenações de teatro de bonecos. Em uma área contígua haverá jogos digitais interativos, para adultos e crianças. A sala de jogos trará desafios ligados às danças brasileiras, como frevo, jongo, carimbó, chula e funk.

2. Terra/Terra – O Jequitinhonha e suas tradições
Neste espaço que aposta num aprofundamento na dimensão matérica das obras, o destaque são os artistas, em especial Noemisa Batista (1947), Dona Isabel Mendes da Cunha (1924-2014) e Ulisses Pereira Chaves (1929-2006). Em outro nível de leitura, provocamos o público a pensar sobre o significado do termo tradição, em tempos de tantas e aceleradas mudanças.

3. Entre beiras e margens – Fogo, água, ar
Artistas do Alto do Moura, Pernambuco, como Mestre Vitalino (1909-1963), mostram em suas antológicas esculturas em barro a importância do fogo na feitura da cerâmica. Barcos trazem a energia primordial das águas do mar e do Rio São Francisco, com as carrancas de MestreGuarany (1884-1985). Outros seres mitológicos, como as sereias e os barcos de presente a Oxum, estão nas obras de Zezinho de Arapiraca, Selvino (1941) e Tamba (1934-1987), da Bahia. Nhô Caboclo (1940), de São Paulo, e Laurentino (1937), do Paraná, com suas obras eólicas, que aludem à energia dos ventos.

4. Poética da criação
Artistas cujas obras escapam às primeiras apreensões, fugindo aos temas consagrados historicamente na arte popular, reúnem-se nesse setor. São seresfabulosos, personagens fantásticas, criações ímpares. Neste espaço, há um diálogo maior entre as obras reunidas por Jacques Van de Beuque no Museu do Pontal e outras coleções convidadas, criadas tanto por indivíduos apaixonados por arte popular, como Irapoan Cavalcanti, Jorge Mendes e Jairo Campos, entre outros, como por acervos vindos de importantes instituições brasileiras, como SESC-SP e Itaú Cultural. Aqui, os destaques são Manoel Galdino (1929-1996), do Alto do Moura, Pernambuco, GTO (1913-1990), de Minas, e Nino (1920-2002), de Juazeiro do Norte, Ceará, além de artistas inovadores da Ilha do Ferro, Alagoas.

5. Devoções
Em uma leitura livre e abrangente, esse setor apresenta a diversidade de expressões da fé, e os artistas vinculados às devoções populares, incluindo sua dimensão festiva. Os destaques, além dos ex-votos, são os artistas Otávio, e seus orixás, Mestre Didi (1917), da Bahia, e sua estética afro-brasileira, e Zé do Carmo (1934), de Pernambuco, com seus anjos negros. Uma sala especial reúne presépios – a um depoimento sensível de Caetano Veloso, sobre suas memórias de Natal. No trajeto, um encontro com as grandes engenhocas cinéticas de Adalton Lopes (1938-2005), de Niterói: a “Vida de Cristo” e o “Carnaval no Sambódromo”.

SUSTENTABILIDADE
O edifício da nova sede do Museu do Pontal tem 2.600 metros quadrados de área construída, projetado pelos Arquitetos Associados, responsáveis por algumas galerias de Inhotim. O conceito de sustentabilidade norteou o projeto, e a partir de um rigoroso estudo do caminho do sol ao longo do ano e do regime de ventos, o prédio de linhas retas, simples e elegante, tem um pé direito de oito metros, janelas com quebra-sol (brise-soleil) e ventilações cruzadas, que garantem que apenas 30% do prédio precise do uso de ar-condicionado, contribuindo também para a redução da emissão de gases poluentes. O projeto buscou ainda o máximo possível de iluminação natural, e o reuso da água de chuva para os jardins e a coleta seletiva de todo o lixo.

PAISAGISMO
Com paisagismo assinado pelo Escritório Burle Marx, a nova sede do Museu do Pontal será inaugurada com uma área verde de 10 mil metros quadrados, que compreende jardins internos e no entorno do edifício, e uma praça, onde haverá atividades ao ar livre. Esta área verde exigiu dezenas de milhares de mudas de 73 espécies nativas brasileiras, de árvores frutíferas e vegetação tropical às paisagens da caatinga. A natureza é fundamental para contextualizar o acervo do Museu do Pontal, e várias espécies foram cuidadosamente transplantadas da sede histórica para a nova. Esta área verde contribuirá expressivamente para a purificação e umidade do ar da região, capturando CO2 e devolvendo oxigênio para a atmosfera.

A nova sede do Museu do Pontal está 20 quilômetros mais perto do Centro da Cidade do que a antiga sede histórica, e fica próxima ao Bosque da Barra e vizinha ao condomínio Alphaville, distante apenas quatro quilômetros do Barra Shopping e da Cidade das Artes. Há ainda várias escolas importantes nas proximidades.

MUSEU DO PONTAL – BREVE HISTÓRICO
O Museu Casa do Pontal, criado em 1976 pelo artista e designer francês Jacques Van de Beuque, ganhou este nome por conta de sua localização, em um terreno de cinco mil metros quadrados na região conhecida como Pontal, no Recreio dos Bandeirantes, parte final da extensa orla da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Ainda em 1976, Jacques Van de Beuque apresentou no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro a exposição “A arte do viver e do fazer”, com as obras que havia reunido nas várias viagens realizadas pelo país, desde a década de 1950, em sua pesquisa que deu a devida visibilidade, no Brasil e no exterior, à produção de artistas de localidades pobres e distantes dos centros econômicos do país, revelando a excelência do que se passou a chamar de arte popular.

Em 1995, o filósofo, matemático e cineasta Guy Van de Beuque (1951-2004), filho de Jacques, passou a dirigir o Museu do Pontal, ampliando sua área expositiva e criando uma interface digital, o portal na internet. Com a morte prematura de Guy, enquanto montava em Nova Déli uma exposição com obras do acervo, o Museu do Pontal passou a ser dirigido pela antropóloga e cineasta Angela Mascelani, viúva de Guy, que desde 1996 fazia a direção de pesquisa e comunicação do Museu, tendo publicado o resultado de seu trabalho no livro “O Mundo da Arte Popular Brasileira” (Ed. Mauad, 2000, com diversas edições posteriores), e assinado várias curadorias de exposições. Angela Mascelani deu continuidade às pesquisas e aquisições de obras, e publicou em 2008 o livro “Caminhos da Arte Popular: O Vale do Jequitinhonha” (MCP), que condensa suas viagens ao longo de 15 anos na região. É responsável pela curadoria de dezenas de exposições sobre o acervo do Museu.

A partir de 2010, Angela Mascelani passa a dividir a gestão do Museu do Pontal com seu filho Lucas Van de Beuque, economista e fotógrafo, com longa atuação em gestão cultural, e neto de Jacques Van de Beuque.

Além da gestão do Museu do Pontal, Lucas Van de Beuque fotografou e codirigiu mais de 20 filmes de curta duração sobre a criação plástica popular. Interessado no complexo de ações que envolve o mundo dos museus, implementou estratégias de gestão inovadoras e consistentes, preparando a instituição para o enfrentamento de novos desafios que resultam no incremento de novas parcerias que permitiram: a manutenção anual do Museu do Pontal, a realização de exposições no Brasil e no exterior, filmes, seminários, eventos musicais e ações educacionais continuadas. Essas ações receberam mais de um milhão de visitantes.

Instituição com relevância reconhecida pela Unesco, o Museu Casa do Pontal já foi visitado por mais de 2 milhões de pessoas, e já realizou 70 exposições parciais do acervo no Brasil e em mais 15 países. A partir de seu programa social e educacional, mais de 500 mil estudantes, desde 1996, fizeram visitas musicadas e teatralizadas ao acervo, vendo e ouvindo as histórias que formam essa grande colcha de retalhos culturais que é o Brasil. O setor de pesquisa, produziu conteúdos sobre os artistas e mestres da cultura popular, com filmes, livros, catálogos, seminários e um amplo material disponibilizado no site da instituição e nas redes sociais. Em 2019, a instituição conquistou o segundo lugar no XIII Prêmio Pierre Verger de filme Etnográfico, com a média metragem ”Artistas Cazumbas”.


INUNDAÇÕES E LUTA POR NOVA SEDE
Uma série de inundações, de 2010 a 2020, colocou em grande risco o acervo do Museu do Pontal, e a inauguração de sua nova sede é o feliz resultado de um longo caminho de lutas, com grande solidariedade e apoio de pessoas, empresas e da mídia.

Em 2010, a direção do Museu do Pontal foi surpreendida por uma inundação em suas instalações, causada pela elevação do terreno dos condomínios construídos no entorno, que acarretou no escoamento das águas das chuvas para a área do Museu. Um estudo realizado pela Coppe/UFRJ sinalizou a inviabilidade de o Museu permanecer naquela sede original, sob risco de perda do acervo.

Lucas Van de Beuque e Angela Mascelani iniciaram negociações com o governo municipal, que acabou por ceder, em 2015, o terreno na Barra da Tijuca, e se comprometeu com parte dos recursos necessários para a construção de uma nova sede, via uma triangulação com uma empresa devedora aos cofres públicos, a construtora Calper.

A obra para a construção da nova sede começou em junho de 2016, e estava com cerca de 50% realizada quando em maio de 2017 a Calper quebrou o contrato e interrompeu o trabalho, deixando inacabada a parte já construída.

2019 – UM ANO DIFÍCIL E O INÍCIO DE UM NOVO CAMINHO
Em abril de 2019, ocorreu a sexta e mais grave inundação, e um grande volume de água barrenta tomou os corredores do Museu. O evento só não pôs fim ao acervo por conta da rapidez de funcionários e ex-funcionários que conseguiram retirar as obras que estavam prestes a serem atingidas pelo alagamento.

O fato chocou cariocas e amantes do Museu e da arte em geral. Naquele momento, os dois diretores temeram estar no “fim do caminho, sem saída”.

MOBILIZAÇÃO DA SOCIEDADE – PESSOAS E EMPRESAS
A direção do Museu Casa do Pontal decidiu então desenhar novas estratégias, entre elas a de assumir a finalização da obra, lançando uma campanha de financiamento coletivo, que criou uma rede de mais de mil apoiadores e entusiastas. A este esforço conjunto se juntaram BNDES, Instituto Cultural Vale, Itaú Cultural e Prefeitura do Rio de Janeiro, patronos do Museu. Destacam-se também as parcerias com Repsol Sinopec Brasil, Elecnor do Brasil, Grupo Cobra Brasil, Instituto Galo da Manhã e, especialmente, o IBRAM (Instituto Brasileiro de Museus). Todas as empresas aportaram recursos a partir da Lei de Incentivo à Cultura do Governo Federal.

De 3 de outubro a 8 de novembro de 2020 foi realizada a exposição “Até logo, até já”, uma despedida para o público da sede histórica do Museu, no Pontal.

Em seguida, o acervo foi transportado em segurança para a nova sede na Barra, que foi inaugurada no dia 9 de outubro de 2021. “Esta é uma vitória da arte, da cultura, e da imensa rede colaborativa que mantém viva esta coleção única”, celebram Lucas Van de Beuque e Angela Mascelani.

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Cita: "Museu do Pontal inaugura sua nova sede no Rio de Janeiro" 10 Out 2021. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/970090/museu-do-pontal-inaugura-sua-nova-sede-no-rio-de-janeiro> ISSN 0719-8906

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