Leituras essenciais: "Ornamento e Crime" por Adolf Loos

Iniciamos aqui a série de posts Leituras Essenciais, onde apresentaremos textos notáveis e imprescindíveis que abrangem temas diversos, como a arquitetura contemporânea, urbanismo, arquitetura de interiores e paisagem.

Ornamento e Crime iniciou como uma conferência realizada por Adolf Loos em 1910, em resposta a uma época (o final do século XIX e o início do século XX) e um local (Viena), em que o Art Nouveau era o status quo. Loos utilizou o ensaio como um veículo para explicar seu desprezo aos "ornamentos", em favor de "superfícies lisas e anteriores", em parte porque eles culminavam em objetos e edifícios que se tornariam fora de moda mais cedo e, portanto, obsoletos. Isso - o esforço desperdiçado na concepção e criação de ornamentos supérfluos - era entendido por ele como nada menos que um "crime". As ideias incorporadas neste ensaio foram precursoras do movimento moderno, incluindo práticas que acabariam por ser o núcleo da Bauhaus em Weimar.

Trecho de Ornamento e Crime:

O embrião humano atravessa, no útero da mãe, toda a fase de desenvolvimento que corresponde à evolução do reino animal. E quando o ser humano nasce, a sua percepção sensorial iguala-se à de um cachorro recém-nascido. A sua infância passa por todas as transformações que correspondem à história da humanidade: com 2 anos de idade vê como um Papua, com 4 como um Germânico, com 6 como Sócrates, com 8 vê como Voltaire, Aos 8 anos percebe-se do violeta, que foi a cor que o século XVIII descobriu, pois antes disso o violeta era azul e a cor púrpura era vermelho. O físico ainda hoje aponta para certas cores no espectro solar que já têm nome, mas cuja compreensão está reservada aos vindouros.

A criança é amoral. Para nós, o Papua também o é. O Papua mata os seus inimigos e devora-os. Ele não é nenhum criminoso. Mas se o homem moderno matar e devorar alguém, é de imediato considerado um criminoso e um degenerado. O Papua faz tatuagens na sua pele, na canoa, no seu remo - enfim, em tudo o que puder alcançar. Ele não é nenhum criminoso. O homem moderno que faça tatuagens, ou é criminoso, ou é degenerado. Há prisões em que 80% dos reclusos apresentam tatuagens. Os tatuados que não estão presos ou são potenciais ladrões ou aristocratas degenerados.

A ânsia de ornamentar a cara e tudo o que estiver ao seu alcance representa os primórdios das artes plásticas. É o balbuciar de toda a pintura. Mas toda a arte é erótica.

O homem atual, que na sua ânsia interior besunta as paredes com motivos eróticos, é um criminoso ou um degenerado. Aquilo que no Papua e na criança é natural é no homem moderno uma manifestação de degeneração. Eu cheguei à seguinte conclusão, que quero partilhar com o mundo: a evolução cultural é proporcional ao afastamento do ornamento em relação ao utensílio doméstico. Pensava, com isto, trazer alguns novos amigos ao mundo, mas o mundo não me agradeceu. As reações foram de tristeza e de desânimo. O que preocupava as pessoas era o reconhecimento de que não era possível criar um ornamento novo. Aquilo que todo o negro sabia fazer, aquilo que todos os povos nossos antecessores souberam, não tínhamos nós, seres humano do século XIX, capacidade para realizar! Aquilo que a humanidade conseguiu, em séculos passados, e sem ornamentação, foi negligentemente rejeitado e abandonado para ser destruído. Não temos qualquer bancada de carpinteiro do tempo dos Carolíngios, mas todo o objeto sem valor que apresente a mais pequena o ornamentação foi recolhido e limpo e construíram-se luxuosos palácios para os acolher no seu interior.

E caminhávamos tristes por entre as vitrines e sentíamos vergonha da nossa impotência. Toda a época tem o seu estilo e só a nossa é que não tem direito a um?! E ao dizer estilo quer-se dizer ornamentação. E então eu disse: não choreis. Vede, é isso que traz grandeza ao nosso tempo - o fato de não termos a capacidade de fazer surgir um novo ornamento. Nós superamos o ornamento, conseguimos vencer todos os obstáculos até atingirmos a ausência da ornamentação. Vede, o tempo aproxima-se. A plenitude espera por nós. Em breve, as ruas das cidades brilharão como muros brancos! Tal como Sião, a cidade sagrada, capital do paraíso. É lá que reside a plenitude.

Há, no entanto, alguns mensageiros da desgraça que não aceitam essa situação. A humanidade deveria continuar a sufocar na escravatura do ornamento. As pessoas estavam preparadas para que o ornamento não despertasse em si qualquer sensação; preparadas para que um retrato gravado não aumentasse o seu sentimento estético, como no Papua, mas antes para que o diminuísse. Preparadas para sentir prazer em observar uma cigarreira lisa, enquanto se recusariam a comprar outra que estivesse ornamentada, ainda que custasse o mesmo. Sentiam-se felizes com as suas roupas e ficavam satisfeitas por não andarem por aí a fazer figuras de macacos de feira, com calças vermelhas de veludo com cordões de ouro. E eu dizia vede, o quarto mortuário de Goethe é mais belo do que todo o luxo renascentista e um móvel liso é mais bonito do que todas as peças de museu embutidas e esculpidas em madeira. A linguagem de Goethe é mais bela do que todos os ornamentos dos poetas bucólicos.

Os mensageiros da desgraça não gostaram de ouvir isso, e o Estado, cuja tarefa é impedir os povos de prosseguir com a sua evolução cultural, chamou a si a questão do desenvolvimento e da readopção do ornamento, e pobre do Estado que permite que a sua revolução seja organizada pelos conselheiros da Corte. Não tardou sem que se visse no museu de artes decorativas um parador apelidado de “A rica pescaria”, não tardou sem que houvesse armários com o nome de "A princesa encantada” e outros parecidos, em alusão à ornamentação com que esses móveis infelizes eram cobertos. O Estado austríaco assume a sua tarefa com tanto rigor que está a providenciar um meio de os escarpins não desaparecerem da fonteira austro-húngara. E obriga todo o homem culto de 20 anos a marchar por três anos com os ditos escarpins em vez do calçadado apropriado! É que todo o Estado parte do princípio de que um povo submisso é mais fácil de governar do que um povo culto

Pois bem, a praga do ornamento na Áustria é reconhecida pelo Estado e é subsidiada com dinheiros públicos, mas eu vejo isso como um retrocesso. Não aceito a argumentação de que o ornamento aumenta a alegria de viver das pessoas cultas e não aceito o argumento que se esconde nas seguintes palavras: "Mas se o ornamento é bonito!". Nem a mim, nem a todas as pessoas que, como eu, são cultas, poderá o ornamento aumentar a alegria de viver. Se eu quiser comer um pedaço de bolo, escolho um que seja "liso", e não um em forma de coração ou seja lá do que for, coberto e recoberto de ornamentos. O homem do século XV não me compreenderá, mas todas as pessoas modernas me comprenderão. O defensor do ornamento acredita que a minha ânsia pela simplicidade equivale a uma flagelação. Não, caro Senhor Professor da Escola de Artes, eu não me estou a autoflagelar. É mesmo assim que eu gosto.

O prejuízo e a destruição incalculáveis que o surgimento do ornamento provocam no avanço estético poderia ser facilmente suportado, pois não há ninguém, nem mesmo o poder estatal, que possa impedir a evolução da humanidade - apenas poderá atrasá-la! Nós esperamos. Mas não deixa de ser um crime que devido a isso se arruíne, do ponto de vista econômico, o trabalho humano, o dinheiro e o material. O tempo não poderá reparar este prejuízo.

A velocidade a que se dá o desenvolvimento cultural é prejudicada pelos retardatários, Eu vivo talvez no ano de 1912, mas o meu vizinho vive no de 1900, e aquele ali em 1880. É muito grave para o Estado quando a cultura dos seus cidadãos se estende por um período muito alargado. O lavrador de uma certa aldeia austríaca vive no século XII. Por ocasião do último desfile do jubileu tivemos de verificar, assustados, que na Áustria ainda existem tribos do século IV! Feliz é o Estado que não possui tais retardatários e ladrões! Feliz América! Entre nós, até nas cidades há pessoas antiquadas, retardatários do século XVIII que ficam escandalizados com uma imagem com sombras violetas, só porque ainda não conseguem ver o violeta. Pessoas a quem sabe melhor o faisão que foi preparado durante dias a fio pelo cozinheiro, e a quem agrada mais a cigarreira com ornamentos renascentistas do que a lisa. E como é na província? As roupas, o mobiliário e os utensílios pertencem, efetivamente a séculos anteriores. O lavrador não é cristão — ainda é idólatra.

Estes retardatários atrasam o desenvolvimento cultural dos povos e da humanidade. Sob o ponto de vista econômico, pode-se observar o seguinte fenômeno entre duas pessoas que vivem uma ao lado da outra e que têm as mesmas necessidades. os mesmos objetivos em relação à vida e os mesmo rendimentos e que pertencem a duas culturas diferentes: o homem do século XX está cada vez mais rico, o ser humano do século XVIII cada vez mais pobre. Suponho que ambos vivem as suas tendências. O homem do século XX é capaz de satisfazer as suas necessidades com gastos muito menores, o que lhe permite realizar poupanças. Os legumes que ele gosta de comer são apenas cozinhados em água e salpicados com um pouco de manteiga. Ao outro só lhe agradam na mesma medida se tiverem sido cobertos de mel e nozes e se alguém esteve a prepará-lo durante horas. Os pratos ornamentados sabem melhor a um, enquanto que o outro só gosta de comer com louça branca. Um faz poupanças, o outro contrai dívidas, E o mesmo se passa com todas as nações Coitado do povo que se deixe atrasar no desenvolvimento cultural. Os ingleses estão a enriquecer nós estamos a empobrecer...

O prejuízo que o povo trabalhador sofre por causa do ornamento é ainda muito maior. Uma vez que o ornamento não é um produto natural da nossa cultura, ou seja, uma vez que representa ou um atraso ou uma manifestação de degeneração, o trabalho do ornamentador já não é devidamente pago. O estado de coisas entre os escultores de madeira e os torneiros, os preços criminosamente baixos pago às bordadeiras e às rendeiras são situações bem conhecidas. O ornamentador tem de trabalhar 20 horas para ganhar a salário que um trabalhador moderno aufere em 8. Em regra, o ornamento encarece o objeto e, mesmo assim, acontece muitas vezes que um objeto ornamentado, acarretando o mesmo custo em material e comprovadamente o triplo das horas de trabalho, é posto à venda por metade do preço de um objeto “liso”. A ausência de ornamento tem como consequência uma diminuição das horas de trabalho e um aumento do preço. O escultor chinês trabalha 16 horas, o trabalhador americano só 8. Se eu tenho de pagar o mesmo por um vaso liso que por outro cheio de ornamentos, a diferença nas horas de trabalho pertence ao trabalhador. E mesmo que não houvesse qualquer ornamento (uma situação que talvez se venha a verificar daqui a muitos séculos), o homem só precisaria de trabalhar 4 horas em vez de 8, pois metade do trabalho ainda hoje se fica a dever à ornamentação.

O ornamento é um desperdício de mão-de-obra e, por isso, um desperdício de saúde. Foi sempre assim. No entanto, hoje o ornamento também significa desperdício de material e ambos significam desperdício de capital.

Uma vez que o ornamento já não está organicamente relacionado com a nossa cultura, também já não constitui expressão da mesma. O ornamento criado hoje em dia não tem qual quer relação conosco, qualquer relação humana, qualquer relação com a ordem universal. Não tem capacidade de desenvolvimento. O que é que aconteceu à ornamentação de Otto Eckmann, o que aconteceu à de Van de Velde? O artista teve sempre à frente da humanidade, cheio de saúde e força. No entanto, o ornamentista moderno ou é um retardatário ou uma manifestação patológica. Os seus produtos são negados pelo próprio três anos depois. Para as pessoas cultas, tornam-se desde logo insuportáveis; os outros só mais tarde se apercebem dessa "insuportabilidade". Onde estão hoje os trabalhos os de Otto Eckmann? Onde estarão os trabalhos de Olbrich daqui a dez anos? A ornamentação moderna não tem com ascendência nem descendência, não tem passado nem futuro. E recebida com alegria pelas pessoas incultas, para quem a grandeza do nosso tempo é um segredo bem guardado, e negada logo de seguida.

A humanidade é saudável - doentes são apenas alguns poucos. No entanto, esses poucos tiranizam o trabalhador, que é saudável a ponto de não conseguir criar mais ornamentos. Obrigam-no a apresentar os ornamentos criados por si nos mais diversos materiais.

A mudança de ornamentação tem como consequência a depreciação prematura do produto do trabalho. O tempo de mão-de-obra e o material empregue são capitais desperdiçados. Elaborei a seguinte frase: a forma de um objeto só perdura, ou seja, só nos é suportável, até o objeto aguentar. Vou tentar esclarecer: Um fato mudará mais freqüentemente a sua forma do que um bom casaco de peles. A toilette de baile de uma senhora, pensada apenas para uma noite, mudará a sua forma mais depressa do que uma escrivaninha. Mas livrem-nos de termos de trocar de escrivaninha tão depressa como de uma toilette de baile, só porque as velhas formas se nos tornaram insuportáveis. Nesse caso, o dinheiro gasto na escrivaninha tem de ser dado como perdido.

Isso é bem conhecido dos ornamentistas e os ornamentistas austríacos procuram aproveitar-se ao máximo desse ponto fraco. Dizem eles: “É preferível um consumidor que tenha uma peça de mobiliário que se torne para ele insuportável passados 10 anos e se veja por isso obrigado a mudar a decoração de 10 em 10 anos, do que um que só compra o objeto quando o velho está inutilizado pelo uso. A indústria precisa disso. Através dessas mudanças frequentes dá-se trabalho a milhões!" Parece ser esse o segredo da economia austríaca, pois quantas vezes não se ouve, quando deflagra um incêndo: Graças a Deus que as pessoas já têm novamente que fazer!" É só pegar fogo a uma casa, ao país, e está tudo a nadar em dinheiro e bem-estar. Façam-se móveis com os quais e possa acender a lareira passados 3 anos; ferragens que tenham de ir para fundição passados 4 anos, porque nem na casa de leilões se consegue obter um décimo do custo de mão-de-obra e de material, e ficaremos cada vez mais ricos.

O prejuízo não atinge apenas o consumidor, mas acima de tudo, o produtor. Hoje em dia, a ornamentação representa, só em coisas que tiveram de ser retiradas devido ao desenvolvimento deste fenômeno, um desperdício de mão-de-obra e de material. Se todos os objectos durassem, em temos estéticos, o tempo que duram fisicamente, o consumidor poderia pagar um preço tal que permitisse ao trabalhador ganhar dinheiro e trabalhar menos tempo. Não me importo de pagar um preço quatro vezes mais elevado por um objeto que sei que posso utilizar e gastar até ao fim. Não me importo de pagar 40 coroas pelas minhas botas, apesar de noutra loja estarem umas à venda por apenas 10 coroas. No entanto, o bom ou o mau trabalho não é valorizado nas profissões que se derretem diante da tirania da ornamentação. O trabalho sofre, porque ninguém está disposto a pagar o seu verdadeiro valor.

E é bom que assim seja, pois estas coisas ornamentadas só se tornam suportáveis na sua versão mais grosseira. Consigo superar melhor a destruição causada pelo incêndio se souber que só se arderam coisas sem valor. Só posso ficar contente com a palhaçada na casa do artista quando sei que passados poucos dias ela vai se demolida. No entanto, atirar com pepitas de ouro em vez de pedras, acender um charuto com uma nota bancária, reduzir uma pérola a pó e bebê-la já se torna inestético

Os objetos ornamentados só se tornam verdadeiramente inestéticos quando realizados nos melhores materiais, trabalhados com o maior cuidado e exigindo longas horas de trabalho. Não posso negar que fui o primeiro a exigir trabalho de qualidade. A decoração da filial de Viena da fábrica de velas “Apolo”, feita há catorze anos em madeira macia, com infusões a cores, não é nem de longe tão insuportável quanto os atuais trabalhos do Professor Hoffmann o serão daqui por catorze anos. Porém, o Café Museu, inaugurado ao mesmo tempo que a loja de vendas, só se tornará insuportável quando o trabalho de carpintaria começar a desmanchar-se.

O homem moderno, que conserva religiosamente a ornamento como símbolo dos excedentes artísticos de épocas passadas, reconhecerá de imediato o lado tormentoso, arrancado à força e doentio da ornamentação moderna. Não há ornamento que possa ser criado por alguém que se encontre ao mesmo nível cultural do que nós. O mesmo já não se passa com as pessoas e os povos que ainda não atingiram esse patamar.

Enalteço o aristocrata, ou seja, a pessoa que está à frente da humanidade e que mesmo assim tem a mais profunda preocupação com a necessidade e urgência do que ainda está por criar. O tolo que tece os ornamentos nos tecidos a um determinado ritmo e que só se revelam quando são desmanchados; o persa que tece o seu tapete; a camponesa eslovaca, que faz a sua renda; a velha senhora que costura coisas maravilhosas em pérolas e seda, compreende ele bem. O aristocrata deixa-os à vontade - ele sabe que esses são os seus momentos sagrados. O revolucionário chegaria lá e diria: "Isso não faz sentido nenhum. E arrancaria o terço das mãos da velhinha e diria: "Deus não existe.” No entanto, o ateu entre os aristocratas levanta o chapéu ao passar em frente a uma igreja.

Os meus sapatos estão cobertos, de alto a baixo, com ornamentos compostos por ziguezagues e buracos. Foi trabalho realizado pelo sapateiro e pelo qual nada recebeu. Vou ao sapateiro e digo: "O Senhor pede 30 coroas por um par de sapato. Eu dou-lhe 40," Com este gesto fiz com que o homem se sentisse tão feliz que ele vai agradecer-me essa felicidade com trabalho e material cuja qualidade não será de modo algum proporcional à pouca diferença de preço que paguei. O homem está mesmo feliz. É raro a felicidade entrar em sua casa. Tem à sua frente um homem que o compreende, que sabe dar valor ao seu trabalho e que não duvida da sua honestidade Em pensamento, os sapatos já estão prontos à sua frente. Ele sabe onde é que atualmente se pode encontrar o melhor cabedal, sabe a que empregado confiá-los, os sapatos virão decorados com "ziguezagues e pontos, tantos quantos couberem num sapato elegante. E agora digo eu: vou impor uma condição. O sapato tem de ser totalmente liso. Nesse momento, o mundo desaba para ele, e acabou-se a felicidade. Tem menos trabalho, mas tirei-lhe toda a alegria

Enalteço o aristocrata. Trago ornamentos no meu próprio corpo se isso faz a felicidade dos que me estão próximos. Eles são a minha felicidade. Eu suporto os ornamentos do negro zulu, do persa, da camponesa eslovaca ou do meu sapateiro, pois eles não têm outros meios para chegar aos pontos altos da sua existência. Nós é que temos a arte que substituiu o ornamento. Depois das vicissitudes do dia ouvimos Beethoven ou vamos ao teatro. O meu sapateiro não tem possibilidade de o fazer. Não posso retirar-lhe a sua religião, já que não tenho mais nada para pôr em seu lugar. Quem vai, no entanto, ouvir a Nona e se sentar lá para desenhar o padrão para uma tapeçaria, ou é imposto ou é degenerado.

A ausência de ornamento elevou as restantes artes a um nível nunca antes imaginado. As sinfonias de Beethoven nunca teriam sido escritas por um homem que tivesse de andar vestido com seda, veludo e rendas. Quem hoje anda por aí com calças de veludo não é um artista, mas um palhaço, ou então um caiador. Tornamo-nos mais finos, mais sutis. O homem gregário tinha de se distinguir dos seus pares através de cores diferentes; o homem moderno não precisa de vestimentas para servir de máscara. A sua individualidade tornou-se tão forte que não precisa de exprimi-la através do vestuário. A ausência de ornamentação é um sinal de força intelectual. O homem moderno utiliza o ornamento de culturas antigas e desconhecidas a seu bel-prazer e como bem entende, e concentra o própria criatividade noutras coisas.

Sobre este autor
Cita: Taylor-Foster, James. "Leituras essenciais: "Ornamento e Crime" por Adolf Loos" 01 Dez 2016. ArchDaily Brasil. (Trad. Souza, Eduardo) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/800467/leituras-essenciais-ornamento-e-crime-por-adolf-loos> ISSN 0719-8906

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