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Arquitetos: André Luque
- Área: 570 m²
- Ano: 2024
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Fotografias:Carolina Lacaz
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Fabricantes: Artefacto, Arthur Casas, Brada Mármores, Cristiana Bertolucci, Deca, Design de Patricia Anastassiadis, Docol, Dpot, ERGS, Gasômetro Muller, Jader Almeida, Kilian Glasner, Lumini, Micasa, Portobello, Real Móveis, Uniflex Gabriel

Descrição enviada pela equipe de projeto. Localizado em um edifício no coração de São Paulo, cujo empreendimento residencial é assinado pela empresa italiana de design Pininfarina, o projeto do apartamento Heritage – destinado a um casal e seus três filhos – propõe soluções customizadas para trazer ares de casa.

A panorâmica de 180 graus descortina marcos emblemáticos no horizonte, como o Jockey Club de São Paulo e o Parque do Povo. O briefing para a reforma do apartamento de 570 metros quadrados, confiado ao arquiteto André Luque, teve como premissa a integração dos espaços sociais, visando maximizar a vista e favorecer a interação entre os moradores. Outra solicitação foi a inclusão de elementos de traço orgânico, que dialogassem com a arquitetura da torre. Para isso, as paredes que seccionavam a ala social, assim como os caixilhos que dividiam a sala da varanda, foram removidos, e o piso nivelado, permitindo que a ala social se tornasse um espaço contínuo, abraçado pela paisagem de beleza singular.


A antiga varanda foi equipada com novos caixilhos perimetrais que percorrem toda a fachada, após um rigoroso processo de aprovação condominial para instalação das peças com vértices curvos, fabricados por apenas três empresas em todo o Brasil. Esses elementos, com altura total até o forro, deslizam sobre trilhos embutidos no piso e, junto aos guarda-corpos, permitem que a brisa flua livremente quando estão abertos. A configuração possibilitou a contemplação do pôr do sol, algo antes impossível devido à disposição dos elementos que obstruíam a vista.

Para enfatizar as linhas fluídas que caracterizam a planta do edifício, o desenho das marcenarias e a curadoria dos mobiliários prioriza formas curvilíneas, quebrando uma possível rigidez estética. A unidade visual é definida pelo piso de pedra que se estende por toda a ala social, e também pelo forro composto por ripas de madeira com seção de 03 por 07 centímetros cada uma, espaçadas a 05 centímetros entre si. A laje original, em concreto protendido liso, apresentava pé direito total de 03 metros, e os moradores desejavam mantê-lo o mais elevado possível. Para enfrentar esse desafio, apenas a área da cozinha e o hall de entrada foram rebaixados em 20 centímetros, permitindo a incorporação das instalações de ar-condicionado, com grelhas lineares aparentes integradas à arquitetura.

As superfícies das paredes são revestidas por painéis de Carvalho Americano – mesmo acabamento do forro – criando uma superfície uniforme que abraça todo o espaço e mimetiza os armários e as portas de acesso aos espaços adjacentes. A paleta de materiais naturais valoriza a atmosfera acolhedora, ao mesmo tempo que cria uma base neutra para os mobiliários e obras de arte. A ala social contempla, em um mesmo ambiente, o hall de entrada, a sala de estar, área de jogos, home theater, sala de jantar e cozinha social. Para delimitar visualmente cada área, o mobiliário foi disposto de modo a definir o layout do programa.

Como um gesto de boas-vindas, ao cruzar o hall de entrada – com porta de ripas verticais de madeira e fechamento em vidro, que se embute completamente na parede – os moradores e visitantes adentram o oásis particular. A sala de estar central organiza o espaço: à esquerda, está o home theater, enquanto no lado oposto, a sala de jantar se conecta diretamente à cozinha social.

Na primeira reunião de apresentação do projeto, os clientes expressaram ao arquiteto a necessidade de ocultar a cozinha ou isolar completamente as áreas contíguas à sala principal, quando desejado. Para isso, buscou-se uma solução flexível, sem a necessidade de um dispositivo arquitetônico fixo, mas que mantivesse a linguagem orgânica da proposta. Um sistema de cortinas automatizadas foi especialmente desenvolvido à morada. Para preservar o conceito fluido, o trilho é moldado em traços curvilíneos que se entrelaçam com as ripas de madeira do forro, embutindo-se entre as peças. Quando abertas, os tecidos se recolhem para o interior das paredes, tornando-se quase imperceptíveis.

Na sala de estar, o arranjo simétrico dos móveis é direcionado ao centro do ambiente, promovendo a interação entre os membros familiares. A curadoria valoriza nomes do design brasileiro, conjugando peças modernas e contemporâneas: o sofá EOS, de Patricia Anastassiadis; a poltrona Sapão e a mesa lateral Kropf, de Fernando Mendes; a poltrona Mole, de Sergio Rodrigues; a mesa de centro Roots, de Jader Almeida; a mesa lateral e a luminária da linha Cúrcuma, em bronze fundido, de Cristiana Bertolucci. Na parede, tela do artista Kilian Glasner. O design orgânico dos mobiliários busca uma aproximação ao traço da arquitetura. A proporção voluptuosa das peças valoriza a sensação de aconchego, como um abraço, e evocam o caráter artístico. Ao lado, a mesa Seixo, acompanhada por poltronas June, de Jader Almeida, propõe uma área para jogos de tabuleiro, mantendo uma proporção mais baixa, ideal para momentos descontraídos.

Trazer o verde para o interior foi essencial para configurar a noção de casa. Em colaboração com o estúdio de paisagismo Land N Citi, André Luque e o arquiteto paisagista Rulian Nociti desenvolveram um conceito original denominado "colunas atlânticas". Essas estruturas de seção circular, fixadas no forro, são permeadas por espécies vegetais, criando um efeito de suspensão no espaço. Um dos pilares originais do edifício recebeu o mesmo tratamento paisagístico. Esses elementos assemelham-se a troncos de árvores, propondo uma construção quase poética que desafia os limites entre arte e arquitetura.

Do ponto de vista técnico, os tubos metálicos são soldados diretamente na laje, e as instalações elétricas e hidráulicas – indispensáveis para o ciclo vitalício das plantas– são ocultas no forro, o que exigiu um projeto rigoroso de compatibilização. As espécies vegetais são mantidas em bolsões que se assemelham a um jardim vertical, e um sistema de irrigação automática, com bombas que percorrem por todo o forro até a estação de tratamento na área de serviço, mantém as plantas hidratadas. A água descartada é coletada através de bandejas metálicas.

No piso, jardineiras metálicas de alturas variadas e traço orgânico serpenteiam parcialmente o perímetro do apartamento, envolvendo os pilares revestidos em lâmina de madeira, composta por uma variedade de espécies tropicais. Bancos em marcenaria oferecem espaços dedicados à contemplação da vista entre o verde. A convite do arquiteto, a ceramista japonesa radicada no Brasil, Kimi Nii, desenvolveu uma escultura especialmente para a residência. A obra, que resulta da sobreposição de 13 peças cerâmicas, forma uma coluna que desafia a dualidade visual entre estabilidade e equilíbrio, dialogando em fina sintonia com as "colunas atlânticas".

Para garantir a qualidade em áudio e vídeo, o home theater é equipado com painéis de LED instalados sobre os painéis, oferecendo a experiência de um cinema em casa. Ao fundo, o piano de cauda, um dos elementos pensados para ocupar um espaço de destaque desde o traço inicial do projeto, é valorizado pela luz natural e o projeto acústico permite que o som flua pelo espaço, sem reverberação. Para os moradores, que frequentemente recebem familiares e amigos para eventos sociais e que têm a culinária como hobby, a cozinha deveria ser o coração do projeto, assim como as salas. Para atender a essa necessidade, o projeto inclui duas cozinhas: uma técnica, dedicada ao dia a dia, por sua vez mais fechada e oculta por uma porta de correr; e uma social, aberta para as salas, e utilizada nos dias de festa ou recepção.


Uma ilha central de 06 metros emerge como uma peça escultórica. A variação de alturas serve tanto como mesa de jantar quanto como apoio para a cocção de alimentos. A parte mais alta se materializa como um monolito em mármore Branco Nuvolato, e a mesa inferior de madeira se apoia sobre uma base com seção helicoidal. As superfícies das paredes e a bancada de apoio são recobertas pela mesma pedra. As marcenarias desenhadas pelo escritório seguem um rigoroso planejamento em termos de organização, soluções e acabamentos, utilizando lâminas de madeira e ferragens com acabamento escovado. Para as refeições rápidas, uma mesa circular complementa o ambiente, posicionada abaixo da janela e beneficiada pela luz natural abundante.

A sala de jantar acomoda até 12 pessoas e apresenta mesa Amorfa, com base em aço inox e tampo de madeira natural, assinada por Arthur Casas (Micasa), acompanhada por um conjunto de cadeiras Beg, desenho original de Sérgio Rodrigues em 1968 (reeditada pela Dpot). Tudo sob trio de pendentes Ufo, do designer brasileiro Fernando Prado (Lumini). Um aparador suspenso, revestido em pedra, repousa na parede recoberta pelo mesmo material, e abaixo, uma lareira a gás proporciona conforto nos dias de temperaturas amenas. As conversas com o morador, um praticante de esportes e ligado à natureza, serviram de inspiração para o projeto de iluminação da galeria de acesso à ala íntima.

Para trazer a sensação de luz natural no espaço de proporções exíguas, um pergolado de madeira rompe a monotonia do espaço, criando um ritmo e definindo as portas do escritório e de cada um dos quatro dormitórios. Uma tela em lona tensionada cobre a estrutura de madeira, e, com o auxílio do projeto de automação, a iluminação difusa é ajustada sutilmente ao longo do dia, simulando o ciclo circadiano. Pela manhã, a luz é suave e com temperatura de cor quente, como o nascer do sol; ao meio-dia, torna-se mais intensa e branca; e ao longo da tarde, a emissão gradualmente se torna mais amarela, simulando o sol deste período. Essa solução contribui para o despertar do corpo ou para suavizar a intensidade rítmica ao final do dia. As paredes são forradas em linho, e o piso da ala íntima é coberto por assoalho de madeira em padrão espinha de peixe.

O dormitório master oferece uma atmosfera que preza pelo bem-estar no espaço de repouso. Painéis em madeira envolvem o ambiente, e a cabeceira se desdobra para a parede lateral, onde está a bancada. O conceito de pergolado do corredor é mantido na parede principal, que demarca a entrada, e na parede oposta, integrando-se ao cortineiro. A iluminação embutida nos nichos e na cabeceira da cama proporciona um sistema de luz difusa. A decoração complementa o conforto tátil, com roupas de cama em linho, poltrona e pufe Vivi, por Sergio Rodrigues (Dpot). A varanda foi adaptada em um ateliê de pintura, um espaço dedicado ao hobby da moradora.

Para organizar as áreas individuais do casal, os pequenos banheiros e o closet da suíte foram unidos em uma ampla sala de banho integrada. Os armários estão dispostos ao redor do ambiente, e uma bancada central acomoda duas pias, com uma base de pedra convertida em banheira. O espelho suspenso traz leveza estética e não bloqueia a passagem da luz. As cabines com vaso sanitário e ducha são fechadas por portas de vidro de altura total, com acabamento espelhado no exterior para manter a privacidade.
