O surgimento do Novo Pragmatismo Radical

Usando a Austrália como foco, Marissa Looby, em um artigo recente para Australian Design Review, defende que o desaparecimento de estilos arquitetônicos, combinados à proliferação de vários guias e códigos de construção, criou uma nova geração de arquitetos: O Novo Pragmatismo Radical. Seu artigo "The New Radical Pragmatist (On Validation)" está reproduzido aqui.

The Architectural Review (Dezembro, 1955) artigo épico de Reyner Banham’s, ‘O Novo Brutalismo’, no qual a crítica apontava o surgimento de um novo estilo arquitetônico. Ele também descreveu uma afluência de "ismos" que se tornava cada vez mais conspícuo à disciplina, decorrente do então contemporâneo modelo de um historiados de arte e sua influência sobre o historiador de arquitetura como um observador da profissão. Banham sugeriu que qualquer proposição do termo "novo" tem uma relação equivocada com o passado, tanto que ao defender um novo "ismo", um teórico deve defender sua ideia com fatos históricos. Ironicamente, Banham reconheceu que até o título "O Novo Brutalismo" derivava da análise de The Architectural Review do International Style no artigo pós guerra ‘O Novo Empirismo’. Ele afirmou: "[a] habilidade de lidar com nuances tão finas de significado histórico é em si uma medida de nossa praticidade com o método histórico hoje, e o uso de frases do tipo "O Novo X-ismo" - onde X é qualquer adjetivo - se tornou lugar comum no início da década de 1950 em estúdios e outros lugares onde arquitetura é discutida, e não praticada."

O "ismo" foi supostamente uma construção modernista, com exemplos comuns aparecendo na arte e na arquitetura, tais como Cubismo, Futurismo e Surrealismo. A construção, desde de meados dos anos cinquenta (considerando, pelo bem do argumento, a hipótese de Banham como ponto de partida) tem se tornado gradualmente um clichê, como a arquitetura continua a observar, construir, postular, restabelecer e avaliar uma variedade de estilos e movimentos, atribuindo a cada um seu próprio apelido. O novo Brutalismo, derivado de dois protagonistas chave - os arquitetos ingleses Peter e Alison Smithson - foi um movimento que pode ser genealogicamente ligado ao modernismo e que como tal estava preso em um complexo de Édipo para libertar-se de seu ancestral. Modernismo, como um estilo que define períodos pré e pós guerra, demanda pouca apresentação. Charles Jencks pode ter uma vez afirmado "a morte do Modernismo" e o nascimento do Pós-modernismo, definindo data e hora exatos (15 de julho de 1972, precisamente às 15h32min) quando o Pruitt-Igoe de Minoru Yamasaki em St Louis, Missouri, foi demolido, mas o reduto do Modernismo pode ainda ressoar no presente de formas adaptadas. No Japão, os Metabolistas também surgiram a partir do Modernismo no Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), Hoddesdon, 1951, usando a megaestrutura como estética tecnológica e formal para simbolizar o movimento. Também digno de observação foi o movimento Desconstrutivista dos anos 1980 - um ponto em que arquitetura deslizou pela ladeira escorregadia da semiótica Pós-estruturalista - com seus princípios estabelecidos em uma exposição no Museu de Arte Moderna, New York (1988), com curadoria de Philip Johnson e Mark Wigley. A exposição foi composta por um grupo misto de arquitetos, e todos se distanciaram do "ismo" logo depois.

O artigo de Reyner Banham's "O Novo Brutalismo" em Architectural Review. Imagem Cortesia de The Architectural Review

Australia nunca desenvolveu completamente um estilo próprio. Isso não quer dizer que a arquitetura australiana não tenha aprendido, evoluído e construído uma gama de regimes estilísticos. Claro que teve influências do Modernismo e do Pós-modernismo, por exemplo, o reduto modernista de Harry Seidler na skyline de Sydney (Australia Square, Horizon Apartments, Blues Point Tower, MLC Centre); os exemplos pós-modernos de Ashton Raggatt McDougall em Melbourne (RMIT Storey Hall, Shrine of Remembrance, Melbourne Recital Centre, Hamer Hall); e até o Brutalismo foi praxe por um curto período com as obras de Iwan Iwanoff no oeste (Schmidt-Lademann House, Marsala House, Northam Public Library, Curtin University). Para classificar ainda mais, Glenn Murcutt poderia ser catalogado por alguns teóricos como Regionalista em sua abordagem do Modernismo - uma interpretação especificamente australiana do Modernismo europeu e norte americano, derivado do trabalho teórico do Regionalismo Crítico de Kenneth Frampton. Entretanto, na virada do século XXI, mesmo que a ansiedade de ser rotulado como um estilo possa ainda ser comum em estúdios, não há mais um "ismo" reinando sobre a profissão. Os arquitetos não estão mais sob a égide do Pós-modernismo, por exemplo - mesmo que teóricos como Alan Kirby sugiram que a sociedade permaneça em uma era pseudo pós-moderna - e dada a rejeição comum do Parametricism de Patrik Schumacher como um estilo validado - um dos poucos arquitetos com a ousadia de representar um "novo" estilo contemporâneo - arquitetos estão atualmente indefinidos. Pode ser dito que arquitetos não estejam mais trabalhando sob a restrição de um "ismo" estilístico. Mas é importante ponderar o que o "ismo" faz pelos arquitetos. Um estilo ou movimento pode ser visto como um corpo coeso, onde metodologias construtivas, estética, moral e códigos artísticos estão alinhados. Um estilo pode ser uma crença comum em uma forma de construir - uma ferramenta poderosa na validação do objeto arquitetônico. Se o estilo é indefinido na arquitetura, arquitetos não trabalham sob códigos em comum. Isto não é uma forma de descartar o século XXI como não criativo, mas a liberdade de estilos criou uma multiplicidade estética de respostas morais na arquitetura. Dito isso, como arquitetos validam, justificam, analisam e criticam seu trabalho como coletivo se não estão mais agindo sob uma bandeira comum?

Pode parecer supérfluo falar do impacto da falta de estilo coletivo sobre a profissão na contemporaneidade, mas se torna cada vez mais intrigante quando comparativamente relacionado com o surgimento de outras formas de controle no período pós-guerra: determinações legais e códigos construtivos. Não é postulado que a perda de estilo seja positiva ou negativa, mas de forma mais prudente, que a perda de estilo coincidiu com o aumento de regulamentações, códigos exigentes, controles e vários métodos de validação para "colocar o projeto na linha". Este artigo não reivindica um novo estilo, mas uma nova geração de arquitetos: o Novo Pragmatismo Radical.

O código construtivo da Austrália passou por sucessivas reformas desde 1996. Começando em 1965 como Código Construtivo de Modelo Uniforme Australiano (Australian Model Uniform Building Code - AMUBC) sob o controle da Comissão Permanente Interestadual sobre Normas de Construção Uniforme (Interstate Standing Committee on Uniform Building Regulations - ISCUBR) a agência "continha propostas de questões imobiliárias técnicas e administrativas" - como dito na "Reforma da Norma Construtiva",  Relatório de Pesquisa de Produtividade (17 de novembro de 2004, Comissão de Produtividade do Governo Australiano). Em 1979 a Comissão Interestadual foi restruturada em Conselho Coordenador de Regulamentação da Construção Uniforme da Austrália  (Australian Uniform Building Regulations Coordinating Council - AUBRCC), posteriormente nomeando o AMUBC em sua configuração atual de Código Construtivo da Austrália (Building Code of Australia - BCA). As edições do BCA variam entre 1988 e 1990, com um uso cada vez maior de regulamentações de performance. A edição atual do BCA foi formulada inicialmente em 1996 e, desde 2002, a agência sucessivamente anexou um novo nome para refletir sua revisão contínua. O BCA é descrito como "documento vivo" e fonte nacional consistente de regulamentação técnica. As constantes atualizações  são endossadas em parte devido à proliferação de novas tecnologias construtivas, e também pela necessidade de mantê-lo com base na performance ao invés de um código prescrito. As alterações interativas sem fim são uma coisa, mas talvez seja mais preocupante o grande número de formas adicionais de controle disciplinar. Parâmetros de planejamento variam em cada estado em sua forma, mas são uma confluência de legislações locais e estatais. O afluxo de códigos ambientais na arquitetura aumentou desde 1990, notavelmente, o Código Energético NSW para habitações foi estabelecido em 1996 (BASIX), e o Sistema de Classificação do Ambiente  Construído Nacional Australiano (Australian Built Environment Rating System - NABERS) já existe há mais de uma década.

A demolição do complexo Pruitt-Igoe foi marcada por Charles Jencks como o fim do Modernismo. Imagem Cortesia de US Department of Housing and Urban Development

O sistema Green Star começou em 2003 pelo Conselho Australiano de Construção Verde e, parecido com LEED, nos EUA, arquitetos estão usando o sistema como ferramenta de validação de seus edifícios, não apenas como uma lista com base no mérito para aprovação por parte dos clientes. O reconhecimento de um Green Star 5 estrelas significa que o edifício atingiu "Excelência Australiana", e 6 estrelas significa "Liderança Mundial" em termos de sustentabilidade. Arquitetos, bem como o Conselho, subliminarmente promovem o sistema como um método de validação de seu papel no processo construtivo. A regulamentação estabelecida por este subconjunto independente existe em um processo recíproco: arquitetura, como disciplina, define a meta para então persegui-la. Na realidade, o arquiteto é escravo das medidas objetificáveis inerentes ao sistema. Estaríamos usando estes valores para justificar projetos, e isso não seria simplesmente uma bolha de auto-perpetuação?

A observação novamente não é discutir se o controle crescente de sustentabilidade, planejamento e construção é positivo ou negativo - ou justificar a exclusão de estilo - mas entender a contradição nestes dois sistemas e ressaltar como arquitetos agora validam seu trabalho. Estão medidas como "Green Star" e "Área de Rede Locável" maximizada substituindo os valores estilísticos do "menos é mais " de Mies, das "máquinas de morar" de Le Corbusier, ou do "menos é chato" de Venturi? O Novo Pragmatismo Radical é a identificação de uma margem do arquiteto em conflito da disciplina contemporânea. Como mostrado, onde abordagens mais radicais são possíveis através de tecnologia avançada, e com uma falta de estilo em que "vale tudo", não segue que a regulamentação crescente e os subconjuntos especializados fornecem a restrição de pragmatismo - e este cenário é realmente paradoxal?

O Novo Pragmatismo Radical é meticuloso na apropriação de sistemas e dados factíveis, de modo a permitir resultados para problemas arquitetônicos. Incorporam todas as formas de codificação tecnológica, planejamento e políticas de projeto, estratagemas, regulamentações e restrições econômicas como justificativa para o projeto. Administram o projeto e checam os itens. Jogam com o cliente  usando chavões como "Green Star". Uma arquitetura radicalmente pragmática irá evitar discutir o impacto visual sem fatos; por exemplo, a fachada é "estruturalmente eficaz em sua forma radical como utiliza apenas quatro tipos diferentes de painéis de materiais reciclados". Teoria, concepção e noções preconcebidas ou pesquisa retroativa não são necessárias para o pragmatismo radical. O importante é a validação do fato. Mas este fato comumente vem de fora da disciplina: de planejamento, conselhos de sustentabilidade e de órgãos governamentais de regulamentação. O que levanta a questão: arquitetos estão desistindo de muito nessa nova forma de validação?

Australian Design Review é uma revista online de design que representa duas revistas impressas: Architectural Review Asia Pacific e a revista de design de interiores Inside.

Sobre este autor
Cita: Looby, Marissa . "O surgimento do Novo Pragmatismo Radical" [Rise of The New Radical Pragmatist] 26 Dez 2013. ArchDaily Brasil. (Trad. Marcon, Naiane) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/01-163030/o-surgimento-do-novo-pragmatismo-radical> ISSN 0719-8906

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