Cortes no Tempo Contínuo: a vida urbana como partido / Nara Boin

O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir espaço.” - Ítalo Calvino. As cidades invisíveis.

O trabalho Cortes no Tempo Contínuo: a vida urbana como partido é resultado de uma investigação a respeito das transformações nas formas de ocupação do espaço público na cidade de São Paulo, na região central. Busca-se novas maneiras de incorporar essa atual dinâmica no processo projetual, na intenção de valorizar a vida cotidiana e criar um suporte para ações eventuais. Seriam vetores de indeterminação na intenção de amparar a imprevisibilidade da vida. A rede de ensaios funcionaria como uma costura de microssituações, permitindo a experimentação de novas percepções possíveis do espaço público.

Da autora: A análise da cidade por meio dos modos de vida dentro dos estudos da arquitetura e urbanismo, vem sendo abordada desde a pós-modernidade e ganhando força na contemporaneidade. São diversos os autores que defendem uma revisão dos métodos conhecidos durante a ação projetual desses profissionais, se distanciando das certezas absolutas já conhecidas e, se aproximando de uma lógica guiada mais pela experimentação, participação e indeterminação, desdobrando-se consequentemente em novas exigências.

Assim, o trabalho desenvolvido investiga ações realizadas para incorporar essa nova dinâmica, tanto por parte da população, como das gestões públicas nos últimos anos e, como o arquiteto e urbanista seria capaz de absorver as necessidades cotidianas em seu processo projetual. Não admitindo que exista um único caminho a ser seguido, como uma lógica rígida e linear, mas uma multiplicidade de alternativas como forma de experimentação de soluções, que possam ser desfeitas e refeitas e, assim, permitir novos caminhos.

O centro e suas possibilidades

Os espaços públicos do centro, e mais especificamente as praças, sofreram um processo generalizado de deterioração como já observado com a perda da valorização imobiliária da região central. Algumas foram alvos de intervenções pelo Metrô, passando a ter um uso restrito como espaço de acesso às estações, outras tiveram algum tipo de intervenção viária, o que gerou uma dificuldade de usufruto. Apesar dessa realidade, observamos diversas intenções de apropriação, mesmo que de forma precária, das estruturas existentes.

Aqui, busco investigar alguns espaços da região central, identificando, além das infraestruturas, principalmente os usos cotidianos e as eventualidades que ali ocorrem, que são os responsáveis pela dinâmica existente. Os dados quantitativos continuam sendo importantes como um dos componentes de método de análise, mas a utilização diária desses espaços, suas necessidades, improvisações, ambiguidades, incertezas e indeterminações se tornam fatores de extrema importância para a leitura do lugar, que deve ser feita com um olhar interdisciplinar devido à sua complexidade, sua multiplicidade de temporalidades superpostas.

Mapa dos espaços do centro. Image © Nara Helena Diniz Boin. Cortesia de Seu Acervo

1. Praça da República
2. Praça Dom José Gaspar
3. Praça Ramos de Azevedo
4. Vale do Anhangabaú / Viaduto do Chá
5. Praça do Patriarca
6. Pateo do Collegio
7. Largo São Bento
8. Largo Santa Efigênia
9. Largo do Paissandú
10. Rua Dom José de Barros

Proposições: Vale do Anhangabaú / Viaduto do Chá

Fotomontagem da intervenção no Viaduto do Chá. Image © Nara Helena Diniz Boin. Cortesia de Seu Acervo

Local de extrema representatividade da cidade. A intervenção tem como partido criar uma maneira mais atraente de conexão entre o Vale e o Viaduto, aproveitando a sua paisagem. Assim, permitiria locais de permanência, como mirantes em seus patamares, que também poderiam ter suas apropriações diversificadas.

Isométrica da proposta. Image © Nara Helena Diniz Boin. Cortesia de Seu Acervo

A estrutura por ter rodízios em sua base seria móvel e, em alguns momentos determinados durante o dia, poderia correr paralelamente ao viaduto até 8 metros para cada lado. Isso possibilitaria novos enquadramentos e percepções da paisagem, além de criar uma interação com o usuário, surpreendendo-o e alterando as formas imaginativas do seu entendimento por conexão.

Vista da proposta. Image © Nara Helena Diniz Boin. Cortesia de Seu Acervo

Os painéis fotovoltaicos, assim como o wifi livre acentuariam mais a permanência dos usuários na estrutura, tornando-o além de uma conexão e um mirante, um espaço de estar.

Corte transversal da proposta. Image © Nara Helena Diniz Boin. Cortesia de Seu Acervo
Fotografia da maquete. Image © Nara Helena Diniz Boin. Cortesia de Seu Acervo

Este artigo inaugura a parceria entre a plataforma Seu Acervo e o ArchDaily Brasil, através da qual publicaremos com frequência trabalhos de conclusão de curso de alunos de todas as partes do país. Para acessar o trabalho completo de Nara Helena Diniz Boin, aluna formada na Universidade Presbiteriana Mackenzie, clique aqui.

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Sobre este autor
Cita: Romullo Baratto. "Cortes no Tempo Contínuo: a vida urbana como partido / Nara Boin" 24 Jul 2017. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/876316/cortes-no-tempo-continuo-a-vida-urbana-como-partido-nara-boin> ISSN 0719-8906

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