Por que as cidades antigas ainda podem nos ensinar sobre planejamento urbano

No século 20, o planejamento urbano passou por algumas grandes mudanças, criando grande parte de nosso ambiente urbano atual em um molde que agora é amplamente visto como anti-humano. Felizmente, nas últimas décadas o planejamento urbano mudou novamente - em parte revisando e em parte revertendo teorias adotadas durante o século XX. Neste artigo, originalmente publicado em Redshift da Autodesk como "What the Future of Cities Can Learn From Ancient Cities" (O que o Futuro das Cidades Pode Aprender das Cidades Antigas), James A Moore analisa por que os velhos modelos de criação de cidades provaram ser tão atemporais e o papel que desempenharão na criação das cidades do século XXI.

Como diz a lenda, ao deixar Carnegie Hall após um ensaio insatisfatório, o violinista Mischa Elman encontrou dois turistas à procura da entrada do edifício. Eles perguntaram: "Como você chega ao Carnegie Hall?"

Sem pestanejar, Elman respondeu, "Praticando".

É uma piada antiga e simples, mas aponta para uma importante razão pela qual as pessoas são atraídas para as cidades. Por que algumas pessoas se mudam para Hollywood? Elas querem estar nos filmes. Por que se mudam para Wall Street? Elas querem estar no mercado das finanças. Nos melhores casos, as cidades permitem aos cidadãos seguirem suas aspirações.

É hora de começarmos a incluir elementos mais familiares em nossas cidades de ficção científica? Imagem © Micke Tong

Até o ano 2050, estima-se que dois terços da população mundial viverá em assentamentos urbanos, em parte por essa mesma razão: as cidades permitem que as pessoas busquem suas vontades e sonhos, e a fazem de forma mais eficiente e eficaz - em termos de tempo, recursos e capital - do que outras alternativas.

À medida que o mundo se urbaniza, surgem debates significativos sobre como deve ser o futuro das cidades, como as cidades devem ser planejadas e organizadas e como as cidades podem ajudar a melhorar a qualidade de vida dos novos moradores. Essas discussões se expandem e muitas vezes desafiam as teorias do século passado, período que promoveu mudanças significativas nas abordagens do planejamento urbano e das cidades subsequentes que surgiram.

Mas, ao contrário de outras formas de invenção humana, as cidades são únicas já que as versões mais recentes não invalidam necessariamente as versões antigas. As pessoas no Oriente Médio habitam partes de cidades que foram fundadas há mais de 2.000 anos. Na Europa regiões são habitadas em locais com cerca de 1.000 anos de idade, e as pessoas em outras cidades dos Estados Unidos, como Boston e Filadélfia, vivem em bairros que existem há centenas de anos.

Muitas visões contemporâneas para cidades futuristas - até mesmo estranhas - começaram a construir sobre o tecido urbano histórico ao invés de usar uma abordagem de tabula rasa. Aqui, a visão de Vincent Callebaut de 2050 para uma Paris sustentável construídai sobre os edifícios existentes da cidade. Imagem Cortesia de Vincent Callebaut Arquitetura

A história das cidades se repete

Viver em um bairro testado pelo tempo, com todos os tipos de vantagens locacionais e funcionais, mais do que compensa as limitações de viver em um edifício de séculos de idade. Para o futuro das cidades prosperar, as pessoas precisam reexaminar e avaliar os benefícios de tais vantagens.

No século XX, os teóricos urbanos estavam certos de que as condições dos tempos modernos - repletos de telefones, carros e outras invenções - eram dramaticamente diferentes do que qualquer coisa que viera antes. Eles rejeitaram padrões e práticas existentes, muitos dos quais foram aprimorados através de séculos de experiências e tentativas e erros. Em vez de construir bairros de uso misto (com casas perto de lojas, escolas, centros cívicos e locais de trabalho), os planejadores da época usavam o zoneamento para separar as funções, o que por sua vez aumentava o congestionamento do tráfego.

Tecnologias mudam rapidamente; pessoas mudam mais lentamente. As coisas que atraíram as pessoas para as cidades da Renascença, da Reforma da Holanda e da Inglaterra industrial ainda tendem a atrair pessoas hoje: empregos, oportunidades, companheirismo, excitação e um senso de independência e liberdade. Em uma época que parece lutar constantemente pelo novo e pelo romance, as cidades lembram à sociedade certos aspectos fundamentais da humanidade.

Se o século 20 foi a idade do automóvel, o século 21 será a idade do TI. Se o carro era um agente de dispersão, a informática é ainda mais efêmera. Mas por que tantos líderes dessa tecnologia - Googles, Twitter - estão se mudando para os centros das cidades? Porque seus empregados querem viver lá, não em uma nave espacial hermética em algum lugar em subúrbio, não querem viajar de carro duas horas para trabalhar, não em uma localização remota conectada somente pela tecnologia.

Copenhague tem sido pioneira em evitar o urbanismo carrocêntrico, favorecendo o transporte a pé e por bicicleta. Imagem © Usuário do Flickr CC Thomas Rousing

Economizar tempo e dinheiro com cidades com usos mistos

As pessoas querem estar juntas com o fácil acesso à família, amigos e companheiros; querem lugares para fazer compras, lugares para recreação, para comer e beber. Mesmo na era das mídias sociais onipresentes, as pessoas ainda querem uma comunidade acessível, e é isso que as cidades podem ser ótimas em fornecer - desde que seja a principal motivação por trás dos planos e projetos urbanos.

O papel da infraestrutura, em última análise, é ajudar a apoiar os desejos e aspirações das pessoas que vivem em uma comunidade. O planejamento da cidade do século XX frequentemente fazia parecer que a infraestrutura, em si, era a meta, quando historicamente e hoje, é essencialmente um meio. As pessoas querem acesso. Não necessariamente insistem em mobilidade onipresente, e certamente não exigem estradas congestionadas com diversas faixas.

No plano certo, uma pista de bicicleta ou uma calçada pode ser mais do que suficiente para atender às suas necessidades. É o que muitas cidades, particularmente na Europa e em algumas partes dos EUA, estão redescobrindo. A mobilidade, por si só, só se torna um foco primário quando as funções fundamentais da vida cotidiana estão fragmentadas e se espalham, que foi o modelo do século XX.

No final, a cidade integrada de uso misto é simplesmente mais eficiente do que aquela onde as coisas são compartimentalizadas e espalhadas. O tempo gasto com a condução pode ser gasto em atividades de lazer. A energia usada para mover toneladas de aço e plástico até empreendimentos longínquos pode ser usada para fornecer serviços tão necessários. E o dinheiro gasto em rodovias pode ser gasto em outras formas para enriquecer a vida dos moradores.

No futuro, esse tipo de redirecionamento será essencial porque, à medida que a população mundial continua a se urbanizar, a qualidade de vida das pessoas que se deslocam para as cidades deve melhorar e a pegada ecológica total e per capita deve diminuir. A chave para alcançar este objetivo são cidades: diversas, integradas, caminháveis, pedaláveis, multimodais e construídas baseadas nas lições que as pessoas aprenderam ao longo de milhares de anos.

As teorias do século XX sugeriram que cada novo avanço tecnológico terá impactos radicais e significativos no planejamento, projeto e operação das cidades, e cada nova geração exigirá formas de cidade novas e diferentes. A história sugere o contrário. Os padrões e abordagens testados e aprovados pelo tempo têm uma incrível capacidade de absorver novas tecnologias e ainda abordam as razões fundamentais pelas quais as pessoas se deslocam para as cidades: elas proporcionam às pessoas lugares para viver, trabalhar e se divertir e os meios para prosseguir com seus objetivos individuais e coletivos.

Sobre este autor
Cita: Moore, James. "Por que as cidades antigas ainda podem nos ensinar sobre planejamento urbano" [Why Ancient Cities Can Still Teach Us About Urban Planning] 17 Mai 2017. ArchDaily Brasil. (Trad. Souza, Eduardo) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/871464/por-que-as-cidades-antigas-ainda-podem-nos-ensinar-sobre-planejamento-urbano> ISSN 0719-8906

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